Só recentemente
– e infelizmente só recentemente! – deparámos com o site «Para a História do Socialismo. Documentos».
Este site português é o melhor que
encontrámos até hoje como biblioteca de documentos e artigos de análise sobre
o socialismo, em particular da URSS. Os textos estão bem apresentados com
boas notas e referências do editor português.
Hoje, vamos
contribuir para divulgar desse site
um artigo de V.A. Torgachev, que o tradutor e editor português – que assina
«CN» -- apresenta assim: «Valéri Antónovicth Torgachev (1938), doutor em
Ciências Técnicas, professor, chefe do Laboratório de Estruturas de
Computação Distribuída do Instituto de Informática e Automatização de São
Petersburgo da Academia de Ciências da Rússia (SPIIRAN). O presente texto foi
originalmente publicado no site assinalado em Janeiro de 2013.» Esse site é: http://nstarikov.ru/blog/23233.
O artigo – que
apresentamos em 2 partes -- é uma contribuição importante para o desmonte das
montanhas de mentiras com que os escrevinhadores burgueses, após a 2.ªGM, pagos
para atacar o socialismo, cobriram Estaline e a URSS do seu tempo. Ataque
potenciado pelo revisionismo iniciado com Khruchov que desembocou na
restauração capitalista de Gorbachov & C.ª. Adicionámos algumas notas
identificadas com «JMS».
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Only
recently – and unfortunately only recently! -- we came across the site “Para a História do Socialismo.
Documentos”. This Portuguese site is the best to
date we have found as a repository of documents and articles on socialism,
particularly on the USSR. The texts are well presented with good notes and
references from the Portuguese editor.
Today,
we contribute to divulging from that site an article by V.A. Torgachev, who
the Portuguese translator and editor -- he signs "CN" -- presents
as follows: "Valery Antonovich Torgachev (1938), Ph.D. of Technical Sciences,
Professor, head of the Laboratory of Distributed Computing Structures of the
Saint Petersburg Institute of Informatics and Automation, Russian Academy of
Sciences (SPIIRAN). This text was originally published on the noted website in
January 2013.” This site is: http://nstarikov.ru/blog/23233.
The
article -- which we present in two parts -- is an important contribution to debunking
the mountains of lies with which the bourgeois scribblers, after WWII and on
the payroll to attack socialism, covered Stalin and the USSR of his time.
Attack boosted by the revisionism initiated by Khrushchev which led to the
capitalist restoration of Gorbachev & Co. We have added some notes marked
“JMS”.
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Memórias da URSS. Os anos do pós-guerra (I)
V.A. Torgachev
Tradução do russo para português e edição por
CN, 26.01.2014
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Memories of the
USSR. The postwar years (I)
By V.A. Torgachev
Translation
from the Russian to Portuguese and edition by CN, 2014-01-26
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[O artigo começa com uma introdução que condensamos -- JMS]
[…]
A singularidade
da revolução khruchoviana consistiu no facto de as mudanças se terem
prolongado por vários anos, tendo passado praticamente despercebidas à
população.
[…]
Até 1960, a
URSS tinha uma posição liderante no mundo em domínios como a saúde, educação,
ciência e áreas inovadoras da indústria (indústria atómica, construção de
foguetões, electrónica, técnica computacional e automatização da produção).
No seu conjunto, a economia da URSS só estava atrás da dos EUA, superando
significativamente a de quaisquer outros países. No entanto, até 1960, a URSS
aproximava-se cada vez mais dos EUA e isolava-se na dianteira face aos restantes
países. Depois de 1960 os ritmos de crescimento da economia caíram constantemente
e perderam-se as posições liderantes no mundo.
Procurarei de
seguida mostrar em detalhe como viviam as pessoas comuns na URSS nos anos 50
do século passado. Apoiando-me em memórias pessoais, relatos de pessoas com
quem me encontrei ao longo da vida, bem como em alguns documentos da época
que estão acessíveis na Internet, procurarei mostrar o quanto estão longe da
realidade as representações actuais sobre um passado tão recente de um grande
país. […]
É bom viver no País dos Sovietes!
Imediatamente
após o fim da guerra, a vida da população da URSS começou a melhorar
acentuadamente. Em 1946 é decretado um aumento de 20 por cento dos salários
dos operários, técnicos e engenheiros que trabalhavam nas empresas e obras
nos Urais, Sibéria e Extremo Oriente. No mesmo ano são aumentados em 20 por
cento os vencimentos dos trabalhadores com formação superior e média especializada
(técnicos e engenheiros, investigadores científicos, docentes e pessoal médico).
São valorizados os graus e títulos académicos. O salário de um professor doutorado
passou de 1600 para até 5000 rublos, um docente pós-graduado [candidato a
doutoramento] de 1200 para até 3200 rublos, um reitor de um estabelecimento
de ensino superior, de 2500 até 8000 rublos. Nos institutos de investigação
científica, o grau académico de pós-graduado correspondia a um acréscimo no
vencimento base de 1000 rublos, enquanto um doutorado tinha um acréscimo de
2500 rublos. Nesta altura, o vencimento de um ministro da URSS era de 5000
rublos e um secretário regional do partido auferia 1500 rublos. Estaline, como
Presidente do Conselho de Ministros da URSS, tinha um vencimento de 10000
rublos. Naquela época, os rendimentos suplementares dos cientistas na URSS chegavam
a superar várias vezes o respectivo salário. Por isso constituíam a parte mais
abastada da sociedade soviética e em simultâneo a mais respeitada.
[Os valores
indicados são de salários mensais. Em 1946 o rublo valia 0,1887 dólares. 1000
rublos valiam, portanto, 188,7 dólares, ou seja, aproximadamente 2387 dólares
de 2017. Note-se, porém, que este equivalente está bastante subvalorizado
porque não toma em conta os benefícios sociais e o regime de preços do
socialismo da URSS. O autor tomará este aspecto em conta numa tabela abaixo.
-- JMS]
Em Dezembro de
1947 deu-se um acontecimento que, pelo impacto emocional nas pessoas, foi
comparável com o fim da guerra. Como se afirmava no Decreto do Conselho de
Ministros da URSS e do CC do PCU(b), n.º 4004 de 14 de Dezembro, «(….) a
partir de dia 16 de Dezembro de 1947 é abolido o sistema de senhas de racionamento
no abastecimento de bens alimentícios e artigos industriais, são abolidos os
preços elevados no comércio privado e introduz-se um sistema único de preços
estatais reduzidos a retalho para os bens alimentícios e artigos industriais
(…)» [A URSS foi o primeiro país europeu a abolir o sistema de racionamento
após a II Guerra Mundial.]
O sistema de
senhas de racionamento, que permitiu durante o período da guerra salvar
muitas pessoas de morrerem à fome, suscitava um grande desconforto psicológico
depois da vitória. A variedade de produtos vendidos com senhas era extremamente
pobre. Por exemplo, nas padarias só havia duas qualidades de pão, de centeio
e de trigo, que eram vendidos a peso de acordo com a norma indicada na senha
de racionamento. A escolha noutros produtos alimentícios era igualmente pequena.
Ao mesmo tempo, no comércio privado havia uma tal abundância de produtos que
faria inveja a quaisquer supermercados modernos. Mas os preços nestas lojas
eram inacessíveis para a maioria da população, que apenas adquiria ali produtos
para ocasiões festivas. Após a abolição do sistema de racionamento toda esta
abundância podia encontrar-se em qualquer mercearia a preços bastante acessíveis.
Por exemplo, os bolos de pastelaria, que antes só eram vendidos nas lojas
privadas, baixaram de 30 para 3 rublos. Em geral, os preços de mercado dos produtos
alimentícios baixaram mais de três vezes. Durante o racionamento, os artigos
industriais de consumo só se vendiam mediante autorizações especiais, mas a
obtenção destas não garantia o acesso às correspondentes mercadorias. Depois
da abolição manteve-se durante algum tempo uma certa carência de artigos industriais,
mas tanto quanto me lembro, em 1951 já não havia falta destes produtos, pelo
menos em Leninegrado.
Entre 1949 e
1951, no dia 1 de Março de cada ano, os preços baixaram em média 20 por
cento. Cada baixa de preços era saudada pelo povo como um acontecimento festivo.
Quando no dia 1 de Março de 1952 não se verificou uma nova descida dos preços,
houve um sentimento de decepção nas pessoas. No entanto, logo em 1 de Abril
do mesmo ano os preços voltaram a baixar. A última baixa de preços ocorreu em
1 de Abril de 1953, já depois da morte de Estaline. No período pós-guerra os preços
dos alimentos e dos artigos industriais mais comuns baixaram em média mais de
duas vezes. Nos oito anos que se seguiram ao fim da guerra [1946-1953], a vida
do povo soviético melhorou sensivelmente de ano para ano. Na história da humanidade,
não se conhecia semelhante precedente em nenhum país.
É possível
avaliar o nível de vida da população da URSS em meados dos anos 50, através
dos dados dos inquéritos sobre os orçamentos das famílias de operários, empregados
dos serviços e kolkhozianos [1], que foram realizados pela Direcção Central
de Estatísticas da URSS (TsSU), entre 1935 e 1958. (Estes materiais, antes classificados
como «secretos», estão hoje publicados no site istmat.info [2]). Foram analisados os rendimentos das
famílias de nove grupos da população: kolkhozianos, operários dos sovkhozes,
operários da indústria, professores do ensino básico e do ensino secundário,
médicos e profissionais intermédios da saúde. A parte mais abastada da
população, em que se incluíam os operários da indústria militar, o pessoal
das organizações de projectos e arquitectura, das instituições científicas, bem
como os docentes do ensino superior, os trabalhadores das cooperativas industriais
e artesanais e o pessoal militar, infelizmente, não foi objecto de estudo da
TsSU.
Dos grupos
estudados atrás referidos, os médicos auferiam os rendimentos mais elevados.
Cada membro da sua família tinha um rendimento médio mensal de 800 rublos. Da
população urbana, os menores rendimentos eram auferidos pelos empregados dos
serviços da indústria: 525 rublos por mês por cada membro da família. Na
população rural, o rendimento per
capita era de 350 rublos. Porém, enquanto os operários dos sovkhozes [1] auferiam
o seu rendimento sob a forma monetária, já no que respeita aos kolkhozianos o
rendimento era calculado levando também em conta o valor dos bens de produção
própria consumidos pela família, [segundo um cabaz de compras. Ver nota 3 -
JMS] aos preços fixados pelo Estado.
[Foi com as
políticas remuneratórias do tempo de Estaline que a desigualdade social da
URSS teve a maior descida, tornando-se a menor do mundo. Ver nota 4 - JMS]
Em todos os
grupos da população, incluindo a rural, o consumo de alimentos per capita situava-se aproximadamente
no mesmo nível, ou seja, cerca de 200-210 rublos mensais por cada membro da
família. Apenas nas famílias de médicos, o valor do cabaz alimentar atingia
os 250 rublos mensais, devido a um consumo superior de manteiga, produtos de
carne, ovos, peixe e fruta, e inferior de pão e batatas. Os residentes rurais
consumiam mais pão, batatas, ovos e leite, mas significativamente menos
manteiga, peixe, açúcar e produtos de confeitaria. Deve-se notar que o
montante de 200 rublos, gasto em média na alimentação, não estava directamente
relacionado com o rendimento da família ou com uma escolha limitada de
produtos disponíveis, mas era sobretudo determinado pelos hábitos familiares.
Na minha família, que era constituída em 1955 por quatro pessoas, incluindo
dois filhos em idade escolar, o rendimento mensal por pessoa era de 1200 rublos.
A variedade de produtos nas mercearias era sensivelmente maior dos que nos
actuais supermercados. No entanto, os gastos da nossa família em comida, incluindo
os pequenos-almoços escolares e os almoços dos pais nas cantinas do trabalho,
não ultrapassavam os 800 rublos por mês.
A comida era
muito barata nas cantinas das instituições. Numa cantina para estudantes, o
almoço, incluindo sopa com carne, um prato de carne, compota de fruta ou um
bolo com chá, custava cerca de dois rublos. O pão era gratuito e estava sempre
nas mesas. Por isso, nos dias anteriores ao recebimento do estipêndio [bolsa
de estudo], alguns estudantes que viviam autonomamente pagavam 20 kopeques
pelo chá e alimentavam-se com pão e mostarda. A propósito, a mostarda, sal e
pimenta estavam também sempre à disposição nas mesas das cantinas. O estipêndio
no instituto onde estudei a partir de 1955 era de 290 rublos (com notas excelentes
aumentava para 390 rublos). Os estudantes que não viviam na cidade pagavam 40
rublos pela residência estudantil. Os restantes 250 rublos chegavam perfeitamente
para levar uma vida normal de estudante numa grande cidade. Tanto assim era
que, em regra, os estudantes que vinham de fora não recebiam ajudas da família
nem precisavam de trabalhar nos tempos livres.
Naquele tempo,
as lojas de produtos alimentícios de Leninegrado tinham uma grande
diversidade de produtos, em particular na secção da peixaria. Várias variedades
de caviar vermelho e preto eram apresentadas em grandes tigelas. Havia um
sortido completo de salmonídeos de carne branca, fumados a quente e a frio, e
de carne vermelha, do keta ao salmão do Atlântico, [5] enguias fumadas e lampreias marinadas,
arenques de conserva em lata ou em barril. Peixe vivo de rio ou de viveiros
era transportado para as lojas imediatamente após a captura, em camiões cisterna
especiais com a inscrição «Peixe». Naquela altura ainda não havia peixe congelado,
que só surgiu no início dos anos 60. Havia uma multiplicidade de conservas de
peixe, das quais recordo o caboz [6] em molho de tomate, os omnipresentes
caranguejos, a 4 rublos a lata, e o produto preferido dos estudantes que
viviam em residências estudantis: fígados de bacalhau. As carnes de vaca e de
borrego dividiam-se em quatro categorias com preços diferentes consoante a
parte da carcaça. Na secção dos semi-preparados havia panados de vitela,
entrecôte, febras e escalopes de porco. A variedade de enchidos era substancialmente
maior do que agora, e ainda hoje recordo o seu sabor. Agora, só na Finlândia
se pode degustar enchidos que fazem lembrar os soviéticos daquela época. Deve
referir-se que o sabor da salsicharia cozida foi alterado no início dos anos
60, depois de Khruchov ter ordenado a adição de soja à carne. Esta ordem foi ignorada
apenas nas repúblicas do Báltico, onde nos anos 70 ainda se podia comprar uma
verdadeira mortadela «medicinal». [7] Bananas, ananases, mangas, romãs e
laranjas podiam comprar-se nas grandes lojas ou nas mercearias especializadas
durante o ano inteiro. Habitualmente, na nossa família, os legumes e frutas
eram comprados no mercado, onde a maior frescura e possibilidade de escolha
compensavam os preços mais elevados.
Nos inquéritos
da TsSU atrás referidos foram apurados dados sobre o consumo de produtos alimentícios
das famílias operárias nas diferentes regiões da República Socialista
Federativa Soviética da Rússia. Entre duas dezenas de produtos, apenas em
dois se encontra um desvio substancial (mais de 20%) em relação ao nível de consumo
médio. Em média no país cada pessoa consumia 5,5 quilogramas de manteiga por
ano. Em Leningrado, porém, a média elevava-se para 10,8 quilogramas e em
Moscovo para 8,7 kg, enquanto no oblast de Lipetsk era de 2,2 kg e no oblast
de Briansk não passava de 1,7 kg por pessoa. Em todas as outras regiões da
Rússia o consumo médio de manteiga per capita nas famílias operárias era superior
a três quilos por ano. Temos um quadro semelhante quanto ao consumo de
salsicharia. O nível médio no país era de 13 quilos por pessoa e por ano. Em Moscovo
o consumo elevava-se a 28,7 kg e em Leningrado a 24,4 kg. Já no oblast de
Lipetsk baixava para 4,4 kg e no oblast de Briansk para 4,7kg. Nas restantes regiões
a média era superior a 7 quilos por pessoa e por ano. Todavia, o rendimento
das famílias operárias em Moscovo e Leningrado era igual ao rendimento médio
desta camada da população nas restantes regiões, representando sete mil
rublos por ano [583 rublos por mês] por cada membro da família. Em 1957 estive
nas cidades do Volga de Ribinsk, Kostroma e Iaroslav. O sortido de bens alimentícios
era menor que em Leningrado, mas tanto a manteiga como a salsicharia estavam
nas prateleiras das lojas, enquanto a variedade de pescado era talvez mesmo
maior que em Leningrado. Deste modo, pelo menos entre 1950 e 1959, a
população da URSS estava totalmente abastecida de produtos alimentícios.
A situação
alterou-se radicalmente a partir de 1960. É verdade que em Leningrado isso
não se notou particularmente. Apenas me recordo do desaparecimento do
comércio das frutas importadas, do milho em conserva e da farinha, produto
que tinha a maior relevância para a população. Sempre que aparecia farinha à
venda numa loja qualquer formava-se enormes filas, e não se vendia mais que
dois quilos por pessoa. Estas foram as primeiras filas que vi em Leningrado
desde o final dos anos 40. Nas cidades de menor dimensão, segundo relatos de
familiares e amigos, para além da farinha desapareceram do comércio a manteiga,
a carne, a salsicharia, o peixe (à excepção de um pequeno conjunto de conservas),
os ovos, o frango e as massas alimentícias. A variedade dos produtos de padaria
diminuiu acentuadamente. Em 1964 eu próprio vi prateleiras vazias nas mercearias
de Smolensk.
Sobre a vida da
população rural guardo apenas algumas impressões dispersas (sem considerar os
inquéritos sobre os rendimentos realizados pela TsSU da URSS). Em 1951, 1956
e 1962 passei férias nas margens do Mar Negro do Cáucaso. Na primeira vez fui
com os meus pais, depois já viajei autonomamente. Naquele tempo, o comboio
tinha longas paragens nas estações e até em pequenas subestações. Nos anos
50, durante as paragens, entravam no comboio habitantes locais com diferentes
alimentos para vender aos passageiros, nomeadamente frango cozido, frito e
fumado, ovos cozidos, enchidos caseiros, pastéis quentes com diferentes
recheios, por exemplo, de peixe, carne, fígado ou cogumelos. Em 1962, de
comida apenas trouxeram batatas quentes com pepinos salgados. No Verão de
1957 entrei para a brigada estudantil de concertos, organizada pelo Comité do
Oblast de Leningrado. Descemos o rio Volga numa pequena embarcação de madeira
e dávamos concertos nas aldeias ribeirinhas. Naquele tempo eram poucos os
divertimentos nas aldeias e por isso praticamente todos os habitantes vinham
assistir aos nossos concertos nos clubes locais. Não se distinguiam da população
urbana nem pelo vestuário nem pela expressão facial. Os jantares que nos
ofereciam no final dos concertos mostravam que mesmo nas pequenas aldeias não
havia falta de produtos alimentícios.
No início dos
anos 80, por razões de saúde, estive internado num sanatório situado no
oblast de Pskov. Uma vez desloquei-me até à aldeia mais próxima para degustar
o leite local. Uma loquaz velhota que veio ao meu encontro rapidamente desfez
as minhas esperanças. Disse-me que depois de Khruchov ter proibido a criação
individual de gado e de ter retirado as parcelas de terreno aos residentes, a
aldeia empobrecera completamente. Os tempos antigos eram recordados como o século
de ouro. Desde então a carne desapareceu por completo na dieta dos habitantes
rurais, enquanto o leite só ocasionalmente era fornecido às crianças pelo kolkhoz
local. Antes havia carne suficiente para abastecimento próprio e para vender
no mercado; era isso que garantia o grosso do rendimento das famílias camponesas,
e não o que ganhavam no kolkhoz. Noto que, segundo as estatísticas do TsSU da
URSS, em 1956, cada habitante rural da Rússia consumia mais de 300 litros de
leite por ano, ao mesmo tempo que aos habitantes das cidades cabia entre 80 a
90 litros por ano. Em 1959, o TsSU suspendeu os seus inquéritos secretos sobre
os orçamentos familiares.
Em meados dos
anos 50, o acesso da população a artigos industriais era bastante elevado.
Por exemplo, nas famílias operárias, cada um dos seus membros adquiria mais
de três pares de calçado. A qualidade e a variedade de artigos de consumo de produção
exclusivamente nacional (vestuário, calçado, loiça, brinquedos, móveis e outros
artigos de consumo geral) era muito mais elevada do que nos anos posteriores.
Na verdade, a maior parte destes artigos não era produzida em empresas
estatais mas em cooperativas. Não obstante, a produção das cooperativas vendia-se
nas lojas normais do Estado. As novas tendências da moda eram seguidas instantaneamente,
e em poucos meses os artigos da moda apareciam com abundância nas lojas. Por
exemplo, em meados dos anos 50 surgiu a moda entre a juventude dos ténis com
uma grossa sola de borracha branca, imitando o cantor de rock'n'roll Elvis
Presley, extremamente popular naqueles anos. No Outono de 1955, comprei
calmamente um par destes ténis de produção nacional num grande armazém do
Estado, juntamente com outros artigos de moda, designadamente uma gravata
estampada com cores vivas. A única coisa que nem sempre se encontrava à venda
eram as gravações discográficas mais populares. No entanto, em 1955, tinha discos
de praticamente todos os mais conhecidos músicos e cantores de jazz norte-americanos,
comprados em lojas normais, tais como Duke Ellington, Benny Goodman, Louis
Armstrong, Ella Fitzgerald, Glenn Miller, etc. Apenas as gravações de Elvis
Presley, reproduzidas ilegalmente em película de radiografia usada (como então
se dizia gravadas «nos ossos»), tive de comprar fora do circuito comercial. Não
me recordo de artigos importados naquele período. Tanto o vestuário como o calçado
eram produzidos em pequenas séries e com uma grande variedade de modelos.
Além disso, era muito comum a confecção de vestuário e calçado por medida nos
numerosos ateliers de costura e malhas ou nas oficinas de sapateiros que
estavam integrados em cooperativas de artesãos. Havia muitos alfaiates e sapateiros
que trabalhavam individualmente. As fazendas eram o artigo mais corrente na
época. E ainda hoje me lembro dos nomes dos tecidos mais populares, como o drap, cheviote [tweed], boston, crepe
da china, etc.
Entre 1956 e
1960 [com Khruchov] decorreu o processo de liquidação das cooperativas
artesanais. A maior parte destas empresas foi estatizada e as restantes
encerraram ou ficaram em situação ilegal. Foi também proibido o licenciamento
da produção individual. Diminuiu bruscamente a produção de quase todos as
mercadorias de consumo geral, tanto em volume como em variedade. Foi
precisamente nessa altura que surgiram artigos de consumo importados, que se
esgotavam de imediato apesar do seu alto preço e do limitado sortido.
Posso ilustrar
a vida da população da URSS em 1955 a partir do exemplo da minha família. O
meu pai, de 50 anos, era chefe de departamento de um Instituto de Projectos.
A minha mãe, de 45 anos, era engenheira-geóloga da Lenmetrostroi [empresa de
construção do metro de Leningrado]. Eu, com 18 anos, tinha terminado a escola
secundária. O meu irmão, de dez anos, estava na escola básica. O rendimento
da família era constituído por três parcelas: os vencimentos base (2200
rublos do meu pai e 1400 rublos da minha mãe); o prémio trimestral pelo cumprimento
do plano (normalmente 60 por cento do vencimento); e um prémio suplementar
por trabalho realizado acima do plano. Não me recordo se a minha mãe recebia
este último prémio, mas era normal o pai recebê-lo uma vez por ano. Em 1955 o
prémio foi de 6000 rublos. Nos outros anos rondava mais ou menos o mesmo
valor. Lembro-me de o meu pai, depois de receber este prémio, espalhar na mesa
de jantar várias notas de cem rublos em forma de jogo de paciência de cartas.
Depois preparámos um jantar festivo.
O rendimento
médio mensal da nossa família era de 4800 rublos ou 1200 por pessoa, como já
referi. Deste montante, 550 rublos eram destinados a impostos e quotizações
do partido e dos sindicatos. Na alimentação gastava-se 800 rublos; 150 eram
para pagar o alojamento e os serviços comunais (água, aquecimento, electricidade,
gás, telefone); 500 rublos eram gastos em vestuário, calçado, transportes e
lazer. Deste modo, as despesas regulares da nossa família de quatro pessoas
representavam 2000 rublos por mês. Restavam 2800 rublos mensais ou seja 33
600 rublos por ano.
Os rendimentos
da nossa família estavam mais próximos do nível médio do que do alto. Os
rendimentos mais elevados eram auferidos pelos trabalhadores do sector
privado (as cooperativas), que constituíam mais de cinco por cento da população
urbana. Também os oficiais do exército, do Ministério dos Negócios Estrangeiros
e do Ministério da Segurança do Estado recebiam salários elevados. Por
exemplo, um tenente comandante de pelotão ganhava entre 2600 e 3600 rublos
por mês, consoante a região em que estivesse destacado. Além disso, os vencimentos
dos militares estavam isentos de impostos. Para dar uma ideia dos rendimentos
dos trabalhadores da indústria militar refiro como exemplo o caso de uma
jovem família amiga, que trabalhava no gabinete de construções experimentais do
Ministério da Indústria Aeronáutica. O marido, com 25 anos, engenheiro principal,
tinha um vencimento de 1400 rublos e um rendimento mensal, contando com os
diferentes prémios e comissões de serviço, de 2500 rublos. A mulher, de 24 anos,
técnica superior, tinha 900 rublos de vencimento e um rendimento mensal de 1500
rublos. Ao todo esta família de duas pessoas ganhava 4000 rublos por mês. Por
ano punham de lado cerca de 15000 rublos. Penso que uma parte significativa
das famílias citadinas podia economizar anualmente entre 5000 e 10000 rublos.
Os automóveis
destacavam-se entre os artigos mais dispendiosos. A variedade de modelos não
era grande, mas não havia qualquer dificuldade em adquiri-los. Em Leningrado,
o salão automóvel situava-se no grande centro comercial «Aparksine Dvor».
Lembro-me de que em 1955 estavam ali expostos para venda livre os seguintes
modelos de automóveis: o «Moskvitch» 400 por 9000 rublos (classe económica),
o «Pobiéda» por 16000 rublos (classe executiva) e o «ZIM», predecessor do
«Thaika», por 40000 rublos (classe representativa). As poupanças da nossa
família eram suficientes para comprar qualquer destes automóveis, incluindo o
«ZIM». Mas o Moskvitch era o automóvel mais acessível para a maioria da
população. No entanto, naquele tempo, não havia grande procura de automóveis,
pois eram vistos como brinquedos caros que acarretavam muitos problemas na
sua utilização e manutenção. O meu tio tinha um Moskvitch que utilizava
apenas algumas vezes por ano em viagens para fora da cidade. Comprou-o ainda
em 1949 apenas porque no pátio da sua casa havia um antigo estábulo que pôde
transformar em garagem. Ao meu pai propuseram-lhe a compra de um Willys, o
todo-o-terreno militar norte-americano, por apenas 1500 rublos, mas ele
recusou pois não tinha sítio para guardar o automóvel.
No pós-guerra
era comum as pessoas procurarem pôr de lado o máximo de dinheiro possível.
Lembravam-se bem de que nos anos da guerra o dinheiro podia salvar vidas. No
período mais difícil do bloqueio de Leninegrado continuou a funcionar um
mercado onde se podia comprar todo o tipo de alimentos ou trocá-los por
objectos. Nas notas do meu pai sobre o bloqueio, com data de Dezembro de 1941,
estão indicados os preços bem como os respectivos equivalentes em objectos de
valor nesse mercado: 1 kg de farinha = 500 rublos = um par de botas de
feltro; 2 kg de farinha = um casaco de pele de astracã; 3 kg de farinha = um
relógio de ouro. Porém, as dificuldades em obter alimentos não existiam só em
Leningrado. No Inverno de 1941-1942, as pequenas cidades de província, onde
não havia indústria militar, deixaram de ser abastecidas com víveres. A
população destas cidades sobrevivia graças à troca de artigos pessoais e
domésticos por alimentos fornecidos pelos camponeses das aldeias vizinhas.
Nessa época, a minha mãe era professora primária na cidade de Belozersk, sua
terra natal e uma das mais antigas cidades da Rússia. Como mais tarde nos
contou, em Fevereiro de 1942, mais de metade dos seus alunos morreram de
fome. Nós sobrevivemos apenas porque na nossa casa, ainda dos tempos
anteriores à revolução, havia muitos objectos que eram apreciados nas
aldeias. Mas a avó da minha mãe também morreu de fome em Fevereiro de 1942
porque prescindiu da sua comida para a neta e o seu bisneto de quatro anos. A
minha única boa recordação dessa altura foi o presente de ano novo oferecido
pela minha mãe: era um bocado de pão escuro com uma fina camada de açúcar, ao
qual a minha mãe chamou bolo. Só viria a comer o primeiro verdadeiro bolo em
Dezembro de 1947, quando inesperadamente me vi rico. No meu mealheiro de
criança havia mais de 20 rublos em trocos, e as moedas tinham sido mantidas
na reforma monetária. Só em Fevereiro de 1944, quando regressámos a
Leningrado depois do levantamento do bloqueio, deixei de ter a sensação
permanente de fome. Em meados dos anos 60, a memória dos horrores da guerra
começou a dissipar-se. Surgiu uma nova geração que já não se preocupava com
poupanças, e começou a haver falta de automóveis, apesar de nessa altura
serem três vezes mais caros, tal como de muitos outros artigos.
Deixo aqui
alguns preços de 1955: pão de centeio, 1 rublo/kg; carcaça, 1,5 rublos/0,5
kg; carne, 12,5-18 rublos/kg; peixe vivo (carpa), 5 rublos/kg; caviar de esturjão,
180 rublos/kg; almoço numa cantina, 2-3 rublos; sapatos de couro, 150-250
rublos; bicicleta «Turist» de três velocidades, 900 rublos; motociclo IJ-49
com motor de 350 c.c., 2500 rublos; bilhete de cinema, 0,5-1 rublo; bilhete
de teatro ou concerto, 3-10 rublos.
Tentarei
avaliar o nível de vida da população da URSS em 1955 através da comparação
dos orçamentos familiares de agregados soviéticos e norte-americanos, compostos
por quatro pessoas (dois adultos e duas crianças). A título de exemplo tomamos
três famílias médias norte-americanas: a primeira em 1955, segundo dados do
Gabinete de Recenseamento da População dos EUA; a segunda em 2010, na base de
dados do Ministério do Trabalho dos EUA; e uma terceira família verdadeira do
Estado de Virgínia, que concordou em nos fornecer informações sobre o seu
orçamento em 2011.
Do lado
soviético analisaremos os orçamentos de duas famílias médias, uma rural e outra
urbana, em 1955, constituídas por quatro pessoas, de acordo com os dados da Direcção
Central de Estatísticas da URSS (TsSU), e da minha própria família em 1966, altura
em que registava diariamente os rendimentos e despesas familiares.
Dado que temos
diferentes unidades monetárias nestes dois países e três períodos, utilizaremos
na análise dos orçamentos o rublo/Estaline de 1947. O poder de compra deste
rublo era equivalente ao poder de compra do dólar actual ou a 30 rublos
actuais. Em 1955, o dólar norte-americano correspondia a seis rublos/ Estaline
(na cotação em ouro – quatro rublos) [confirmámos a cotação em ouro - JMS].
Em 1961, em resultado da reforma monetária de Khruchov, cada rublo passou a
equivaler a dez dos anteriores. No entanto, devido ao aumento dos preços de
mercado e dos fixados pelo Estado, o poder de compra do rublo baixou cerca de
1,6 vezes. Deste modo o rublo na época de Khruchov equivalia não a dez, mas a
seis rublos da época de Estaline (na cotação em ouro de 1961, um dólar = 90
kopeques) [confirmámos a cotação em ouro - JMS].
|
[The
article begins with an introduction which we condense - JMS]
[...]
The
uniqueness of the Khrushchevian revolution was that the changes went on for
several years, having passed almost unnoticed by the population.
[...]
Until
1960, the USSR had a leading position in the world in fields such as health,
education, science and innovative areas of industry (atomic industry, rocket
construction, electronics, computer technology and automation of production).
On the whole, the economy of the
In
what follows I will try to show in detail how ordinary people lived in the
USSR in the years 50 of last century. By relying on personal memories,
accounts of people I have met throughout my life, as well as on some
documents of the time that are accessible on the Internet, I will try to show
how far from reality are the present representations of a recent past from a
great country.
[...]
It is good to live in the Land of Soviets!
Immediately
after the end of the war, the life of the population of the USSR began to
improve markedly. In 1946 a 20 percent increase in the salaries of the
workers, technicians and engineers who worked in enterprises and constructions
in the Urals, Siberia and
[The
amounts indicated are monthly salaries. In 1946 the ruble was worth $ 0.1877.
1000 rubles were therefore worth $ 188.7, that is about $ 2387 as of 2017. It
should, however, be noted that this equivalent is greatly undervalued because
it doesn’t take into account the social benefits and price system of Soviet
socialism. The author will take this aspect into consideration in a table
below. - JMS]
In
December 1947 there was an event which, because of the emotional impact on
the people, was comparable to the end of the war. As stated in the Decree of
the Council of Ministers of the USSR and the CC of the CPU(b), no. 4004 of
December 14, "(...) from 16
December 1947 is abolished the system of rationing tickets for the supplying
of food and industrial goods, high prices in private trade are abolished, and
a single system of reduced retail prices for food and industrial goods is
introduced (...)" [The USSR was the first European country to
abolish the rationing system after World War II.]
The
system of rationing tickets, which allowed saving many people from dying of
starvation during the war, aroused great psychological discomfort after the
victory. The variety of products sold with tickets was extremely poor. For
example, in bakeries there were only two qualities of bread, rye and wheat,
which were sold by weight according to the norm indicated in the rationing ticket.
The choice of other food products was also small. At the same time, in the
private trade there was such an abundance of products that would cause the envy
of any modern supermarket. But the prices in these stores were inaccessible
to the majority of the population, who only purchased products there for
festive occasions. After the abolition of the rationing system all this
abundance could be found in any grocery store at very affordable prices. For
example, pastry cakes, which previously were only sold in private stores, fell
from 30 to 3 rubles. In general, market prices for food products have fallen
more than threefold. During rationing, industrial consumer goods were sold
only with special authorizations, but obtaining them did not guarantee access
to the corresponding goods. After the abolition a certain shortage of
industrial goods remained for some time, but as far as I remember, in 1951
there was no shortage of these products, at least in Leningrad.
On
March 1 of each year, between 1949 and 1951, prices fell by an average of 20
percent. Each price drop was hailed by the people as a festive event. When on
March 1, 1952, there was no further decline in prices, there was a sense of
disappointment in the people. However, as of April 1 of the same year, prices
fell again. The last price drop occurred on April 1, 1953, after Stalin's
death. In the post-war period, the prices of food and of the most common
industrial commodities fell more than twice on average. In the eight years
following the end of the war [1946-1953], the life of the Soviet people
improved markedly from year to year. In the history of mankind, no such
precedent was known in any country.
It
is possible to assess the standard of living of the population of the USSR in
the mid-1950s, based on surveys of the budgets of the families of workers,
service employees and kolkhozians, [1] which were carried out by the Central
Bureau of Statistics of the USSR (TsSU) between 1935 and 1958. (These
materials, previously classified as "secrets", are now published on
the website istmat.info [2]). The income of the families of nine population
groups -- kolkhozians, sovkhoz workers, industry workers, primary and
secondary school teachers, doctors and intermediate health professionals -- were
analyzed. The wealthiest part of the population -- including military
industry workers, staff of project and architecture organizations, scientific
institutions, as well as higher education teachers, workers in industrial and
craft cooperatives, and military personnel -- was not, unfortunately, studied
by TsSU.
As
regards the groups mentioned above, physicians received the highest incomes.
Each member of a physician’s family had an average monthly income of 800
rubles. Regarding the urban population, the lowest incomes were earned by the
employees of the industry services: 525 rubles per month for each family
member. In the rural population, the income per capita was 350 rubles. But while the workers of the sovkhozes
[1] received their income in the form of money, as far as the kolkhozians were
concerned, income was also calculated by taking into account the value of the
self-produced goods consumed by the family [according to a consumer’s basket.
See note 3 -- JMS] at the prices fixed by the State.
[It
was with the remuneration policies of Stalin’s time that the social
inequality of the
In
all groups of the population, including the rural population, the per capita food consumption was
approximately at the same level, i.e., around 200-210 rubles per month for
each family member. Only in medical families did the value of the food basket
reach 250 rubles a month, due to a higher consumption of butter, meat
products, eggs, fish and fruit, and lower in bread and potatoes. Rural
residents consumed more bread, potatoes, eggs and milk, but significantly
less butter, fish, sugar and confectionery products. It should be noted that
the amount of 200 rubles, spent on average on food, was not directly related
to family income or to a limited choice of available products, but was mainly
determined by family habits. In my family, which was constituted in 1955 by
four people, including two children of school age, the monthly income per
person was 1200 rubles. The variety of products in the grocery stores was
appreciably greater than in today’s supermarkets. In spite of that, our
family's food expenses, including school breakfasts and parents' lunches in
the work canteens, did not exceed 800 rubles a month.
The
food was very cheap in the canteens of the institutions. In a student
canteen, lunch, including soup with meat, a meat dish, fruit compote or a
cake with tea, cost about two rubles. The bread was free and always on the
tables. Therefore, in the days before receiving the stipend [study grant],
some students who lived independently paid 20 kopecks for tea and ate bread with
mustard. By the way, the mustard, salt and pepper were also always available
on the tables in the canteens. The stipend in the institute where I studied since
1955 was 290 rubles (if one had excellent grades it increased to 390 rubles).
Students who did not live in the city paid 40 rubles for the student
residence. The remaining 250 rubles were perfectly enough to carry on a
normal student life in a large city. So much so, that as a rule the students
who came from outside did not receive help from the family nor did they need
to work in their free time.
At
that time, Leningrad food stores had a great diversity of products,
particularly in the fish market section. Several varieties of red and black
caviar were presented in large bowls. There was a complete assortment of
white meat salmonids, smoked hot and cold, and of red meat salmonids, from
keta to Atlantic salmon [5], smoked eels and marinated lampreys, canned or in
barrel. Live fish from the river or nurseries were transported to the shops
immediately after the capture, in special tankers with the inscription “Fish”.
At that time there was still no frozen fish, which only appeared in the early
60's. There were a multitude of fish preserves, from which I recall the goby
[6] in tomato sauce, the omnipresent crabs, at 4 rubles a can, and the favorite
product of students living in student residences: cod livers. Cow and lamb
meat were divided into four categories with different prices depending on the
part of the carcass. In the section of the semi-prepared there were veal scallops,
spare ribs, pork steaks and pork scallops. The variety of sausages was
substantially larger than nowadays, and I still recall their flavors today. Presently,
it is only in
Data
on the consumption of food products by working families in the different
regions of the Russia Soviet Federative Socialist Republic were established
in the TsSU surveys referred to above. From among two dozen products, in only
two are found a substantial deviation (more than 20%) from the average
consumption level. On average each person in the country consumed 5.5
kilograms of butter per year. In Leningrad, however, the average came as high
as 10.8 kilograms and in Moscow was 8.7 kilograms, whereas in the Lipetsk
oblast it was 2.2 kilograms and in the Briansk oblast it was only 1.7
kilograms per person. In all other regions of Russia the average consumption per capita of butter in the working-class
families was more than three kilos per year. We have a similar picture for
the consumption of sausages. The average level in the country was 13 kilos
per person per year. In Moscow the consumption was 28.7 kg and in Leningrad
24.4 kg. However, it lowered to 4.4 kg in the oblast of
The
situation changed radically since 1960. It is true that in Leningrad this was
not particularly noticed. I only remember the disappearance of the commerce
in imported fruits, canned corn and flour, a product that had the greatest
relevance for the population. Whenever flour appeared on the market for sale
in any store, huge queues were formed, and no more than two kilos per person
were sold. These were the first queues I had seen in Leningrad since the late
1940s. According to reports from family members and friends, in addition to
flour, butter, meat, sausages and fish also disappeared from the commerce butter,
meat, sausages, fish (except a small set of preserves), eggs, chicken and
pasta. The variety of bakery products declined sharply. In 1964 I saw empty
shelves in the
As
regards the life of the rural population I only have a few scattered
impressions (not counting the surveys on the income realized by the TsSU of
the USSR). In 1951, 1956 and 1962 I went on vacations to the shores of the
Black Sea in the
In
the early 1980s, for health reasons, I was admitted to a sanatorium on the
oblast of Pskov. Once, I went to the nearest village to taste the local milk.
An old talkative woman who came to meet me quickly undid my hopes. She told
me that after Khrushchev had forbidden the individual breeding of livestock
and had withdrawn land plots from the residents, the village was completely
impoverished. The old times were remembered as the golden century. Since then
the meat had completely disappeared from the diet of the rural inhabitants,
while the milk was only occasionally supplied to the children by the local
kolkhoz. Previously there was enough meat for own consumption and for sale in
the market; this was what guaranteed the bulk of peasant families' income,
not what they earned in the kolkhoz. I note that, according to the TsSU
statistics of the USSR, in 1956, every rural inhabitant of Russia consumed
more than 300 liters of milk per year, while at the same time the townspeople
had between 80 and 90 liters per year. In 1959, TsSU suspended its secret
inquiries on family budgets.
By
the mid-1950s, population access to industrial goods was quite high. For
example, in the workers’ families, each of their members acquired more than
three pairs of footwear. The quality and variety of domestically produced
consumer goods (clothing, footwear, dishware, toys, furniture and other
articles of general consumption) was much higher than in subsequent years. In
fact, most of these articles were not produced in state-owned enterprises but
in co-operatives. Nevertheless, the production of the co-operatives was sold
in the normal stores of the State. The new fashion trends were followed
instantly, and in a few months the fashionable articles appeared abundantly
in the stores. For example, in the mid-1950s there was a fashion among the
youth of sneakers with a thick white rubber outsole, imitating the rock' n' roll
singer Elvis Presley, extremely popular in those years. In the autumn of
1955, I calmly bought a pair of these nationally produced sneakers in a large
department store along with other fashion items, namely a tie printed in
bright colors. The only thing that was not always on sale were the most
popular sound recordings. However, in 1955, I had albums of practically all
of the best-known American jazz musicians and singers, bought in regular
stores, such as Duke Ellington, Benny Goodman, Louis Armstrong, Ella
Fitzgerald, Glenn Miller, etc. Only the Elvis Presley's recordings, illegally
reproduced on used X-ray film (as they said then, written “on the bones”), I had
to buy outside the commercial circuit. I do not remember imported articles in
that period. Both clothing and footwear were produced in small series and
with a wide variety of models. In addition, it was very common to make
tailor-made clothing and footwear at numerous sewing and knitting workshops
or at shoemakers' workshops that were integrated into artisan co-operatives.
There were many tailors and cobblers who worked individually. Cloths were the
most common item at the time. And even today I remember the names of the most
popular fabrics, such as drap, cheviote [tweed], boston, china crepe, etc.
Between
1956 and 1960 [with Khrushchev] the process of liquidation of the artisanal
co-operatives took place. Most of these companies were nationalized and the
rest closed or became illegal. Licensing of individual production was also
prohibited. The production of almost all commodities of general consumption
was sharply reduced, both in volume and variety. It was precisely at that
time that imported consumer goods emerged, which were immediately sold out despite
their high price and limited stock.
I
can illustrate the life of the population of the USSR in 1955 from the
example of my family. My father, 50-years old, was the head of a department
of an Institute of Projects. My mother, 45-years old, was an
engineer-geologist at Lenmetrostroi [Leningrad metro construction company].
I, at 18, had finished high school. My 10-years old brother was in the elementary
school. The family income consisted of three components: the basic salaries
(2200 rubles of my father and 1400 rubles of my mother); the quarterly bonus
for compliance with the plan (usually 60 percent of the dues); and an
additional bonus for work performed above the plan. I do not remember whether
my mother received the latter bonus, but it was normal for father to receive
it once a year. In 1955 the bonus was 6000 rubles. In other years it was more
or less the same value. I remember my father, after receiving this bonus,
spreading on the dinner table several hundred-ruble notes in the form of
card-game solitaire. We then prepared a festive dinner.
The
average monthly income of our family was 4800 rubles or 1200 per person, as I
have already mentioned. Out of this amount, 550 rubles were intended for
taxes and contributions for the party and trade unions. 800 rubles were spent
in food; 150 were to pay for housing and communal services (water, heating,
electricity, gas, telephone); 500 rubles were spent on clothing, footwear,
transport and leisure. Thus the regular expenses of our family of four amounted
to 2000 rubles per month. There remained 2800 rubles per month, or 33,600
rubles per year.
Our
family's incomes were closer to the middle than to the high level. The
highest incomes were earned by private sector workers (the co-operatives),
who made up more than five per cent of the urban population. Army Officers,
the Ministry of Foreign Affairs and the Ministry of State Security also
received high salaries. For example, a lieutenant commanding a platoon earned
between 2600 and 3600 rubles per month, depending on the region in which he
was posted. In addition, the salaries of the military were exempt from taxes.
To give an idea of the income of the military industry workers, I refer to
the case of a young friendly family who worked at the office of experimental constructions
of the Ministry of Aeronautics. The husband, 25 years old, chief engineer,
had a salary of 1400 rubles and a monthly income, adding the different
bonuses and service commissions of 2500 rubles. The 24-year-old wife, a high technician,
had 900 rubles salary and a monthly income of 1,500 rubles. In all, this
family of two people earned 4000 rubles a month. They put aside per year
around 15000 rubles. I think that a significant part of the city's households
could save annually between 5000 and 10000 rubles.
Cars
stood out among the most expensive items. The variety of models was not
great, but there was no difficulty in acquiring them. In Leningrad, the car stand
was located in the large shopping center “Aparksine Dvor”. I remember that in
1955 the following car models were there exhibited for sale: the “Moskvitch”
400 for 9000 rubles (economy class), the “Pobieda” for 16000 rubles (business
class) and the “ZIM”, predecessor of the "Thaika", for 40000 rubles
(representative class). Our family's savings were enough to buy any of these
cars, including the “ZIM”. But the Moskvitch was the most accessible car for
most of the population. However, at that time, there was no great demand for
cars, as they were seen as expensive toys that entailed many problems in
their use and maintenance. My uncle had a Moskvitch that he used only a few
times a year on trips out of town. He bought it in 1949 only because in the
courtyard of his house there was an old stable that he could transform into a
garage. My father was offered the purchase of a Willys, the American military
all-terrain, for only 1500 rubles, but he refused because he had no place to
store the car.
In
the post-war era it was common for people to try to set aside as much money
as possible. They remembered that in the war years money could save lives. In
the most difficult period of the Leningrad blockade, a market continued to
operate where all types of food could be bought or exchanged for objects. In
my father's notes on the blockade, dated December 1941, the prices and their
equivalents in valuables in this market are indicated: 1 kg of flour = 500
rubles = a pair of felt boots; 2 kg of flour = an astrakhan fur coat; 3 kg of
flour = a gold watch. But the difficulties in obtaining food did not exist
only in
I present
here some prices for 1955: rye bread, 1 ruble / kg; wheat loaf, 1.5 rubles /
0.5 kg; meat, 12.5-18 rubles / kg; live fish (carp), 5 rubles / kg; caviar of
sturgeon, 180 rubles / kg; lunch in a canteen, 2-3 rubles; leather shoes,
150-250 rubles; three-speed "Turist" bicycle, 900 rubles;
motorcycle IJ-49 with 350 c.c. motor, 2500 rubles; movie ticket, 0.5-1 ruble;
theater or concert ticket, 3-10 rubles.
I
will try to evaluate the standard of living of the population of the
On
the Soviet side, we will analyze the budgets of two average families, one
rural and one urban, in 1955, made up of four people, according to data from
the Central Bureau of Statistics of the USSR (TsSU), and my own family in
1966, for which I have recorded daily income and family expenses.
Given
that we have different currency units in these two countries, and three
periods, we will use the Stalin ruble of 1947 in the analysis of budgets. The
purchasing power of this ruble was equivalent to the purchasing power of today’s
dollar, or 30 today’s rubles. In 1955, the US dollar corresponded to six Stalin
rubles (exchange rate in gold -- four rubles) [we have confirmed this
exchange rate in gold - JMS]. In 1961, as a result of Khrushchev's monetary reform,
each ruble was equal to ten of the previous ones. However, due to the
increase in market prices and those established by the State, the purchasing
power of the ruble fell about 1.6 times. Thus the ruble in Khrushchev's time
amounted not to ten, but to six rubles from the time of Stalin (at the gold exchange
rate of 1961, one dollar = 90 kopecks) [we have confirmed the exchange rate
in gold - JMS].
|
[Comparação de agregados familiares soviéticos e norte-americanos,
compostos por quatro pessoas (dois adultos e duas crianças). Valores em dólares
por conversão do rublo/Estaline -- JMS]
[Comparison of Soviet and American households, consisting of four people
(two adults and two children). Values in dollars with conversion of the
Stalin ruble -- JMS]
|
EUA
USA
|
|
URSS
USSR
|
||||
|
1955
|
2010
|
2011
|
|
1955
rural rural
|
1955
urbana urban
|
1966
|
Rendimento
anual
Annual
income
|
30 000
|
62 000
|
94 000
|
|
17 000
|
30 000
|
13 000
|
Imposto de rendimento
Tax on income
|
3 000
|
13 000
|
21 000
|
|
400
|
2 000
|
-
|
Descontos para reforma
Discounts for pension
|
-
|
5 400
|
4 000
|
|
-
|
-
|
-
|
Despesas em saúde
Health expenses
|
1 800
|
3 100
|
2 000
|
|
-
|
-
|
-
|
Habitação
House
|
12 000
|
21 000
|
22 000
|
|
-
|
2 000
|
1 800
|
Transportes
Transports
|
3 600
|
7 600
|
9 500
|
|
-
|
-
|
300
|
Alimentação
Food
|
8 100
|
6 300
|
10 000
|
|
10 000
|
10 000
|
6 000
|
Gastos correntes e lazer
Daily and leisure expenses
|
1 500
|
5 600
|
15 500
|
|
3 000
|
6 000
|
1 500
|
Educação
Education
|
-
|
-
|
10 000
|
|
500
|
500
|
-
|
Ama
Nanny
|
-
|
-
|
-
|
|
-
|
-
|
1 500
|
Férias
Holidays
|
-
|
-
|
3 000
|
|
-
|
-
|
1 900
|
Restante
Remaining
|
-
|
-
|
-3 000
|
|
3 100
|
9 500
|
-
|
O quadro
anterior necessita de algumas explicações. A frequência do ensino básico, no
qual estão as crianças da terceira família norte-americana (com seis e dez
anos de idade), é gratuita. Mas os almoços escolares ($2,5), o transporte
escolar e as actividades de ocupação dos tempos livres são pagos, custando $5000
por ano e por criança. Assim, não se compreende que as despesas escolares
sejam omitidas nas estatísticas norte-americanas.
Em 1955, na
URSS, um pequeno-almoço quente na escola primária custava um rublo, a escola
estava perto de casa e os grupos de ocupação de tempos livres eram gratuitos.
Os gastos mais elevados em alimentação da terceira família norte-americana, a
mais abastada, devem-se ao facto de uma parte dos produtos serem comprados
numa mercearia exclusiva de «produtos biológicos» a preços mais altos. Além
disso, os almoços diários durante o tempo de trabalho custam 2500 dólares por
ano. Nesta família pode-se incluir nos gastos em lazer o tradicional jantar
semanal no restaurante (50 dólares pelo jantar e 30 dólares pela ama
contratada para ficar em casa com as crianças), bem como pelas aulas de
natação das crianças na piscina com treinador (uma vez por semana – $90). Nos
gastos correntes, a limpeza da casa duas vezes por mês e a lavandaria
representam 2800 dólares por ano, enquanto o calçado, vestuário e brinquedos
para as crianças orçam em 4200 dólares.
Ainda no quadro
anterior, a terceira família soviética está mais próxima do grupo das
famílias pobres do que da média estatística. Estava então a fazer a
pós-graduação. O meu rendimento era constituído pelo estipêndio de 1000
rublos nominais da época de Estaline e meio vencimento de colaborador
científico assistente no valor de 525 rublos/Estaline. A esposa era estudante
e recebia um estipêndio de 290 rublos. Os estipêndios estavam isentos de
impostos assim como os salários inferiores a 700 rublos. A minha filha com
apenas dois anos, não tinha idade para entrar no jardim-de-infância. Por
isso, vivia connosco uma ama que recebia 250 rublos. Comprávamos uma grande
variedade de bens alimentícios. A fruta representava mais de um terço do
valor do nosso cabaz de alimentos. Nas minhas anotações não ressalta qualquer
intenção de limitar as despesas. Por exemplo, todos os meses, aparecem
registadas despesas com táxis.
A família de
quatro pessoas, incluindo a ama, vivia num apartamento de dois quartos,
adquirido num edifício cooperativo, em 1963, pouco depois de termos casado. Nessa
altura, trabalhava como engenheiro principal numa empresa do sector militar. As
minhas poupanças de dois anos de trabalho, depois de ter terminado o
Instituto, foram suficientes para pagar a primeira prestação do apartamento
no valor de 19 mil rublos/Estaline, ou seja 40 por cento do valor total. No
Verão, passávamos seis semanas na Crimeia, nas margens do Mar Negro, para
onde íamos acampar com uma tenda que montávamos em plena praia.
Noto que a
família abastada norte-americana atrás referida apenas se pôde permitir uma
semana de férias junto ao mar na Carolina do Norte, sendo que os três mil
dólares gastos neste período de descanso ultrapassaram o orçamento familiar
anual. Por seu lado, uma família «pobre» soviética de três pessoas, com um
orçamento anual de 13 mil dólares actuais (muito abaixo do limiar da pobreza
segundo os padrões actuais), consumia alimentos frescos e sãos, pagava as
prestações da casa, tinha uma ama contratada para cuidar da filha em
permanência e fazia férias de Verão prolongadas junto às aguas quentes do Mar
Negro.
Antes vimos uma
jovem família soviética típica de duas pessoas dos meados dos anos 50 (ambos
haviam obtido a respectiva formação académica há dois anos: o marido
concluíra o curso técnico superior e a esposa, o curso técnico profissional).
O seu rendimento líquido mensal, depois de impostos, era de 3400 rublos ou
100 mil rublos actuais. Hoje, o rendimento líquido de uma família análoga,
nos casos raros em que marido e mulher trabalham de acordo com as sua
habilitações, não ultrapassa os 40 mil rublos, quer em Moscovo, quer em São
Petersburgo, enquanto na província é 1,5 a duas vezes menor. Vejam a
diferença!
Assim, o nível
material de vida da população da URSS nos meados dos anos 50 era mais elevado
do que nos EUA, o país mais rico naquela época, e mais elevado do que actualmente
nos EUA, já sem falar da Rússia de hoje. Além disso, a população da URSS tinha
benefícios sociais inimagináveis na maioria dos restantes países do mundo:
– Uma rede de
centros de alimentação infantis (molotchnie
kukhni) que forneciam gratuitamente a alimentação aos bebés até aos dois
anos;
– Uma ampla
rede de instituições pré-escolares (creches e jardins infantis), que cobravam
preços mínimos pela guarda das crianças (30 a 40 rublos por mês) e eram gratuitas
para os kolkhozianos;
– Férias de
Verão para as crianças em campos de pioneiros, gratuitas ou a preços reduzidos;
– Escolas de
música infantis, permitindo que as crianças obtivessem educação musical e
revelassem na mais tenra idade os seus talentos musicais;
– Escolas de
desporto infantis, incluindo em regime de internato;
– Grupos de
ocupação de tempos livres gratuitos nas escolas;
– Lazer
gratuito para crianças nas casas e palácios dos pioneiros;
– Lazer para
adultos nas casas e palácios da cultura;
– Associações
desportivas que proporcionavam a prática de educação física à população;
– Uma ampla
rede de sanatórios, casas de repouso e complexos turísticos, que proporcionavam
tratamentos médicos e repouso, gratuitamente ou a preços reduzidos, acessíveis
a todas as camadas da população;
– As mais
amplas possibilidades de acesso a ensino gratuito e ao aumento das qualificações
para todas as camadas da população em regime diurno, nocturno ou por correspondência;
– A garantia de
habitação e emprego de acordo com as habilitações, a máxima protecção social,
confiança total no dia de amanhã.
Cabe dizer
algumas palavras sobre o ensino pago na época de Estaline. Em 1940 foi introduzido
o pagamento pela frequência dos últimos anos do ensino secundário, do ensino
superior e do ensino técnico-profissional. Em Moscovo e em Leninegrado e nas capitais
das repúblicas da União, o custo da frequência dos últimos anos do secundário
era de 200 rublos por ano. No ensino superior e técnico-profissional era de
400 rublos por ano. Nas restantes cidades era de 150 e 300 rublos
respectivamente. Da análise dos orçamentos familiares é visível que os
montantes indicados tinham um carácter simbólico. Em 1956 estes pagamentos
foram abolidos.
Segundo as
estatísticas oficiais, o nível de vida da população da URSS cresceu ininterruptamente
até ao momento da sua dissolução. Todavia, a vida real não correspondia a
esta estatística.
Por exemplo, o
preço de um almoço normal (lagman, pilaf, [8] panqueca e chá verde) no
«Uzbekistan», o meu restaurante preferido em Moscovo, onde ia sempre que me deslocava
à capital, teve a seguinte evolução em rublos/Khruchov: 1955 – 1 rublo; 1963 –
2 rublos; 1971 – 5 rublos; 1976 – 7 rublos; 1988 – 10 rublos.
A evolução do
preço de um automóvel «Moskvitch» foi a seguinte em rublos/Khruchov: 1955 –
900 rublos; 1963 – 2500 rublos; 1971 – 4900; 1976 – 6300 rublos; 1988 – 9000
rublos.
Em 25 anos os
preços reais subiram dez vezes, enquanto os rendimentos, em particular dos
técnicos e engenheiros e dos cientistas, diminuíram. Logo a partir de meados
dos anos 60 as pessoas mais abastadas na URSS passaram a ser os empregados do
comércio e a nomenclatura, e não os cientistas como até ali.
|
The table
above needs some explanations. The attendance of elementary school, by the
children of the third American family (six and ten years old), is free. But
school lunches ($ 2.5), school transportation and leisure activities are
paid, costing $ 5,000 per year and per child. Therefore, one does not understand
why the school expenses are omitted from the US statistics.
In 1955,
in the
Continuing
again with the above table, the third Soviet family is closer to the group of
poor families than to the statistical average. I was then doing post-graduate
studies. My income was made up of the stipend of 1000 nominal rubles from the
time of Stalin and half remuneration of assistant scientific collaborator
amounting to 525 Stalin rubles. My wife was a student and received a stipend
of 290 rubles. The stipends were exempt from taxes as were the wages below
700 rubles. My daughter, who was only two years old, was not old enough to
enter kindergarten. For that reason was living with us a nurse who received
250 rubles. We bought a wide variety of food products. The fruit accounted
for more than a third of the value of our food basket. In my notes doesn’t
stand any intention at all of limiting expenses. For example, expenses with
taxis are recorded for every month.
My family
of four, including the nanny, lived in a two-bedroom apartment, purchased in
a cooperative building in 1963, shortly after we had married. I worked at
that time as a senior engineer in an enterprise of the military sector. My
savings of two years' work, after I had finished the Institute, were enough
to pay the first instalment of the apartment worth 19 thousand Stalin rubles,
that is 40 percent of the total value. In summer we spent six weeks in the
Crimea, on the shores of the Black Sea, where we were going to camp with a
tent which we set up on the beach.
I note
that the above-mentioned well doing family from North America could only
afford a week's seaside holiday in North Carolina, and the three thousand
dollars they have spent in this resting period was in excess of their annual
family budget. On the other side, a three-person "poor" Soviet
family, with an annual budget of 13,000 current dollars (well below the
current poverty threshold), consumed fresh and healthy food, paid the instalments
of the house, had a nanny on contract to take care of their daughter
permanently, and made an extended summer vacation by the warm waters of the
Black Sea.
We have
seen above a typical young Soviet family of two people from the mid-1950's
(both had obtained their academic training two years ago: the husband had
completed the upper technical course and the wife, the professional technical
course). Their monthly net income, after taxes, was 3400 rubles or 100
thousand rubles as of today. Nowadays, the net income of a similar family, in
the rare cases where husband and wife work according to their qualifications,
does not exceed 40 thousand rubles, either in Moscow or St Petersburg, while
in the province it is from 1.5 to twice as small. See the difference!
Thus,
the material standard of living of the population of the USSR in the
mid-1950s was higher than in the US, the richest country at that time, and
higher than at present in the US, not to mention Russia today. Moreover, the
population of the USSR had social benefits unimaginable in most other
countries in the world:
-- A
network of infant food centers (molotchnie
kukhni) which provided food free of charge to babies up to two years of
age;
-- A
wide network of pre-school institutions (nurseries and kindergartens), which
charged minimum prices for childcare (30 to 40 rubles per month) and were
free of charge for kolkhozians;
--
Summer holidays for children in pioneer camps, free of charge or at reduced
prices;
-- Music
schools for children, allowing the children to obtain musical education and
reveal at a young age their musical talents;
-- Sport
schools for children, including in internship regime;
-- Groups
for activities during free time in schools for free;
-
Free leisure for children in the houses and palaces of the pioneers;
--
Leisure for adults in the houses and palaces of culture;
--
Sport associations which provided for the practice of physical education to
the population;
-- A
wide network of sanatoriums, rest homes and tourist complexes, which provided
medical treatment and rest, free or at reduced prices, accessible to all
sections of the population;
--
the broadest possible access to free education and the upgrading of qualifications
for all sections of the population on a day, night or correspondence basis;
--
The guarantee of housing and employment according to the qualifications, the
maximum social protection, and total confidence in the day of tomorrow.
A word should
be said about paid education in Stalin's time. In 1940 payment was introduced
for attending the last years of secondary education, higher education and
technical-professional education. In Moscow and Leningrad and in the capitals
of the Union republics, the cost of attending the last years of secondary
school was 200 rubles per year. In higher education and
technical-professional education was 400 rubles per year. In the remaining
cities was 150 and 300 rubles, respectively. The analysis of family budgets shows
clearly that the amounts indicated were symbolic in nature. In 1956 these
payments were abolished.
According
to official statistics, the standard of living of the population of the USSR
has grown steadily until its dissolution. However, real life did not match
this statistic.
For
example, the price of a regular lunch (lagman, pilaf, [8] pancake and green
tea) in Uzbekistan, my favourite restaurant in Moscow, where I went every
time when going to the capital, had the following evolution in Khrushchev rubles:
1955 - 1 ruble; 1963 - 2 rubles; 1971 - 5 rubles; 1976 - 7 rubles; 1988 - 10
rubles.
The
evolution of the price of a “Moskvitch” car was as follows in Khrushchev rubles:
1955 - 900 rubles; 1963 - 2500 rubles; 1971-1949; 1976 - 6300 rubles; 1988 -
9000 rubles.
In 25
years real prices have risen tenfold, while incomes, in particular of
technicians and engineers, and of scientists, have declined. As early as the
mid-1960s, the wealthiest people in the USSR became the employees of commerce
and nomenclature, not scientists as before.
|
Notas | Notes
[1] (N. JMS) O
kolkhoz era uma herdade colectiva que funcionava em moldes semelhantes aos de
uma cooperativa de produção. Os camponeses recebiam um salário conforme o
trabalho com que contribuíam. As casas individuais eram propriedade dos
camponeses que tinham também as suas próprias parcelas de terreno.
Foi Estaline com
o apoio de Kalinine e Molotov que lançou em 1926 a colectivização da
agricultura, dos kolkhoz e sovkhoz (herdades estatais), imprescindível à
construção do socialismo. Bukharin opôs-se. Note-se que 82% da população
soviética era camponesa e as comunas camponesas eram dominadas pelos kulaks, camponeses ricos, sobre quem E.
J. Dillon, dos EUA, profundo conhecedor da Rússia antiga, escreveu: «De todos
os monstros humanos que conheci nas minhas viagens, não me lembro de tão
maligno e odioso quanto o kulak russo».
No XV Congresso
do PCR(b) em Dezembro de 1927 que adoptou os kolkhozes, Estaline sobre a
necessidade de colectivizar a agricultura disse assim: «Onde está a saída? A
saída está em transformar pequenas e desintegradas herdades camponesas em
fazendas amalgamadas de grande escala, com base no cultivo do solo em comum; em
passar ao plantio colectivo do solo na base de novas e mais altas técnicas. A
saída está em unir as pequenas e minúsculas fazendas camponesas de maneira gradual
mas constante, não por meio de pressões, mas pelo exemplo e persuasão, em grandes
herdades baseadas no cultivo do solo em comum, colectivo e co-operativo,
aplicando tractores e máquinas agrícolas, e métodos científicos de agricultura
intensiva».
O movimento
kolkhosiano teve sucesso. De Junho a Outubro de 1927 a percentagem de pequenos
e médios camponeses que aderiu aos kolkhozes passou de 4% a 7,5%, atingindo
286.000 famílias. Em 1 de Junho de
1919 eram já 1.008.000.
(N.
JMS) The kolkhoz was a collective farm which operated in a similar way to a
production co-operative. The peasants received a salary according to the work
with which they contributed. The individual houses were owned by the peasants
who also had their own land plots.
It was
Stalin with the support of Kalinine and Molotov who launched in 1926 the
collectivization of agriculture, the kolkhoz and sovkhoz (state farms),
essential to the construction of socialism. Bukharin objected. It should be
noted that 82 per cent of the Soviet population was peasantry and the peasant
communes were dominated by the kulaks,
rich peasants, about whom E.J. Dillon, from the U.S.,
who had a profound knowledge of old Russia, wrote: “And of all the human
monsters I have ever met in my travels, I cannot recall so malignant and odious
as the Russian kulak.”
At the
XV Congress of the CPR(B) in December 1927, which adopted the kolkhozes, Stalin
on the need to collectivize agriculture spoke: “Its work led to the adoption of
a resolution by the Fifteenth Congress of the Party, in December 1927: "What is the way out? The way out is
to turn the small and scattered peasant farms into large united farms based on
cultivation of the land in common, to go over to collective cultivation of the
land on the basis of a new and higher technique. The way out is to unite the small
and dwarf peasant farms gradually but surely, not by pressure, but by example
and persuasion, into large farms based on common, co-operative, collective
cultivation of the land with the use of agricultural machines and tractors and
scientific methods of intensive agriculture.”
The kolkhozian
movement was successful. From June to October 1927 the percentage of small and
medium peasants who joined the collective farms increased from 4% to 7.5%,
reaching 286,000 families. They numbered 1,008,000 on June 1, 1929.
[2] (N. Ed.) As estatísticas aqui referidas podem ser
acedidas em russo no seguinte endereço | The
statistics referred to here can be accessed in Russian at the following address:
http://istmat.info/node/36441
«Deve-se ter em conta
que o cabaz de alimentos, desenvolvido em 1950 por cientistas soviéticos, era
significativamente “mais pesado” do que o que foi proposto em 1994 pelos
cientistas da “democracia”».
“It
must be borne in mind that the food basket, developed in 1950 by Soviet
scientists, was significantly "heavier" than the one that was
proposed in 1994 by "democracy" scientists.”
[4] (N. JMS) Os
valores remuneratórios apresentados por Torgachev concordam com os de outras
fontes que consultámos. São valores que revelam um leque de rendimentos
bastante mais estreito do que nos países capitalistas, em qualquer período. A
URSS do tempo de Estaline constitui um exemplo de como o socialismo implica a
queda da desigualdade social e a eliminação da pobreza. Esta última não
abordada por Torgachev, certamente por a considerar óbvia. Sobre a desigualdade
social, já apresentámos noutro trabalho a sua medida estimada
pelo índice de Gini. Este índice varia entre 0 e 1 e é tanto menor quanto menor
for a desigualdade de rendimento (tal como é medida por esse índice que não
esgota outras medidas da desigualdade de rendimento). A tabela abaixo mostra
alguns valores (fontes indicadas no trabalho apontado).
(N.
JMS) The remuneration values presented by Torgachev agree with those of other
sources that we have consulted. These are values that reveal a much narrower
range of income than in capitalist countries at any time. The USSR of Stalin's
time is an example of how socialism implies the fall of social inequality and
the elimination of poverty. This last one is not considered by Torgachev,
certainly for being considered obvious. On social inequality, we have already
presented in another work its measure estimated by the Gini index. This index
varies between 0 and 1 and is smaller the lower the income inequality (as
measured by that index which does not exhaust other measures of income
inequality). The table below shows some values (sources are given in the work
pointed to).
País Country
|
I. Gini, 1955
|
I. Gini, 1960
|
URSS USSR
|
0.33
|
0.28
|
EUA USA
|
0.40
|
0.39
|
França France
|
0.55
|
0.53
|
Suécia Sweden
|
0.41
|
0.40
|
[5] (N. Ed.) A
família dos salmonídeos inclui diferentes variedades de trutas e salmões.
A diferença da
defumação a quente e a frio está na temperatura que é mantida durante o
processo: a quente (45-90°C), a frio (27-45ºC). Quanto mais elevada for a
temperatura menor é o tempo de cura, o qual pode variar entre algumas horas e
vários dias.
O salmão-keta é
também designado salmão-cão ou salmão do Pacífico (Oncorhynchus keta). Existe
ao longo da costa Norte do Pacífico, desde a Coreia, Japão, Sibéria e Alasca, e
no Sul dos EUA.
O Salmão do
Atlântico (Salmo salar) é também conhecido como salmão comum. Existe nas costas
atlânticas do Norte da Europa e da América e é uma espécie muito utilizada na
aquicultura.
(N. Ed.) The salmonid family includes different varieties of trout
and salmon.
The
difference between hot and cold smoking is the temperature that is maintained during
the process: hot (45-90 °C), cold (27-45 °C). The higher the temperature the
lower the curing time, which can range from a few hours to several days.
Salmon-keta
is also called salmon-dog or Pacific salmon (Oncorhynchus keta). It exists
along the North Pacific coast, from Korea, Japan, Siberia and Alaska, and the
southern US.
Atlantic Salmon (Salmo salar) is also known as common salmon. It exists on the
Atlantic coasts of Northern Europe and America and is a species widely used in
aquaculture.
[6] (N. Ed.) O
caboz é um peixe da família Gobiidae, que inclui cerca de duas mil espécies. Na
costa portuguesa é igualmente designado por alcaboz ou alcabroz.
The
goby is a fish of the Gobiidae family, which includes about two thousand
species.
[7] (N. Ed.) O
que aqui traduzimos livremente como mortadela «medicinal» (em russo «dótorskaia»
kolbassa) refere-se a uma variedade de salsicha cozida de dimensões semelhantes
à mortadela (podendo no entanto ser inferiores), que foi introduzida na URSS em
1936, sob orientação do Ministério da Saúde. Foi concebido como um produto de
carne dietético, especialmente destinado aos doentes e pessoas com problemas de
saúde, que ganhou grande popularidade pela sua elevada qualidade e sabor
refinado. A sua composição definida por lei determinava que por cada 100 quilos
de enchimento, 25 quilos eram de carne de vaca de qualidade superior, 70 quilos
de carne de porco magra, três quilos de ovos e dois quilos de leite de vaca.
(N. Ed.) What we freely translate here
as “medicinal” mortadella (in Russian 'dótorskaia' kolbassa) refers to a
variety of cooked sausage of similar size to mortadella (which may however be smaller),
which was introduced in the USSR in 1936 under the guidance of the Ministry of
Health. It was conceived as a dietary meat product, especially intended for
patients and people with health problems, which gained great popularity for its
high quality and refined taste. Its legal composition determined that for every
100 kilograms of filling, 25 kilograms were of superior quality beef, 70 kilograms
of lean pork, three kilograms of eggs and two kilograms of cow's milk.
[8] (N. Ed.) Lagman
é um prato tradicional da culinária do Quirguistão, semelhante a uma sopa chinesa,
com massa num caldo de carne e vegetais.
Pilaf (plov em
russo) é um prato tradicional no Médio Oriente, feito com arroz refogado em
cebola e óleo, ao qual é adicionada a carne (frango ou borrego).
(N.
Ed.) Lagman is a traditional Kyrgyz cuisine dish, similar to a Chinese soup,
with a mass of meat and vegetables.
Pilaf
(plov in Russian) is a traditional Middle Eastern dish made with rice fried in
onion and oil, to which meat (chicken or lamb) is added.