sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Os que querem derrubar Nicolás Maduro


Those who want to overthrow Nicolás Maduro

Já apresentámos vários factos em artigos anteriores que demonstram por que razão o imperialismo tem vindo a ingerir-se na Venezuela procurando derrubar um governo  cuja defesa da soberania os incomoda.

(Agora, essa ingerência intervencionista subiu de tom com os EUA -- e uma UE totalmente lacaia dos interesses imperiais – a apresentar ultimatos de apear um presidente democraticamente eleito para o subsituir por uma marionete não eleita, mas do agrado deles! É esta a democracia deles!)

Um artigo recente de um site estrangeiro (que vive de donativos), com que deparámos, traz mais informação de interesse. Trata-se de uma entrevista com a presidente do Partido dos Trabalhadores de Brasil que esteve em Caracas na tomada de posse de Nicolás Maduro. Entre outras revelações atente-se no estado actual do sistema de justiça do Brasil. Note-se que o mesmo se poderia dizer de muitos outros países, nomeadamente da UE (como os casos salientes da Ucrânia, Polónia e Hungria) sem preocupação de relevo das lideranças políticas e da UE. Uma clara demonstração de que a apregoada «independência» da Justiça é no capitalismo uma farsa, dado que as chorudamente pagas elites judiciais estão essencialmente e impunement alinhadas com a protecção do sistema e dos seus mais relevantes patronos, encabeçando frequentemente processos de perseguição política usando (enxovalhando) a lei como lhes interessa.

(A propósito, veja-se o respeito que o governo PS e o seu pró-imperial ministro Santos Silva, têm pelo art. 7 da Constituição Portuguesa que diz «»1. Portugal rege-se nas relações internacionais pelos princípios [...] da não ingerência nos assuntos inernos de outros Estados [...] 2. Portugal preconiza a abolição do imperialismo, do colnialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações entre os povos [...])

Segue-se abaixo a nossa tradução do artigo.
In previous articles we have already presented several facts demonstrating why imperialism has been interfering in Venezuela seeking to overthrow a government whose defense of sovereignty annoys them.

(This interventionist interference has now escalated with the US - and an EU totally subservient of imperial interests - submitting ultimatums to put down a democratically elected president replacing him with an un-elected marionette, but to their liking! That’s their democracy!)

A recent article from a foreign site (which lives on donations), which we came across, brings more information of interest. It is an interview with the president of the Workers' Party of Brazil who was in Caracas at the inauguration of Nicolás Maduro. Among other revelations, we draw attention to the current state of the justice system in Brazil. Notice that the same could be said of many other countries, notably the EU (as the salient cases of Ukraine, Poland and Hungary) with no prominent concern of the political leaderships. A clear demonstration that the so-called "independence" of justice is in capitalism a farce, since the overpaid judicial elites are essentially aligned with impunity and the protection of the system and of their most relevant patrons, often in the front line of political persecution, using (messing) the law in a way that suits them.

(Incidentally, notice the respect that the PS government and its pro-imperial minister Santos Silva do not have for article 7 of the Portuguese Constitution stating: “1. Portugal is governed in international relations by the principles [...] of non-interference in the internal affairs of other States [...] 2. Portugal advocates the abolition of imperialism, colonialism and any other forms of aggression, domination and exploitation in the relations between nations [...])

The article, by Brian Mier, The Corporatists Who Want Venezuela's President Ousted, can be read here.


Os Chefes de Corporações que Querem Derrubar o Presidente da Venezuela
(The Corporatists Who Want Venezuela's President Ousted)
Brian Mier, Jan 24, 2019


Publicado por: truthdig, drilling beneath the headlines.

Gleisi Hoffmann cresceu num lar católico em Curitiba onde, depois de desistir de se tornar freira, ingressou no movimento estudantil, filiou-se no Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e foi eleita consecutivamente presidente da União dos Estudantes Secundaristas de Curitiba, do Estado do Paraná e do Brasil. Tornou-se posteriormente advogada, filiou-se no Partido dos Trabalhadores (PT) e iniciou uma trajectória política que culminou com o cargo de chefe de gabinete de Dilma Rousseff (2011-2014), de senadora, e na sua actual posição de presidente nacional do PT.

Em 2015 foi acusada de corrupção como parte da investigação Lava Jato, do Departamento de Justiça dos EUA / Ministério Público do Brasil, liderada por Sérgio Moro actual ministro da Justiça de Jair Bolsonaro. Através de um negócio judicial, para obter um testemunho de um criminoso e sentenciado, em troca de redução da sentença, Geisi foi acusada de receber subornos da companhia estatal de petróleo Petrobrás. O caso chegou ao Supremo Tribunal em 2017, onde foi rejeitado por decisão unânime por falta de provas materiais.

Geisi viajou para a Venezuela em 10 de Janeiro, a fim de participar na cerimónia de inauguração do presidente Nicolás Maduro. Foi muito contactada pelos media naquela semana. Consegui abordá-la em 19 de Janeiro para lhe dar a oportunidade de explicar a uma audiência de língua inglesa por que achava tão importante ir à inauguração.

Brian Mier: A sua visita à inauguração de Nicolás Maduro na Venezuela foi muito criticada no Norte, até mesmo pelos jornalistas anglo-saxões que escrevem para publicações supostamente progressistas, como o Guardian. A senhora publicou uma declaração sobre a sua visita, dizendo que quem a criticou não entende os conceitos de soberania e de autodeterminação. A avaliar pela maneira como os media anglo-saxões reagiram à sua visita, creio que efectivamente muitas pessoas das nações historicamente imperialistas da Inglaterra e dos EUA não têm uma boa compreensão desses conceitos. Por que razão os conceitos de soberania e autodeterminação são importantes e como se relacionam eles com a sua recente visita à Venezuela?

Gleisi Hoffmann: A soberania está relacionada com o não reconhecimento de um órgão superior de natureza externa. Por outras palavras, a nação tem autoridade suprema. Não há hierarquia entre as nações. A autodeterminação é o direito que um povo tem de se governar, de fazer as suas escolhas sem intervenção estrangeira. É por isso que referi que o governo dos EUA e aqueles que me criticaram não entendem o que é soberania e autodeterminação, pois acreditam que forças de fora da Venezuela deveriam resolver os seus problemas. Nós acreditamos no oposto. Só o povo venezuelano tem capacidade de resolver os seus problemas, através de um processo de diálogo, aprendizagem e relacionamento. A minha viagem à Venezuela esteve, portanto, relacionada com o que o Partido dos Trabalhadores pensa sobre soberania e autodeterminação. Nenhuma outra nação ou órgão externo tem o direito de pregar a violência e a intervenção e de se intrometer nos assuntos de outra nação. Podemos, por outro lado, apoiar a construção de diálogos, reunir as partes opostas e encorajar uma solução pacífica para os conflitos. Foi isso que o Presidente Lula sempre fez.

BM: Gostaria de lhe perguntar sobre o uso da lei, o uso do sistema judicial de se envolver em assassinatos de carácter e perseguição política. Tal como Lula é vítima desse processo, a senhora foi perseguida durante anos pela operação judicial Lava Jato do Departamento de Justiça dos EUA / Procuradores Públicos de Brasil, liderada por Sérgio Moro, actual ministro da Justiça de Bolsonaro. Muitas pessoas já tinham pensado que a senhora concorreria ao cargo de presidente. Pessoalmente, vi o assassinato de carácter, judicial/mediático, que foi realizado contra si como uma tentativa de impedi-la de concorrer. Como afectou esse processo judicial a sua vida?

GH: O processo judicial evoluiu para um sistema de perseguição política e um instrumento de certos sectores da sociedade brasileira para aceder ao poder. Não é só a sociedade brasileira; é um fenómeno a que se assiste em toda a América Latina. Infelizmente, espalhou-se pelo continente. Fui profundamente afectada pelo caso contra mim. Fui absolvida de todas as acusações que eles levantaram contra mim por decisão unânime do Tribunal Supremo; mas antes disso acontecer, passei por uma série de constrangimentos públicos. A minha casa foi invadida pela polícia. O meu marido foi preso e libertado. Houve protestos contra mim -- as críticas na imprensa foram sempre ácidas --, fui perseguida nas redes sociais e os meus filhos foram assediados em público. Foi um processo muito doloroso. Mas fiquei muito aliviada por esta situação ter sido esclarecida quando o meu recurso final foi analisado e fui absolvida de todas as acusações. No entanto, ainda me causa problemas nas minhas relações sociais e na minha trajectória política.

BM: Quais são os riscos de ter um ultraconservador altamente politizado como o ex-investigador da Lava Jato, promotor e juiz Sérgio Moro, a dirigir o Ministério da Justiça?

GH: O ministro da Justiça, Sérgio Moro, é agora responsável pela perseguição política. Por outras palavras, é ele que irá eliminar os rivais e inimigos do sistema e fará isso usando a lei. Fará isso montando e dirigindo processos de investigação contra pessoas que se opõem ao seu governo ou que podem criar obstáculos para o que eles estão a procurar levar a cabo em termos de negociações e projectos.

BM: Os EUA estiveram envolvidos nesses processos judiciais?

GH: Não tenho dúvidas sobre os interesses e envolvimento dos Estados Unidos no processo de investigação Lava Jato no Brasil. Não sei se o objectivo deles era perseguir o PT, mas não há dúvida de que se empenharam na operação para fazer avançar a meta comercial de abrir a Petrobrás às companhias petrolíferas norte-americanas, e conseguiram. Esses interesses de negócios são muito fortes. E, certamente, se conseguirem enfraquecer ou destruir quem quer que se envolva em oposição política e não estiver alinhado com o conceito deles de relações internacionais, não hesitarão em fazê-lo.

BM: Qual o papel que a indústria internacional do petróleo desempenhou no golpe de 2016, no assassinato de carácter e na perseguição de Lula e na tentativa de golpe que parece estar em andamento na Venezuela?

GH: O governo dos EUA envolveu-se no processo Lava Jato no Brasil devido ao seu interesse em aceder ao nosso petróleo. Temos enormes reservas de petróleo offshore na camada pré-sal. Recentemente, desenvolvemos uma maneira de extraí-lo de forma muito barata devido à tecnologia que foi desenvolvida pela nossa companhia estatal de petróleo, a Petrobrás. Desenvolvemos um processo de extracção e políticas para uso deste petróleo que eram muito diferentes do que é feito com poços de petróleo normais. Desenvolvemos leis específicas e um regime de participação nas concessões limitadas de perfuração. Criámos um fundo para economizar parte do dinheiro obtido por essas perfurações e alocámos parte dos lucros ao sistema público de ensino. Por outras palavras, agimos com soberania quanto ao nosso petróleo. Isso não interessava às empresas petrolíferas norte-americanas, que queriam vir aqui e extrair o petróleo do pré-sal da mesma forma que trabalham noutros lugares do mundo, fazendo uma oferta e ficando com todo o petróleo sem ter que prestar contas ao governo brasileiro ou ao povo brasileiro. Não tenho dúvidas, portanto, de que esse processo de golpe está totalmente ligado ao acesso facilitado ao petróleo brasileiro; tanto mais que, logo após o golpe de 2016 que depôs a presidente Dilma (e há entrevistas com Edward Snowden que mostram que o Brasil, a presidente Dilma e a Petrobrás estavam a ser alvo de escutas de ligações e monitoramento de comunicações pelo governo dos EUA), foi ratificada uma lei no Congresso, alterando as regras para a exploração das reservas de petróleo do pré-sal. Agora estão a trabalhar noutra, que altera os regulamentos para leiloar os poços ao estrangeiro. Portanto, isto está claro. Acima de tudo, o governo do golpe minimizou e enfraqueceu enormemente a Petrobrás, obrigando-a, após a investigação da Lava Jato, a vender os seus activos.

Lula é um grande líder do povo brasileiro e sempre trabalhou pela nossa soberania e autodeterminação sem jamais desrespeitar qualquer outro país. Eles sabiam, por isso, que Lula teria sido uma enorme resistência a esses interesses que eles tinham aqui. Lula teria mobilizado o apoio popular contra esses interesses estrangeiros e teria, de facto, sido eleito presidente. Prenderam-no para o impedir de ser eleito.

Isto tudo é também evidente na Venezuela. A Venezuela tem as maiores reservas de petróleo do mundo. Está muito mais perto dos EUA do que o Médio Oriente. Tem uma posição geográfica estratégica na América Latina. Desde que Chávez assumiu o governo há mais de 20 anos, a Venezuela adoptou uma postura diferente em relação à comercialização do seu petróleo e também em relação às suas políticas internas. E isso desagradou muito aos americanos porque a Venezuela não se alinhou com eles. Portanto, toda essa conversa sobre democracia na Venezuela, sobre Maduro ser um ditador, mascara, na verdade, interesses comerciais muito fortes no acesso ao petróleo. É a mesma coisa que aconteceu no Iraque. Ninguém discute se o Iraque tem democracia ou se o povo iraquiano está bem nos dias de hoje, eles simplesmente esqueceram-se disso. Os americanos conseguiram posicionar-se no Iraque para aceder ao petróleo e a situação foi resolvida. Portanto, é agora essencial prestar muita atenção e tomar posição a favor da soberania e da autodeterminação da Venezuela. Os problemas com a oposição devem ser resolvidos através de um processo de mediação e debate e de uma solução pacífica.

BM: A senhora visita Lula com frequência. Como está ele?

GH: Lula está bem. Lula é uma fortaleza política, emocional e física, apesar de ter sobrevivido ao cancro e tantos outros problemas em sua vida. É claro que tem 73 anos, logo esse encarceramento tem consequências na sua disposição. Mas está politicamente bem e tem uma visão clara do seu papel na história e do que temos a fazer aqui para defender o Brasil; o que temos que fazer para nos posicionarmos do lado do povo brasileiro. Não temos ideias de quando será libertado. Todas as medidas legais foram bloqueadas. Nós fizemos tudo o que pudemos fazer legalmente e estamos a lutar politicamente. A prisão de Lula é política. Não é baseada em factos legais porque nenhuma prova foi apresentada para sustentar a sua condenação. A sua condenação não foi feita com base em evidências materiais. Não há iclusive um crime claramente definido. Então isto é muito sério. Mas, infelizmente, como somos vítimas das leis aqui no Brasil, não vejo nenhuma perspectiva de uma rápida libertação de Lula. Vamos lutar muito e sempre defenderemos o nosso ex-presidente para a sociedade brasileira.

BM: O que pode a comunidade internacional fazer para ajudar?

GH: A comunidade internacional pode e está a ajudar-nos. É fundamental que os defensores da democracia, intelectuais e pessoas que entendem a história de Lula e do Brasil mostrem o seu apoio, e muitos já o fizeram. Também acho que o Prémio Nobel da Paz para Lula, até mesmo só a sua candidatura, serviria como reconhecimento da sua inocência. Não tenho dúvidas de que, se ele ganhasse o Prémio Nobel da Paz, seria por causa do reconhecimento do que ele significa para a América Latina e o mundo, em termos de pacificação de relações conflituantes. Lula foi muito importante, não apenas do ponto de vista externo da construção da paz, mas do ponto de vista interno, quando deu ao povo brasileiro acesso a condições dignas de vida.