domingo, 23 de setembro de 2018

Hitler: Ascensão Irresistível? | Hitler: Irresistible Ascension?


Apreciação do livro de Kurt Gossweiler, Hitler: Ascensão Irresistível? Ensaios sobre o fascismo, Editorial “Avante!”, 2015, 207 págs., preço: 12,60 €, 10,70 € na Festa do Avante!.

Book review of Hitler: Ascensão Irresistível? Ensaios sobre o fascismo [Hitler: Irresistible Ascension? Essays on fascism], Editorial “Avante!”, 2015, 207 pages., price: 12.60 €, 10.70 € in the Feast of “Avante!”.
(The book is also translated in Dutch and Italian. We haven’t found a translation in English.)

Para aqueles que pensam já saber tudo sobre o nazi-fascismo este pequeno livro pode revelar-se uma surpresa. O livro apresenta um conjunto de importantes análises sobre o tema, apresentadas de forma clara e concisa, com dados factuais que não encontrámos noutras publicações. Desfaz também com rigor mitos que continuam a correr por aí, mesmo entre a esquerda.

Embora debruçando-se sobre o nazi-fascismo alemão, o livro é de grande interesse para compreender as políticas e práticas fascizantes que grassam e crescem pelo chamado mundo ocidental, pelo mundo dos monopólios que nunca abandonaram nem abandonarão a perspectiva da solução fascista. Como exemplo, basta ver o que está a acontecer no Brasil com os monopólios domésticos e estrangeiros (USA) a usar todos os meios, incluindo media e sistema judicial e militar, para colocar no poder o nazi Bolsonaro.

O autor, Kurt Gossweiler, ingressou em 1931 na organização estudantil comunista ilegalizada em 1934. O jovem Gossweiler, com 16 anos de idade, participou então na resistência anti-fascista até ser incorporado na Wehrmacht em 1939. Decidido a desertar para o Exército Vermelho na primeira oportunidade, consegue isso em Março de 1943 quando tinha sido ferido. É curado num hospital militar soviético, aprende russo e torna-se professor. De volta a Berlim no final da guerra é primeiro professor na Escola do SED (Partido Socialista Unificado da Alemnha) em Berlim, e depois funcionário da administração do distrito de Berlim pelo SED. Inicia em 1955 uma carreira científica em História Alemã na Universidade Humboldt, onde se doutora em 1963. A partir de 1970 trabalha como investigador no Instituto Central de História da Academia de Ciências da RDA.

Tendo-se primeiro dedicado ao estudo do nazi-fascismo, o autor enveredou depois pela tarefa que considerava mais prioritária e a que se dedicou com mestria: a denúncia do revisionismo nos partidos comunistas da Europa, incluindo o SED e o PCUS, surgido à luz do dia na sequência do (in)famoso relatório de Krutchev ao XX Congresso do PCUS.

O livro tem 6 capítulos, correspondentes a artigos individuais do autor. No capítulo 1, «De Weimar a Hitler: As causas do advento da ditadura fascista», o autor observa com toda a actualidade: «Na Alemanha Federal, do mesmo modo que noutros Estados imperialistas, milhares de jornalistas, historiadores, filósofos e sociólogos a soldo do Estado afadigam-se para esconder as causas e as forças que deram nascimento ao fascismo». Daí a importância do seu estudo científico que revela claramente o fascismo como fenómeno internacional, como solução dos monopólios e do imperialismo para em «período de crise generalizada […] reprimir e manter em xeque o movimento operário por meio do terror e da violência».

O autor prossegue esclarecendo o apoio dado desde 1919 pela burguesia monopolista e pelos grandes latifundiários ao partido nazi, NSDAP. Nesse apoio teve de início papel proeminente o exército, que forneceu armas e dinheiro ao NSDAP. Logo em 1922-23 grandes industriais começaram a financiar o NSDAP. O autor apresenta a sequência de adesões e apoios dos monopolistas alemães ao nazismo, de uma forma que não encontrámos noutras publicações. Revela também apoios desde a primeira hora de magnates estrangeiros (Deterding da Royal Dutch Shell e Henri Ford).

Ainda no capítulo 1 o autor desfaz a mentira muito difundida de que Hitler subiu legalmente ao poder em 1933, devido aos resultados eleitorais, quando de facto o NSDAP estava em declínio eleitoral. A solução nazi foi extraída de Hindenburgo pelos representantes dos monopolistas e latifundiários. Os comunistas (KPD) já haviam prevenido em 1932 que quem votasse Hindenburgo votava Hitler. «[…] não foram os milhões de eleitores nazis da pequena burguesia, mas antes os interesses dos milionários que determinaram a política do governo nazi e o carácter de classe da ditadura fascista». Aliás, na Alemanha como noutros fascismos, a pequena burguesia atraída pela demagogia nacionalista e «revolucionária» dos fascistas foi de imediato traída quando estes tomaram o poder.

O capítulo 1 termina expondo as razões porque a ascensão de Hitler podia ter sido evitada, se uma condição fulcral para isso tivesse sido assegurada: a unidade da classe operária. Infelizmente, até mesmo nos dias decisivos, os dirigentes do SPD (II Internacional) traíram a classe operária. Não obstante muitos operários do SPD se terem juntado aos comunistas no combate aos fascistas. Sobre a traição dos dirigentes do SPD o autor fornece evidência esmagadora, desfazendo completamente a mentira tantas vezes propalada da culpa do «dogmatismo-sectarismo do KPD».

O capítulo 2, «Hitler e o capital. Os verdadeiros milhões por detrás de Hitler», fornece uma grande quantidade de detalhes de como Hitler e seus próximos progrediram nas suas reuniões secretivas com os representantes do grande capital de vários pontos da Alemanha. Encontros em que Hitler, tendo como conselheiros grandes magnates membros do NSDAP, o ajudaram a preparar o discurso explicativo dos benefícios da solução nazi-fascista. Solução demagógica do «socialismo nacional» que não era mais que atrelar à força o proletariado à carroça dos monopólios, atrelá-lo à «nobre» causa «nacional» conduzida pelas «elites» de invadir e escravizar outros povos.

O capítulo 2 também fornece detalhes muito interessantes de como publicações para intelectuais preparadas pelos monopólios – como, p. ex., a Revista Europeia preparada por seventuários da IG-Farben – espalhavam subtilmente a mensagem, não só para alemães mas também para intelectuais estrangeiros, dos grandes benefícios decorrentes de uma Alemanha forte, com uma visão europeia. Ao ler estas passagens o leitor deverá reflectir sobre a concentração de poderes económicos e militares nos representantes dos estados fortes da UE -- Alemanha e França – na CE – dominada pelos monopólios europeus -- também mentirosamente apresentadas como benéfica para uma Europa unida e «social».

O capítulo 3, «Classe operária e fascismo. O socialismo dos barões do aço» demonstra convincentemente como a classe operária alemã nunca se vergou ao fascismo. Como se revelou na prática um fracasso a construção de um partido nacionalista e operário. O autor descreve como já em 1922 Hitler, numa carta aos empresários, «mostrou ter compreendido perfeitamente o que importava às forças da classe dirigente»: o extermínio do marxismo. Apesar da propaganda e de, como dizia na sua carta, ser o NSDAP «uma organização forte, sem escrúpulos e de uma determinação brutal», não conseguiu esse objectivo. O ingresso de operários no NSDAP foi fraco -- o autor apresenta números sobre isso e também analisa como as células de empresa do NSDAP eram organizações de terror e espionagem ao serviço dos capitalistas. «O partido nazi tornou-se um partido de massas não enquanto “partido operário nacional” mas […] enquanto partido imperialista cujos partidários eram essencialmente pequenos burgueses», sendo porém errado considerar o partido fascista como tendo sido criado «originariamente como um partido da pequena burguesia radicalizada […] contra o movimento operário e o grande capital».

No capítulo 4, «A destituição do governo Braun-Severing. O Partido Socialista na linha de mira», o autor, citando Gueorgui Dimitrov -- «Antes da instauração da ditadura fascista, os governos burgueses passam geralmente por uma série de etapas preparatórias e tomam uma série de medias reaccionárias, contribuindo directamente para a ascensão do fascismo» -- mostra como passo a passo o governo burguês do SPD foi adoptando medidas reaccionárias, contra os trabalhadores. Analisa de perto como esse caminhar passo a passo do SPD de mãos dadas com a reacção desembocou na auto-destituição complacente (!) do governo Braun-Severing do SPD na Prússia, sendo substituído pelos nazis. Um capítulo cheio de lições sobre o que pode significar hoje a caminhada passo a passo de dirigentes «socialistas» de mãos dadas com a reacção, isto é, de mãos dadas com os representantes dos monopólios.

O capítulo 5, «Origens e variantes do fascismo. Fascismo, ditadura e democracia parlamentar», começa por apresentar as análises de Hilferding e de Lenine sobre o capital monopolista e o imperialismo. Análises que mostram, como diz o autor, que «uma vez nascido, o monopólio tende para a autocracia, não apenas no domínio económico mas também no domínio político», seguindo-se a explicação de porque razão esta tendência resulta de uma necessidade objectiva. Essa tendência é especialmente forte no capital financeiro, que constitui a pedra angular do imperialismo. O autor termina analisando variantes de fascismo da Europa Central e de Leste.

O capítulo 6, «A política dos nazis nos Balcãs através da Revista Europeia. A expansão a leste, ontem e… hoje?» apresenta mais detalhes das mensagens nazis transmitidas pela Revista Europeia, analisando os apetites nazis pelo domínio dos Balcãs, apetites que os monopólios alemães, mantêm e, de facto, concretizaram actualmente em grande parte. Haja em vista o papel da Alemanha no golpe fascista de Maidan na Ucrânia e o domínio económico alemão na Grécia, Roménia e Bulgária.

O livro tem um Prefácio de grande qualidade, escrito por Jorge Cadima. Começa assim: «Este conjunto de textos de Kurt Gossweiler sobre a ascensão da mais terrível e violenta forma de dominação capitalista que a História regista é importante. Não apenas para contrariar o esquecimento […] Mas sobretudo porque assistimos hoje a uma flagrante e despudorada tentativa de reescrever e falsificar a verdade histórica sobre o fascismo.»
For those who think they already know everything about Nazi-fascism this little book may prove to be a surprise. The book presents a set of important analyzes on the subject, presented in a clear and concise manner, with factual data that we have not found in other publications. It also demolishes myths that continue to run around, even among the left.

Though focusing on German Nazi-fascism, the book is of great interest in understanding the fascist policies and practices that ramp up and grow in the so-called Western world, the world of the monopolies, which have never abandoned or will abandon the prospect of the fascist solution. As an example, it is enough to see what is now happening in Brazil with the domestic and foreign (USA) monopolies to resort to all means, including the media and the judicial and military systems, to place the Nazi Bolsonaro in power.


The author, Kurt Gossweiler, joined the Communist student organization in 1931 which was outlawed in 1934. The young Gossweiler, at the age of 16, then participated in the anti-fascist resistance until he was enrolled into the Wehrmacht in 1939. Having decided to desert to the Red Army at the first opportunity, he achieved this in March 1943 when he had been wounded. He was healed at a Soviet military hospital, learned Russian, and became a teacher. Back in Berlin at the end of the war he is at first a teacher at the SED (Socialist Unity Party of German) School in Berlin, then a district administration official in Berlin for the SED. In 1955 he begins a scientific career in German History at the Humboldt University, where he got his Ph.D. in 1963. Starting 1970 he worked as a researcher at the Central Institute of History of the GDR Academy of Sciences.

Having first devoted himself to the study of Nazi-fascism, the author then turned to the task which he considered to be of the highest priority and to which he devoted himself with mastery: the denunciation of revisionism in the communist parties of Europe, including the SED and the CPSU, which blossomed in plain light following Khrushchev's (in)famous report to the 20th Congress of the CPSU.


The book has 6 chapters, corresponding to individual articles by the author. In Chapter 1, "From Weimar to Hitler: The Causes of the Advent of the Fascist Dictatorship," the author observes with full application today: "In Federal Germany, as in other imperialist states, thousands of journalists, historians, philosophers and sociologists on the payroll of the State are struggling to hide the causes and forces that gave birth to fascism." Hence the importance of scientifically studying it which clearly reveals fascism as an international phenomenon, as a solution of monopolies and imperialism, in a "period of general crisis [...] to suppress and keep the workers' movement in check through terror and violence."

The author goes on to explain the support given since 1919 by the monopolist bourgeoisie and the large landowners to the Nazi party, the NSDAP. In their support, the army had a prominent role, by providing weaponry and money to the NSDAP. As early as 1922-23 major industrialists began funding the NSDAP. The author presents the sequence of adhesions and support of the German monopolists to Nazism in a way that we have not found in other publications. He also reveals the first hour support of foreign moguls (Deterding of Royal Dutch Shell and Henri Ford).


The author also demolishes in chapter 1 the widely held lie that Hitler rose legally to power in 1933 because of the election results, when in fact the NSDAP was in electoral decline. The Nazi solution was extracted from Hindenburg by the representatives of the monopolists and landowners. The Communists (KPD) had already warned in 1932 that anyone who voted for Hindenburg voted for Hitler. "[...] it was not the millions of Nazi voters of the petty bourgeoisie, but rather the interests of the millionaires who determined the policy of the Nazi government and the class character of the fascist dictatorship." Indeed, in Germany as in other fascisms, the petty bourgeoisie attracted by the nationalist and "revolutionary" demagoguery of the fascists was immediately betrayed once they had seized power.

Chapter 1 ends by explaining the reasons why Hitler's rise could have been avoided if a crucial condition for that had been secured: the unity of the working class. Unfortunately, even on decisive days, the leaders of the SPD (Second International) betrayed the working class. And this in spite of the fact that many workers of the SPD joined the communists in fighting the fascists. As regards the betrayal of the SPD leaders, the author provides overwhelming evidence, completely undoing the often-disseminated lie of the guilt of KPD's "dogmatism-sectarianism."


Chapter 2, "Hitler and Capital. The Real Millions Behind Hitler," provides a wealth of detail on how Hitler and his associates progressed in their secretive meetings with representatives of the big capital from various parts of Germany. Meetings in which Hitler, having as advisers large tycoons, members of the NSDAP, helped him to prepare the discourse explaining the benefits of the Nazi-fascist solution. This was the demagogic solution of "national socialism", which was nothing more than to forcefully harness the proletariat to the monopoly cart, to tie the proletariat to the "noble" "national" cause conducted by the "elites" of invading and enslaving other peoples.

Chapter 2 also provides very interesting details on how publications for intellectuals prepared by the monopolies -- such as, the European Journal prepared by IG-Farben's servants -- subtly spread the message, not only to Germans but also to foreign intellectuals, of the great benefits of a strong Germany with a European vision. In reading these passages the reader should ponder on the concentration of economic and military powers in the representatives of the strong states of the EU -- Germany and France --, in the EC -- dominated by the European monopolies --, also untruthfully presented as beneficial to a united and “social” Europe.


Chapter 3, "Working class and fascism. The Socialism of the Steel Barons" convincingly demonstrates how the German working class never bent to fascism. And also that the construction of a nationalist workers’ party was proved in practice to have failed. The author describes how in 1922 Hitler, in a letter to entrepreneurs, "showed that he understood perfectly well what was important to the forces of the ruling class": the extermination of Marxism. Despite propaganda and, as he said in his letter, to be the NSDAP "a strong organization, with unscrupulous and brutal determination", he failed to achieve that. The enrollment of workers into the NSDAP was weak -- the author presents figures on this and also looks at how the NSDAP cells in the enterprises were terrorist and espionage organizations serving the capitalists. "The Nazi party became a mass party not as a "national workers party" but as an imperialist party whose supporters were essentially petty bourgeois," but it would be wrong to regard the Fascist party as having been created "originally as a party of a radicalized petty bourgeoisie against the labor movement and big capital.”

In Chapter 4, "The Impeachment of the Braun-Severing Government. The Socialist Party in the line of sight ", the author, quoting Georgi Dimitrov -- "Before the establishment of the fascist dictatorship, bourgeois governments generally go through a series of preparatory stages and take a series of reactionary measures, directly contributing to the rise of the fascism" --, shows how step by step the bourgeois government of the SPD went on adopting reactionary measures against the workers. Te author looks closely at how this step-by-step journey of the SPD hand in hand with the reaction led to the complacent self-dismissal (!) of the Braun-Severing SPD government in Prussia, which was then replaced by the Nazis. A chapter full of lessons on what can mean today the step by step journey of "socialist" leaders hand in hand with the reaction, that is, hand in hand with the representatives of the monopolies.


Chapter 5, "Origins and Variants of Fascism. Fascism, Dictatorship, and Parliamentary Democracy," begins by presenting Hilferding’s and Lenin's analyzes of monopoly capital and imperialism. Analyzes that show, as the author says, that "once born, the monopoly tends to autocracy, not only in the economic domain but also in the political domain", following this by an explanation of why this trend is a result stemming from an objective necessity. This tendency is especially strong in financial capital, which is the cornerstone of imperialism. The author ends by analyzing variants of fascism of Central and Eastern Europe.

Chapter 6, "The Politics of the Nazis in the Balkans through the European Journal. The expansion to the East, yesterday and ... today?" presents further details of the Nazi messages transmitted by the European Journal, analyzing the Nazi appetites for dominance of the Balkans, appetites that the German monopolies maintain and in fact have largely concretized today. Just consider the role of Germany in the fascist coup of Maidan in Ukraine and the German economic dominance in Greece, Romania and Bulgaria.


The book has a Preface of very good quality, written by Jorge Cadima. It begins this way: "This set of texts by Kurt Gossweiler on the rise of the most terrible and violent form of capitalist domination that history registers is important. Not only to counteract forgetfulness [...] But above all because we are witnessing today a blatant and shameless attempt to rewrite and falsify the historical truth about fascism."