sábado, 15 de junho de 2019

«A Cebola Gorbatchev» - II | “The Onion Gorbachev” - II

Com esta segunda parte e suplemento concluimos «As várias cascas da cebola Gorbatchev», do historiador Kurt Gossweiler, cuja primeira parte apresentámos aqui.
With this second part and supplement we complete “The various layers of the onion Gorbachev” by historian Kurt Gossweiler, whose first part we have posted here.


As várias cascas da cebola Gorbatchev

Kurt Gossweiler

Fevereiro de 1993
The various layers of the onion Gorbachev

by Kurt Gossweiler

February 1993

V. Quinta casca: A renúncia pública ao internacionalismo socialista através da propagação da «Casa Comum Europeia» (ND de 07.07.1989)

Gorbatchev há muito que tinha desistido do internacionalismo socialista na teoria e na prática, embora, de vez em quando, ainda o jurasse nos seus discursos.

O seu discurso na ONU também já tinha esclarecido que o seu mais importante objectivo na política externa era o entendimento caloroso com os líderes dos estados imperialistas, principalmente com os EUA.

Apesar de a situação da «comunidade» dos países socialistas ser deplorável, tal nunca o levou a fazer propostas construtivas para uma cooperação verdadeiramente efectiva entre os estados socialistas. Também nunca descobriu a fórmula da «casa comum socialista» porque esta casa, que se encontrava em decadência, a precisar de obras, nunca lhe fez passar – como a muitos simples comunistas! – noites em claro.

O que ocupava continuamente os seus pensamentos, e finalmente o levou a cunhar a fórmula «casa comum europeia», foi a questão de como podia tornar familiar e atractiva à sua gente no país a linha da cooperação «confiante» com o imperialismo. A melhor forma era obter êxitos visíveis na sua «política de desanuviamento». Isto não era fácil. Embora a Sr.a Thatcher e os presidentes Reagan e Bush não duvidassem da fiabilidade política de Gorbatchev a favor deles e lhe desejassem constantemente sucesso para o seu negócio da perestroika, duvidaram no entanto, durante muito tempo, de que fosse capaz de lidar com o duro empreendimento, verdadeiramente sem precedentes, de ultrapassar a resistência interna e induzir o partido dos bolcheviques a tornar-se um seguidor permanente. Por essa razão, durante muito tempo, não se dispuseram a honrar as inúmeras medidas unilaterais de desarmamento de Gorbatchev, tomando medidas apropriadas ou assinando acordos de desarmamento. Só quando estavam certos de que havia pouco perigo de ele ser derrubado pelas forças «conservadoras», desistiram dessa atitude reservada, não inteiramente, mas em algumas áreas.

Foi assim que, como recompensa pela sua acção tão abençoada para o Ocidente, lhe foi dada a honra de poder discursar perante o Conselho da Europa em Estrasburgo. Neste discurso, Gorbatchev apresenta o seu conceito da «casa comum europeia» e traça, como na ONU, uma imagem pintada com as mais belas cores da futura Europa, pacífica, sem armas nucleares e cooperando harmoniosamente. (ND de 07.07.1989) [9]

Gorbatchev fala novamente da «construção de um novo mundo», da «comunidade mundial», que se encontra «num ponto de mudança do seu destino», da «nova etapa da história mundial».

«A ideia da unificação europeia deve ser desde o início trabalhada em comum no processo de acções conjuntas de todas as nações. … a dificuldade reside … [na] ideia largamente difundida, ou mesmo na visão política, de que para superar a divisão da Europa há que superar o socialismo. Mas este é um caminho de confrontação, se não algo pior … A existência nos estados europeus de sistemas sociais diferentes é uma realidade e o reconhecimento deste facto histórico … é a premissa mais importante de um processo europeu normal.»

Até aqui tudo bem. Mas na frase seguinte, Gorbatchev consola a audiência: a situação como está, não tem de continuar!

«A organização social e política deste ou daquele país mudou no passado e pode mudar no futuro.»

Dadas as mudanças que já tinham sido introduzidas na URSS, estas palavras só podiam soar a quem as ouviu como uma promessa.

«Contudo, a decisão e a escolha cabem aos povos. Qualquer ingerência nos assuntos internos, qualquer tentativa de limitar a soberania dos estados, venha ela de amigos e aliados ou de qualquer outro Estado, são inadmissíveis.»

Isto foi, uma vez mais, uma garantia emfática dirigida ao Ocidente de que, da parte da União Soviética, nenhum aliado seria impedido, por exemplo, de sair do Pacto de Varsóvia e transferir-se para o outro campo, como Imre Nagy [10] tentara em 1956, e pretendiam de novo poderosas forças que chegavam até aos círculos do poder na Hungria e na Polónia.

Esta garantia era tão importante para ele, que voltou a ela:

«A concepção filosófica da casa comum europeia exclui a possibilidade de uma confrontação militar, a possibilidade de recurso ou ameaça de violência, principalmente militar -- de uma aliança contra outra, ou dentro de uma aliança -- onde quer que seja.»

Gorbatchev aparece já aqui como advogado dos interesses americanos, dando um passo no caminho que o conduziu à guerra do Golfo de 1990/91 e à sua humilhação como ajudante de xerife dos EUA:

«As realidades actuais e as perspectivas para um futuro previsível são evidentes: a URSS e os EUA são parte natural da estrutura política internacional europeia.»

A todos os que no Parlamento de Estrasburgo ainda duvidavam da capacidade de Gorbatchev se manter no poder e levar as suas reformas ao fim desejado, as suas palavras devem ter infundido confiança:

«A perestroika está a mudar o nosso país, transportando-o para novas fronteiras. Este processo aprofundar-se-á, transformando a sociedade soviética em todos os aspectos: nos domínios económico, social, político, moral, em todos os assuntos internos e nas relações entre as pessoas. Encetámos este caminho resolutamente e irrevogavelmente.»

Certamente que o «irrevogável» foi ouvido com especial alegria em Estrasburgo. E hoje constatarão: Gorbatchev não lhes prometeu demasiado!
V. Fifth layer: The public renunciation to socialist internationalism through the propagation of the "European Common House" (ND of 07.07.1989)

Gorbachev had long relinquished socialist internationalism in theory and practice, though from time to time he still swore it in his speeches.

His speech at the UN had also made it clear that his most important goal in foreign policy was a warm understanding with the leaders of the imperialist states, especially with the United States.

Although the situation of the "community" of the socialist countries was deplorable, this has never led him to put forward constructive proposals for a truly effective co-operation between the socialist states. Nor has he ever discovered the formula of the "socialist common house" because this house, which was in decadence, in need of works, never made him go through sleepless nights -- like many rank and file communists!

What continually occupied his thoughts, and finally led him to coin the phrase "European common house," was the question of how he could make familiar and attractive to the people of his country the line of "trustworthy" co-operation with imperialism. The best way was to achieve visible successes in his “policy of détente”. This wasn’t easy. Although neither Mrs. Thatcher nor Presidents Reagan and Bush doubted Gorbachev's political reliability in their favor and repeatedly wished him success in his perestroika business, they doubted for a very long time that he would be capable of handling the truly unprecedented, breakneck business, of overcoming the domestic resistance and of actually turning the party of the Bolsheviks into becoming a permanent follower of him. It was for that reason that they stood for a long time unwilling to correspond to Gorbachev's countless unilateral disarmament measures, either by taking appropriate measures or by concluding disarmament agreements. Only when they became really sure that there was little danger of he being ousted by "conservative" forces, did they give up their reserved attitude, not entirely, but in some areas.

Thus, as a reward for his action so blessed to the West, he was awarded the honour of being able to address the Council of Europe in Strasbourg. In his speech, Gorbachev presented his concept of the "European common house" and draws a picture -- as at the UN -- painted with the most beautiful colours of the future peaceful, nuclear-weapon-free, and harmoniously co-operating Europe. (ND 07/07/1989) [9]

Gorbachev again speaks of the "construction of a new world", of the "world community", which is "at a turning point in its destiny", of the "new stage of world history".

'The idea of ​​European unification must be from the start worked out together in the process of common actions of all nations... The difficulty arises... [in] the widely held idea, or even in the political view, that in order to overcome the division of Europe socialism should be overcome. But this is a confrontation course if not something worse ... The belonging of the states of Europe to different social systems is a reality, and the recognition of this historical fact ... is the most important prerequisite of a normal European process."

So far so good. But in the following sentence, Gorbachev comforts his audience: the situation as it is does not have to stay that way!

"The social and political order of this or that country has changed in the past, and may change in the future."

Given the changes that had already been introduced in the USSR, these words could only sound as a promise to those who heard them.

"But this is exclusively a matter for the peoples themselves to decide and choose. Any interference in domestic affairs and any attempt to restrict the sovereignty of states, whether or not they come from friends and allies, are inadmissible."

This was, once again, an emphatic assurance to the West that, from the side of the Soviet Union, no ally would be prevented, for example, from leaving the Warsaw Pact and transfer itself to the other camp, as Imre Nagy [10] had attempted in 1956, and as was once again the intention of powerful forces that had reached up to the circles of power in Hungary and Poland.

This assurance was so important to him that he came back to it again:

“The philosophical conception of the European common house rules out the possibility of a military confrontation, even the possibility of using or threatening with violence, above all with military force – of one alliance against another alliance or within an alliance -- wherever."

Gorbatchev emerges already here as an advocate of American interests, taking a step on the path that led him to the 1990/91 Gulf War and his humiliation as a US sheriff's deputy:

"The realities of today and the prospects for the foreseeable future are evident: the USSR and the United States are a natural part of the European international political structure."

To all those in the Strasbourg parliament that still doubted whether he, Gorbachev, would succeed in holding on in power and leading his reforms toward the goal he hoped for, his words must have instilled confidence:

"The perestroika is changing our country and carrying it to new frontiers. This process will deepen, transforming Soviet society in all aspects: in the economic, social, political, and moral aspects, in all internal affairs and relations between people. We have set out on this path resolutely and irrevocably."

The "irrevocably" was certainly heard in Strasbourg with especial joy. And they will realize today: Gorbachev did not overstate his promises!

VI. A sexta casca da cebola: a recusa da Revolução de Outubro na aparência de uma declaração em sua defesa

A 26 de Novembro de 1989 foi publicado no Pravda um artigo de duas páginas de Gorbatchev com o significativo título. «A ideia socialista e a transformação revolucionária» (ND de 28.11.1989)

Significativo porque já não se fala mais de «socialismo», mas tão só da «ideia socialista» – um sinal característico dos revisionistas e do revisionismo: a sua mais profunda convicção é de que, na verdade, o socialismo «não é factível», mas a tagarelice sobre a «ideia socialista» e a «visão socialista» não pode parar.

Este artigo de Gorbatchev é assim, também, um «Manifesto do Revisionismo». Valeria a pena comprová-lo em muitas passagens. Felizmente isso não é necessário porque neste «manifesto revisionista» há uma passagem que contém o revisionismo in nuce {concisamente}, pelo que é suficiente citar esta passagem para saber que espécie de pessoa é o autor.

Na mencionada passagem, Gorbatchev afirma que, para ele, a república democrático-burguesa é o objectivo desejável da organização social, e não o socialismo.

Mas naturalmente o secretário-geral do PCUS não podia escrever de forma directa esta «pura» declaração contra-revolucionária. Deve ter-lhe custado – e provavelmente também a alguns dos seus conselheiros – algum tempo e acrobacia de espírito até que lhe veio a ideia genial de envolver a recusa do socialismo na forma de uma declaração pela Revolução de Outubro; ou seja, uma formulação de que se podia ter a certeza que seria correctamente compreendida pela «sua» gente e, pelo contrário, mal compreendida no sentido desejado pelos de boa fé. A formulação é a seguinte:

«Quanto mais avançamos para a essência da nossa própria história, mais evidente se torna hoje que a Revolução de Outubro não foi um erro, já que a alternativa real a ela não era de forma nenhuma uma república democrático-burguesa, como alguns hoje nos procuram convencer, mas sim um golpe anarquista e uma ditadura militar sangrenta, a constituição de um regime reaccionário, inimigo do povo.»

Quem sabe ler e domina as mais elementares regras da lógica, não pode negar que este texto significa:

«A Revolução de Outubro teria sido um erro, se tivesse existido uma alternativa real: a república democrático-burguesa.» [11]

Mas como Gorbatchev sabe tão bem ou melhor do que qualquer «simples» comunista que
– a Revolução de Outubro foi conduzida contra o governo democrático-burguês existente, nomeadamente do russo Kerenski & C.a (o golpe de Kornílov já tinha fracassado),
 – Lenine, ao contrário de Gorbatchev, via na democracia burguesa a ditadura da burguesia, que tinha de ser derrubada para erigir a ditadura do proletariado,

segue-se que a formulação de Gorbatchev significa realmente:

«Como a Revolução de Outubro foi conduzida contra um governo democrático-burguês, foi um erro.»

De quem assim pensa, que a democracia burguesa é mais importante do que a revolução socialista – e ninguém pode negar que isto é exactamente o núcleo do parágrafo citado! – é de esperar que use o poder, caso lhe seja entregue, para corrigir o «erro» e iniciar uma perestroika, a transformação da ordem anticapitalista existente numa ordem burguesa.

Depois de uma afirmação como a citada, não podem existir dúvidas entre marxistas conhecedores de que:

– Gorbatchev, o secretário-geral do PCUS, não é comunista, mas sim um liberal burguês, na melhor das hipóteses um social-democrata;

– um partido, com um tal homem na liderança, deixou de ser comunista, deixou de ser o partido de Lenine;

– um país, cujo chefe de Estado é anticomunista e dirige o poder contra os comunistas no país, deixa de ser socialista e é um país a caminho da restauração capitalista;

– ninguém precisa de se admirar que este homem tivesse a simpatia e a gratidão dos chefes do imperialismo e o autorizassem a demonstrar uma afectuosa amizade íntima.
VI. The sixth layer of the onion: the refusal of the October Revolution in the guise of a statement in its defence

On November 26, 1989 a two-page article by Gorbachev was published by Pravda with the significant title. "The Socialist Idea and the Revolutionary Transformation" (ND, 28.11.1989)

Significant because it no longer speaks of "socialism" but only of "socialist idea" -- a characteristic sign of revisionists and revisionism: their deepest conviction is that, socialism in fact, "is not feasible", but the idle chatter about the "socialist idea" and the "socialist vision" must go on.

This article by Gorbachev is also, in fact, a "Manifesto of Revisionism." It would be worth checking it in many passages. Fortunately, this is not necessary because in this "revisionist manifesto" there is one passage that contains revisionism in nuce {in a nutshell}, so it is enough to cite this passage to know what kind of person is the author.

In this passage, Gorbachev says that for him the bourgeois-democratic republic is the desirable aim of social organization, not socialism.

But, of course, the General Secretary of the CPSU could not write straightforwardly this "pure" counter-revolutionary statement. It must have cost him -- and probably also to some of his advisers -- some amount of time and acrobatics of spirit until it came to him the genial idea of ​​involving the refusal of socialism in the form of a declaration supporting the October Revolution; in other words, a formulation which could be guaranteed that it would be correctly understood by “his” people and, inversely, misunderstood in the sense wished for by those of good faith. The formulation is the following one:

"The further we advance to the essence of our own history, the more obvious it becomes today that the October Revolution was not a mistake, for the real alternative to it was by no means a bourgeois-democratic republic, as some people today try to convince us, but indeed an anarchist coup and a bloody military dictatorship, the establishment of a reactionary, anti-people regime."

Anyone who knows how to read and masters the most elementary rules of logic, cannot deny that the meaning of this text is:

"The October Revolution would have been a mistake if there had been a real alternative: the bourgeois-democratic republic." [11]

But since Gorbachev knows as well as or even better than any "simple" communist, that
-- the October Revolution was conducted against an existing bourgeois-democratic government, namely the one of the Russian Kerensky & Co. (the Kornilov coup had already failed),
-- Lenin, unlike Gorbachev, saw in bourgeois democracy the dictatorship of the bourgeoisie, which had to be overthrown to erect the dictatorship of the proletariat,

it then follows that Gorbachev's formulation really means:

"Since the October Revolution was conducted against a bourgeois-democratic government, it was a mistake."

From a man that thinks that way, that bourgeois democracy is more important than the socialist revolution -- and no one can deny that this is exactly the kernel of the quoted paragraph! -- one expects that he’ll use the power, in the event that it is handed over to him, in order to correct the "mistake" and set in motion a perestroika, the transformation of the existing anti-capitalist order into a bourgeois order.

After such a statement as the cited one, there can be no doubt among learned Marxists that:

-- Gorbachev, the General Secretary of the CPSU, is not a communist, but a liberal bourgeois, at best a social democrat;

-- a party, with such a man in the leadership, has ceased to be a Communist Party, it is no longer the party of Lenin;

-- a country whose head of state is anti-communist and directs power against communists in the country, ceases to be a socialist country, is a country on the road to capitalist restoration;

-- no one need will be surprised that this man received the sympathy and gratitude of the heads of imperialism and they allowed him to demonstrate affectionate intimate friendship.

VII. Quase no núcleo da cebola: satisfação com o alcance do objectivo e recompensa merecida

Em Outubro de 1990, o Comité do Prémio Nobel decidiu atribuir o Prémio Nobel da Paz a Mikhail Gorbatchev. Também havia um outro candidato na lista: Nelson Mandela.

O Comité manteve-se fiel à sua tradição de distinguir preferencialmente com o Prémio Nobel da Paz personalidades que tivessem obtido méritos na luta contra o socialismo; para só referir dois dos últimos: Sakharov e Walesa.

O Comité justificou correctamente a sua decisão: Gorbatchev prestou «muitas e decisivas contribuições para a transformação da Europa de Leste».

O presidente do Comité também esclareceu um outro aspecto da atribuição: com este prémio a já muito abalada autoridade de Gorbatchev no seu país devia ser reforçada. «Esperamos», disse Giske Andersen, o presidente, «que o prémio reforce a sua capacidade de acção para colaborar na criação de uma nova ordem mundial.»

Talvez ele o tenha feito realmente. De qualquer maneira, Gorbatchev já tinha colaborado fortemente na criação de uma «nova ordem mundial» ao apoiar a guerra do Golfo.

Não lhe foi permitido participar pessoalmente na entrega do prémio. Por isso mandou por escrito o seu agradecimento. Aí constata, cheio de satisfação, que o ano de 1990 marca «o fim da divisão contra-natura da Europa».

De novo: nenhum verdadeiro comunista considerou nunca «contra-natura» a existência de estados socialistas na Europa ao lado de [estados] capitalistas, tão pouco nos séculos XVIII e XIX os democratas consideraram «contra-natura» a existência na Europa de estados burgueses ao lado de estados feudais. Pelo contrário: o aparecimento de estados socialistas foi a consequência natural do desenvolvimento do capitalismo, como o capitalismo foi consequência natural do desenvolvimento da produção de mercadorias no feudalismo.

Mas: a satisfação de Gorbatchev sobre o fim da divisão da Europa, através do desaparecimento do socialismo não é – como resulta claramente de tudo o que foi citado – uma mudança brusca de sentido, mas sim a alegria «natural» de um homem que trabalhou com todas as suas forças para este resultado e atingiu finalmente a meta dos seus esforços. E assim não foi também nenhum «deslize» ou um «Gorbatchev completamente novo», mas sim exactamente aquele que já era em 1985, quando a 12 de Dezembro de 1991 ao proclamar a dissolução da URSS, dissolvendo o Tratado da União de 1922, disse aos jornalistas:

«A coisa mais importante da minha vida cumpriu-se. Fiz tudo o que pude.»

Ninguém o pode contestar! Teve mais êxito na destruição do socialismo do que todos os seus inimigos declarados, de Churchill a Hitler.

Mas… ainda não estamos no núcleo da cebola!

Para isso teve primeiro a [revista] Der Spiegel de o libertar da última casca e pô-lo a nu.
VII. Almost at the core of the onion: satisfaction with the achieved goal and deserved reward

In October 1990, the Nobel Prize Committee decided to award the Nobel Peace Prize to Mikhail Gorbachev. There was also another candidate on the list: Nelson Mandela.

The Committee remained faithful to its tradition of distinguishing preferably with the Nobel Peace Prize personalities who have earned merit in the struggle against socialism; to name but two of the last ones: Sakharov and Walesa.

The Committee rightly justified its decision: Gorbachev made “many decisive contributions to the transformation of Eastern Europe”.

The chairman of the Committee also clarified another aspect of the award: Gorbachev's already shaken authority in his country should be strengthened with this award. "We hope," said the chairman, Giske Andersen, "that the prize strengthens your acting ability to collaborate toward creating a new world order."

Maybe he really did it. In any case, Gorbachev had already collaborated strenuously in creating a "new world order" by supporting the Gulf War.

Gorbachev was not allowed to attend the award ceremony. Therefore, he sent his message of thanks in writing. In it he noted with satisfaction, that the year 1990 marked "the end of the unnatural division of Europe".

Again, no true communist has ever considered "unnatural" the existence of socialist states in Europe alongside capitalist [states], and likewise the democrats in the 18th and 19th centuries did not consider the existence in Europe of "bourgeois states" alongside feudal states to be “unnatural”. Quite the contrary: the emergence of socialist states was the natural consequence of the development of capitalism, just as capitalism was the natural consequence of the development of commodity production in feudalism.

But Gorbachev's satisfaction with the end of the division of Europe achieved with the disappearance of socialism is not -- as is clear from all that has been quoted -- a sudden turn of direction, but the "natural" joy of a man who worked with all his might for this result and finally achieved the goal of his efforts. And so it was also not a "gaffe" or a completely new "Gorbachev", but exactly the one he was in 1985, when he on 12 December 1991 proclaimed the dissolution of the USSR, dissolving the Union Treaty of 1922, and told the journalists:

"The main achievement of my life has come true. I did everything I could. "

No one can contest him! He was more successful in destroying socialism than all its declared enemies, from Churchill to Hitler.

But… we are not yet at the core of the onion!

For that the [magazine] Der Spiegel had first to release him of the last layer and expose him.

VIII. «É este então o núcleo da cebola: um social-democrata!»

A quem, comunista ou socialista, que ainda não tenha ultrapassado a sua «gorbimania», tem de se lhe receitar a entrevista da Der Spiegel como terapia. (Der Spiegel de 18.01.1993).

Seguem-se aqui só alguns excertos dos mais significativos. Primeiro que tudo uma confissão muito importante:

«O que quer que hoje aconteça [na ex-União Soviética] tem a ver com o que iniciei em 1985. A era Gorbatchev não está no fim, ela inicia-se agora a sério.»

Ou seja: ele não é nenhum derrotado, nenhum náufrago, mas alguém que alcançou as condições para que a sua era pudesse iniciar-se a sério!

«Spiegel – Para uns era muito lento, para outros tudo era demasiado radical.

Gorbatchev – E Gorbatchev teve de timonar o navio da perestroika através dos recifes. Nessa altura ainda não era possível anunciar ao povo as coisas para as quais o povo ainda não estava preparado. ... Tinha de se mostrar paciência, até a burocracia do partido já estar tão sem poder, que não podia mais fazer recuar (!) a roda da História (!).

Spiegel – Mikhail Sergueievitch, já não é comunista?

Gorbatchev – Se considerar as minhas afirmações, então será claro para si que as minhas simpatias políticas pertencem à social-democracia e à ideia de um Estado social do género do da República Federal da Alemanha.”

O que aqui se demonstra com esta crónica, desde 1985, Gorbatchev confirma-o na Der Spiegel: é completamente errada a opinião daqueles que acreditam que Gorbatchev queria melhorar o socialismo, mas que não tinha a concepção correcta ou não tinha mesmo nenhuma. Ele tinha uma concepção e essa consequentemente procurou realizar e concretizou-a com êxito; só que não era nenhuma concepção para a construção do socialismo, mas sim de desmantelamento do socialismo.

Ele só o conseguiu porque, através do trabalho preparatório de Khruchov, o movimento comunista na União Soviética e internacional já se encontrava tão profundamente atolado no revisionismo, e já tão desarmado e «desleninizado» ideologicamente, que só poucos leram nas afirmações de Gorbatchev o que elas continham de contra-revolução.

Como é que se pôde chegar aí – esta é na verdade a mais importante, mas uma nova questão. Mas só pode ser correctamente respondida por quem estiver curado da «gorbimania».
VIII. "This is the core of the onion: a social-democrat!"

To anyone, communist or socialist, who hasn’t yet overcome his/her "Gorbimania," one has to prescribe as therapy the interview to Der Spiegel. (Der Spiegel, 18.01.1993).

Here are just a few excerpts from the most significant ones. First of all a very important confession:

"Whatever happens today [in the former Soviet Union] has to do with what I started in 1985. The Gorbachev era is not over, it starts now seriously."

That is: he is no defeated man, no stranded man; he has now reached the conditions in order that his era could begin seriously!

"Spiegel -- For some it was too slow, for others everything was too radical.

Gorbachev -- And Gorbachev had to steer the perestroika vessel through the reefs. At that time it was not yet possible to announce to the people the things for which the people were not yet ready. ... He had to show patience, until the bureaucracy of the party was already so powerless, that it could no longer push back (!) the wheel of history (!).

Spiegel -- Mikhail Sergeyevich, no longer a communist?

Gorbachev -- If you consider my statements, then it will be clear to you that my political sympathies belong to social democracy and to the idea of ​​a social state of the sort of the Federal Republic of Germany.”

What we have demonstrated, with our chronicle from 1985 onwards, Gorbachev confirms to Der Spiegel: The view of those people who believe that Gorbachev wanted to improve socialism, but did not have the right conception or no conception at all, is utterly wrong. He had a conception, and he has consistently pursued it and achieved it successfully; it wasn’t, however, a conception of socialist construction, but rather the dismantling of socialism.

He was able to achieve it only because Khrushchev's preparatory work had already placed the Communist movement in the Soviet Union and internationally so deep in the morass of revisionism, that it was already ideologically so thoroughly disarmed and de-Leninized that only a few grasped from Gorbachev's statements what they contained of counter-revolution.

How could things get there -- this is actually the most important question, but nevertheless a new question. It can only be answered correctly by those who are cured of the "Gorbimania."

IX. O âmago do núcleo: ajudante solícito do Ocidente

No Outono de 1999, M. Gorbatchev fez um discurso interessante, em Ankara, na Universidade Técnica do Médio Oriente (ODTÜ). Mas, apesar de ter sido publicado nas revistas Pravda Rossií, na Rússia, Usvit, na República Eslovaca (n.º 24/1999), Dialog, na República Checa (n.º 146/Outubro 1999), UZ do DKP (08.09.2000) e Die Rote Fahne do KPD, talvez não tenha merecido atenção suficiente:

«O objectivo da minha vida era a eliminação do comunismo, uma ditadura insuportável sobre o povo. A minha mulher, que tinha compreendido esta necessidade mesmo antes de mim, apoiou-me inteiramente. Foi justamente para atingir este objectivo que me servi da minha posição no partido e no país. Por isso a minha mulher incentivava-me constantemente para que ocupasse posições cada vez mais altas no país.

Quando conheci pessoalmente o Ocidente, percebi que não podia renunciar ao objectivo definido. Para o alcançar, precisava de substituir toda a liderança do PCUS e da URSS, bem como a liderança em todos os países socialistas. O meu ideal nessa altura era a via dos países sociais-democratas. A economia planificada não permitia realizar o potencial que possuíam os povos do campo socialista. Só a passagem para a economia de mercado podia proporcionar possibilidades aos nossos países de se desenvolverem com dinamismo. Consegui encontrar seguidores para concretizar estes objectivos. Entre eles ocupam um lugar especial A.N. Iakovlev e E.A. Chevardnadze, cujos serviços à nossa causa comum são inestimáveis.

O mundo sem comunismo terá melhor aspecto. A partir do ano 2000 começará uma era de paz e de prosperidade universal. Mas ainda existe uma força no mundo que irá entravar o nosso avanço e construção da paz. Refiro-me à China.

Visitei a China durante as grandes manifestações estudantis [1989], quando parecia que o comunismo se estava a desmoronar na China. Tencionava dirigir-me aos estudantes naquela enorme praça, manifestar a minha simpatia e apoio, e convencê-los de que teriam de continuar a sua luta para que a perestroika começasse no seu país. A direcção chinesa não apoiou o movimento estudantil, reprimiu cruelmente a manifestação e... cometeu um grande erro. Se o comunismo tivesse acabado na China, o mundo poderia caminhar mais facilmente pela via da concórdia e da justiça.

A minha intenção era conservar a URSS com as fronteiras então existentes, mas com um outro nome que reflectisse a essência das transformações democráticas. Não o consegui.

Ieltsine tinha uma terrível ambição de poder, mas não tinha a menor ideia sobre o que representava um Estado democrático. Foi ele quem demoliu a URSS, o que provocou o caos político e todas as consequentes dificuldades que são hoje vividas pelos povos das antigas repúblicas da União Soviética.

A Rússia não pode ser uma grande potência sem a Ucrânia, o Cazaquistão e as repúblicas do Cáucaso. Mas estes já seguiram o seu próprio caminho e não faz sentido uma unificação mecânica, uma vez que isso conduziria a um caos constitucional. Os estados independentes podem unir-se unicamente na base de ideias políticas, da economia de mercado, da democracia, de direitos iguais de todos os povos.

Quando Iéltsine destruiu a URSS, eu deixei o Krémlin, e alguns jornalistas supuseram que eu choraria. Mas não chorei porque pus fim ao comunismo na Europa. Mas também é preciso acabar com ele na Ásia, uma vez que constitui o principal obstáculo no caminho da realização pela humanidade dos ideais da paz e concórdia universal.

A desagregação da URSS não trouxe qualquer vantagem para os EUA. Agora estes não têm um parceiro no mundo à altura, o qual só poderia ter sido uma URSS democrática (e para se manter a sigla anterior SSSR [Soiuz Soviétskikh Sotsialistítcheskikh Respúblik] poder-se-ia designá-la como Soiuz Svobódnikh Suverennikh Republik [União das Repúblicas Soberanas Livres]). Mas não o consegui fazer. Na ausência de um parceiro igual em direitos, os EUA podem, naturalmente, ter a tentação de se apropriar do papel de único líder mundial, que não precisa de ter em conta os interesses dos outros (em particular dos pequenos estados). Este erro encerra muitos perigos tanto para os EUA como para todo o mundo. O caminho dos povos para a verdadeira liberdade é difícil e longo, mas terá obrigatoriamente êxito. Mas para isso o mundo inteiro tem de se libertar do comunismo.» [12]
IX. The heart of the core: the solicitous aide of the West

In the fall of 1999, M. Gorbachev made an interesting speech, in Ankara, at the Technical University of the Middle East (ODTÜ). But despite having been published in the magazines Pravda Rossií in Russia, Usvit in the Slovak Republic (no. 24/1999), Dialog in the Czech Republic (no. 146 / October 1999), UZ of the DKP (08.09. 2000) and Die Rote Fahne of the KPD perhaps it has not received enough attention:

"The purpose of my life was the destruction of communism, an unbearable dictatorship over the people. I was fully supported by my wife, who had understood the need for this even before me. It was precisely to achieve this goal that I used my position in the party and in the country. That is why my wife kept pushing me to consistently occupy an increasingly higher position in the country.

When I personally came to know the West, I realized that I could not give up the defined goal. And to be achieved, I needed to replace the entire leadership of the CPSU and the USSR, as well as the leadership in all socialist countries. My ideal at that time was the way of the social-democrat countries. The planned economy did not allow the realization of the potential that had the peoples of the socialist camp. Only the transition to the market economy could provide opportunities for our countries to develop in a dynamic way. I was able to find followers to achieve these objectives. Among them occupy a special place A.N. Yakovlev and E.A. Shevardnadze, whose services to our common cause are invaluable.

The world without communism will look better. From the year 2000 onwards an era of peace and universal prosperity will come. But there is still a force in the world that will hamper our movement towards and construction of peace. I mean China.

I visited China during the great student demonstrations [1989] when it seemed that communism was crumbling in China. I intended to address the students in that large square, to express my sympathy and support, and to convince them that they would have to continue their struggle for perestroika to begin in their country. The Chinese leadership did not support the student movement, cruelly suppressed the demonstration and ... made a big mistake. If communism had ended in China, the world could move more easily along the way of concord and justice.

My intention was to preserve the USSR with the frontiers that existed then, but with another name that reflected the essence of the democratic transformations. I wasn’t able to achieve that.

Yeltsin had a terrible ambition for power, but he had no idea what a democratic state represented. It was he who demolished the USSR, which provoked the political chaos and all the consequent difficulties that are now experienced by the peoples of the former republics of the Soviet Union.

Russia cannot be a great power without Ukraine, Kazakhstan and the Caucasus republics. But these have already gone their own way and there is no sense in a mechanical unification, since this would lead to constitutional chaos. Independent states can unite solely on the basis of political ideas, market economy, democracy, equal rights of all peoples.

When Yeltsin destroyed the USSR, I left the Kremlin, and some journalists assumed that I would cry. But I did not cry because I have put an end to communism in Europe. But it is also necessary to end it in Asia, since it constitutes the main obstacle in the way of the realization by humanity of the ideals of peace and universal concord.

The disintegration of the USSR brought no advantage to the United States. Now they do not have a partner in the world at their level, which could only have been a democratic USSR (and in order to maintain the earlier acronym SSSR [Soiuz Sovietskikh Sotsialistítcheskikh Respúblik] it could be designated as Soiuz Svobódnikh Suverennikh Republik [Union of the Free Sovereign Republics]). But I wasn’t able to do it. In the absence of an equal rights partner, the US can naturally be tempted to take the role of sole world leader, who does not need to take into account the interests of others (particularly the small states). This error poses many dangers to both the US and the world. The path of peoples to true freedom is difficult and long, but will necessarily have success. But for this the whole world has to free itself from communism." [12]


A recompensa imperial de O MAIOR TRAIDOR DA HISTÓRIA: numa cerimónia em Filadélfia, 2008, George Bush presenteia Mikhail Gorbachev com uma Medalha da Liberdade e um prémio de 100 mil dólares.

The imperial reward of THE GREATEST TRAITOR IN HISTORY: at a ceremony in Philadelphia, 2008, George Bush bestowed Mikhail Gorbachev with a Medal of Freedom and a prize of 100 thousand dollars.

*    *    *

Porquê este regresso à «cebola Gorbatchev»? [13]

Redigido em Berlim, a 15 de Março de 2006, publicado em Offensiv – Zeitschrift für Frieden undSozialismus 4/2006, pags. 36-40.

Kurt Gossweiler
Why this comeback to the “Onion Gorbachev”? [13]

Written in Berlin on 15 March 2006, published in Offensiv - Zeitschrift für Frieden und Soszialismus 4/2006, pp. 36-40.

by Kurt Gossweiler

Terão todos os comunistas e socialistas despachado Mikhail Gorbatchev para o caixote do lixo da história – lugar a que esta gente pertence – depois da publicação da sua entrevista na Spiegel, em Janeiro de 1993 (cf. «A cebola», ponto VIII), ou o mais tardar após a publicação do seu discurso em Ankara, em Outubro de 1999 (cf. ponto IX), no jornal do DKP Unsere Zeit, de 8 de Setembro de 2000?

Estava absolutamente convencido de que sim, mas, como para meu imenso espanto tive de constatar – isso foi um erro. O meu espanto foi imenso porquanto foi-me provocado por um jornal e um texto de um dos seus colaboradores, de quem nunca esperaria tal coisa. Trata-se do único jornal consequentemente anti-imperialista da Alemanha, o Junge Welt, e do seu colaborador Werner Pirker, com cujos artigos concordei quase sempre até agora.

Foi precisamente no 50.º aniversário do XX Congresso do PCUS, em Fevereiro de 1956 -- que encheu de esperança os inimigos da União Soviética e do socialismo, e lançou o movimento comunista numa crise cada vez mais profunda --, e 20.º aniversário do XXVII Congresso do PCUS, em Fevereiro de 1986 -- que impulsionou a crise final da União Soviética e dos seus aliados europeus --, que artigos de Werner Pirker de apreço destes congressos e dos seus organizadores Khruchov e Gorbatchev, surgiram em várias edições do Junge Welt.

Aqui só falaremos de Gorbatchev. A incompreensível defesa da honra de Gorbatchev nos artigos de Pirker, publicados no Junge Welt, de 28 de Fevereiro e 1 de Março do corrente ano, não pode ficar sem réplica em nome da verdade histórica.

No primeiro artigo sobre o XXVII Congresso – Junge Welt de 28 de Fevereiro – Pirker assume logo no início a tese através da qual todas as acusações de traição são eliminadas: «O PCUS não foi liquidado pelo ataque de forças inimigas, mas sim vítima de si próprio.»

Gorbatchev afirmara abertamente no seu discurso em Ankara: «O objectivo da minha vida era a eliminação do comunismo.»

Pirker sabe isto e melhor. Ensina-nos sobre a atitude de Gorbatchev no XXVII Congresso: «Mikhail Gorbatchev nem sequer tentou confrontar os delegados com um programa radicalmente novo. Teria sido porque não tinha a coragem que Khruchov demonstrou em 1956? Ou porque ele – perestroika para cá, glasnost para lá – queria deixar os delegados na incerteza sobre as suas verdadeiras intenções? O mais provável é a suposição de que ele próprio não sabia que destino teria a viagem.» (Sublinhados meus, KG)

Gorbatchev – diz Pirker – é na verdade vítima do «modelo de socialismo burocrático»: «Os problemas do modelo do socialismo burocrático estavam à vista no início da era Gorbatchev; na verdade, já se tinham tornado irresistíveis … No seu espartilho burocrático, o socialismo não conseguiu criar nenhuma opinião pública democrática adequada. Ao conservadorismo estrutural correspondia a inércia social das massas.»

Por conseguinte, segundo Pirker, foi a inércia das massas que impediu Gorbatchev de fazer o necessário!

Na verdade, o que impediu Gorbatchev de realizar de imediato as suas intenções não foi «a inércia social das massas», mas sim o seu receio da resistência das massas contra o desmantelamento da ordem socialista.

Na sua entrevista à Spiegel, Gorbatchev revelou como escarneceu das massas e as enganou deliberadamente sobre as suas verdadeiras intenções: O jornalista da Spiegel comentou sobre o desenrolar da perestroika: «Para uns era muito lento, para outros tudo era demasiado radical.

«Gorbatchev: E Gorbatchev teve de timonar o navio da perestroika através dos recifes. Nessa altura ainda não era possível anunciar ao povo as coisas para as quais o povo ainda não estava preparado. (Sublinhado meu, KG)

Pirker inicia o seu comentário sobre a «inércia das massas» com a seguinte observação:

«Nessa perspectiva, a ideia de romper as condições através de um novo sistema de abertura social era apropriada à situação. No seu relatório ao partido, Gorbatchev disse que sem “glasnost não há nem pode haver democracia. … A glasnost é necessária no centro, mas também ou talvez até ainda mais na base, lá onde as pessoas vivem e trabalham.

Isto ainda expressava uma ideia de democracia que só se pode desenvolver na base de relações de produção e de propriedade socialistas. É uma ideia de abertura que não tem como modelo o parlamentarismo burguês, mas aponta para um amplo debate social, denuncia evoluções erradas, repele a mentalidade submissa, activa formas de controlo popular e assim liberta o potencial criativo das bases. Nisto consistia a filosofia inicial da perestroika, que se expressava no lema “Mais democracia, mais socialismo”.»

Nesta altura, Pirker deve ter receado estar a abusar do leitor com este elogio a Gorbatchev, apresentando-o como um modelo de democrata socialista, já que relativiza com a frase seguinte: «Pelo menos assim parece.»

Depois de Pirker nos ter mostrado que afinal Gorbatchev se encontrava no caminho certo para a verdadeira democracia socialista, não poderia deixar de explicar por que razão ele, contudo, «falhou».

Para isso alega características pessoais de Gorbatchev: «A sua escassa ligação ao povo e a sua arrogância social.» Essas são as razões por que «nunca atingiu grande popularidade» – aspecto de que nós temos outras recordações entre os anos 1985 e 1987! – e isso também preparou «as bases para a ascensão do seu grande rival Boris Nikolaievitch Ieltsine.»

Também isto é um espantoso erro de avaliação: onde Pirker só vê rivalidade, houve na realidade, nos primeiros anos, inteira concordância entre Gorbatchev e Ieltsine sobre a meta e um acordo sobre a divisão de tarefas, como descrevi no ponto IV da «Cebola»: Gorbatchev desempenhava o papel de defensor do rumo moderado correcto contra a oposição de esquerda e de direita, Iéltsine desempenhava o papel do opositor que pressiona na direcção de reformas muito mais amplas, mas era apenas o precursor no caminho para o objectivo de ambos – a restauração do capitalismo na União Soviética.

Porém, isto não era alcançável por caminhos directos, sem o embuste de combates ensaiados a propósito do rumo a tomar.

Entre Gorbatchev e Iéltsine só houve concorrência, e só podia haver, depois de a meta estar praticamente alcançada.

Pirker «identificou» uma outra razão para o «fracasso» de Gorbatchev no facto de ele ser demasiado burro para reconhecer os objectivos do imperialismo. Descobriu em Gorbatchev um «desconhecimento do carácter agressivo da essência imperialismo». Um testemunho deste «desconhecimento» é, para Pirker, a «tese nuclear do novo pensamento» sobre a «prioridade dos interesses gerais da humanidade sobre os interesses de classe.»

Não deveria ter dado que pensar a Pirker o facto de esta «tese nuclear do novo pensamento» – na verdade ainda em gérmen – já ter sido referida por Khruchev? No XXI Congresso do PCUS (1959) foi assim formulada: «Seria melhor para todos, se os políticos e militares americanos se deixassem conduzir por considerações humanas gerais e não por intenções egoístas.» (Citado com indicação da fonte em Taubenfusschronik (Crónica dos Pés de Lã), vol. 2, p. 235). O mesmo Khruchev, durante a sua visita ao presidente dos EUA, Eisenhower (1959), afirmou este tinha reconhecido efectivamente a coexistência pacífica com o mundo do socialismo! O «desconhecimento do carácter agressivo da essência do imperialismo» já caracterizava fortemente o precursor de Gorbatchev, o que na verdade parece ter escapado a Pirker.

Manifestamente os seus estudos sobre o XX e XXI congressos do PCUS não foram suficientes para compreender que a sua linha condutora foi o revisionismo moderno, uma das características fundamentais do qual é a substituição da luta contra o imperialismo pela reconciliação e cooperação com ele.

Pirker parece muito longe de uma tal compreensão; em todo o caso, claramente, afasta dela o leitor, pintando-lhe a imagem de um Gorbatchev sem nenhuma conceptualização e empurrado pelos acontecimentos, alguém que de forma nenhuma trabalhou conscientemente para provocar o fim da União Soviética:

«Quanto mais a perestroika marcava passo, mais radical se tornava a sua teoria. Pareceu querer alterar pela esquerda as condições. “O poder ao povo”, as fábricas aos operários, a terra aos camponeses”, declarava o centro do poder à volta do secretário-geral. Isto prometia mais e não menos socialismo. Estava na ordem do dia uma real socialização dos meios de produção, que ia além da sua nacionalização. Permanecerá para sempre um segredo que ideias eram, na realidade, as que orientaram, nessa época, o estado-maior da perestroika.»

Se Pirker tivesse lido minuciosamente o discurso de Gorbatchev perante os representantes dos meios de comunicação de massas e o tivesse analisado enquanto marxista, então teria podido perceber que Gorbatchev não só sabia exactamente para onde queria ir, como até anunciou o seu objectivo – mesmo que não directamente e sem reservas: a reintrodução da propriedade privada dos meios de produção! (Cf. secção IV).

Mas já antes desse discurso – ao qual Pirker até faz referência no último parágrafo do seu artigo com o título «Enriquecei-vos!» (JW de 28.02) – tinham sido aprovadas, em Dezembro de 1986, a «Lei sobre a Actividade Individual» e a «Lei sobre as Cooperativas», as quais Pirker, espantosamente, comenta assim: «É difícil dizer se se trata de confusão teórica ou se já havia a intenção de destruir a propriedade social.»

Como são possíveis tais dúvidas se o próprio Gorbatchev não lhes deixa qualquer espaço com as suas afirmações quer na Spiegel, quer no discurso em Ankara? Resposta de Gorbatchev na entrevista à Spiegel de 1993 à questão se ele ainda é comunista: «Se considerar as minhas afirmações, então será claro para si que as minhas simpatias políticas pertencem à social-democracia e à ideia de um Estado social do género do da República Federal da Alemanha.»

E Gorbatchev em Ankara em 1999: «Quando conheci pessoalmente o Ocidente, percebi que não podia renunciar ao objectivo definido. Para o alcançar, precisava de substituir toda a liderança do PCUS e da URSS, bem como a liderança em todos os países socialistas. O meu ideal nessa altura era a via dos países sociais-democratas.»

Não tinha aqui Pirker todas as razões para agradecer a Gorbatchev por lhe ter tirado todas as dúvidas sobre os seus objectivos e motivos? Mas não! Manifestamente quer mantê-las e para além disso quer que os seus leitores também as partilhem: «Devia-se», escreve, «proteger Mikhail Sergueievitch de se auto-difamar de ter conspirado contra o socialismo.»

Como assim? Pirker acrescenta: Gorbatchev «não devia ainda nessa altura ter qualquer plano. Quando o fracasso do projecto de renovação socialista se tornou definível, deixou as coisas correr como correram.»

Comunistas como por exemplo Rolf Vellay não precisaram de nenhuma confissão de Gorbatchev, como as citadas, para reconhecer nele um inimigo consciente do socialismo. Na chamada Conferência da Perestroika do DKP, no IMSF de Frankfurt, em 1987, Vellay afirmou clarividente: «Gorbatchev o secretário-geral – é a contra-revolução na direcção no PCUS! Gorbatchev, o presidente da URSS – é o fim do socialismo na União Soviética! O “Novo pensamento” – é a paralisia do conteúdo revolucionário do movimento comunista mundial.» (Rolf Vellay, Ensaios Escolhidos, Cartas, Discursos, Caderno 83, Berlim, Maio 2002, Schriftenreihe fur marxistische-leninistische Bildung der KPD).

Como se explica que alguém como Werner Pirker, que os leitores do Junge Welt conheceram durante anos como um analista perspicaz das tramas imperialistas, não só tem dificuldades em reconhecer a verdade, nos casos de Khruchev e Gorbatchev, como a declara não existente, apesar de estar à vista? A resposta é suficientemente simples: Pirker «conhece-a» há muito, e também a dá a conhecer logo no início do artigo: «O PCUS não foi liquidado pelo ataque de forças inimigas, mas sim vítima de si próprio.»

Se os factos o contradizem, pior para os factos! Como o PCUS, segundo a decisão de Pirker, não foi liquidado, mas liquidou-se, as confissões de Gorbatchev só podem ser invenções, na melhor das hipóteses uma «auto-difamação», de que o devemos proteger…

O estranho fechar de olhos de Pirker a factos há muito comprovados tem a sua razão no facto de que, para ele como para todos os anti-leninistas antes dele – de Kautsky, passando por Trotski e Tito até Gysi, Brie e Bisky –, o «sistema soviético» fundado por Lénine e consolidado por Estaline, o «modelo soviético», «o modelo de poder e o partido leninista», «o socialismo de Estado», «o sistema de comando burocrático», desde o início que continha o gérmen da morte e tinha, mais cedo ou mais tarde, necessariamente que fracassar, «destruir-se a si próprio». Surpreendente acordo sobre esta interpretação entre ele e Robert Steigerwald. Steigerwald afirma de forma idêntica: «A causa principal do declínio histórico é, portanto, o tipo de organização … O grupo de Gorbatchev foi confrontado com esta constelação de becos sem saída. Hoje, os seus principais representantes orgulham-se de ter iniciado o caminho da destruição da União Soviética conscientes e com empréstimos da social-democracia. Eu até considero isto uma intrujice que inventaram para apresentar o seu fracasso como o seu mérito e se tornarem meninos bonitos no Ocidente.» (Robert Steigerwald, Kommunistische Stand- und Streitpunkte, GNN Verlag, Schkeuditz, 2002, p. 34 e seg.)

A consequência de tais interpretações consiste na conclusão: não há nada a aprender com este modelo de socialismo, excepto como não se deve fazer! As graves consequências de uma tal interpretação devem estudar-se, entre outros, no destino dos partidos comunistas francês e austríaco e na proposta de programa do DKP.

Questionámos no título: «Porquê este regresso à “cebola Gorbatchev”?» A resposta é: quando o único jornal diário alemão consequentemente anti-imperialista e um dos seus justamente mais considerados colaboradores deixam tão claramente compreender que necessitam de ajuda na área da análise histórico-materialista de factos históricos, então todos os que podem contribuir para isso, devem fazê-lo, em seu benefício e dos seus leitores.
Have all communists and socialists dispatched Mikhail Gorbachev to the dustbin of history – the place where these people belong to -- after the publication of his interview to Der Spiegel in January 1993 (see “Onion”, section VIII), or at least after the publication of his speech in Ankara in October 1999 (see section IX), in the DKP newspaper Unsere Zeit of September 8, 2000?

I was absolutely convinced that they had, but, to my great astonishment, I had to realize: it was a mistake. My astonishment was immense because it was provoked to me by a newspaper and a text of one of its collaborators, from whom I would never expected such thing. It is the only anti-imperialist newspaper in Germany, the Junge Welt, and the collaborator is Werner Pirker, whose articles I have almost always agreed with.

It was precisely on the 50th anniversary of the 20th Congress of the CPSU in February 1956 -- which filled with hope the enemies of the Soviet Union and of socialism and threw the communist movement into an ever deeper crisis --, and on the 20th anniversary of 27th Congress of the CPSU in February 1986 --, which spurred the final crisis of the Soviet Union and of its European allies --, that articles by Werner Pirker praising these congresses and their organizers, Khrushchev and Gorbachev, appeared in several issues of Junge Welt.

Here we will only talk about Gorbachev. The incomprehensible defence of the honour of Gorbachev in Pirker's articles, published in the Junge Welt from February 28  to March 1  this year, cannot be left unanswered in the name of historical truth.

In the first article about the 27th Congress -- Junge Welt of February 28 -- Pirker assumes at the outset the thesis by means of which all charges of treason are eliminated: "The CPSU was not liquidated by the attack of enemy forces, but was a victim of itself."

Gorbachev had openly stated in his speech in Ankara: "The purpose of my life was the destruction of communism."

Pirker knows this and better. He informs us about Gorbachev's attitude at the 27th Congress: "Mikhail Gorbachev did not even try to confront the delegates with a radically new program. Was it because he did not have the courage that Khrushchev demonstrated in 1956? Or because he -- perestroika here, glasnost there -- wanted to leave the delegates uncertain about his true intentions? More likely is the assumption that he himself did not know where the journey would lead to." (my emphasis, KG)

Gorbachev -- Pirker says -- is actually a victim of the "bureaucratic socialist model": "The problems of the bureaucratic socialist model were in sight at the beginning of the Gorbachev era, and indeed had already become irresistible. ... In its bureaucratic corset, socialism failed to create any adequate democratic public opinion. To the structural conservatism corresponded the social inertia of the masses."

Therefore, according to Pirker, it was the inertia of the masses that prevented Gorbachev from doing what was necessary!

What really prevented Gorbachev from realizing his intentions in a short time was not “the social inertia of the masses”, but his fear of the resistance of the masses against the dismantling of the socialist order.

In his interview to Der Spiegel, Gorbachev revealed how he mocked the masses and deliberately deceived them about his true intentions: The journalist of Der Spiegel commented on the development of perestroika: "For some it was too slow, for others everything was too radical.

"Gorbatchev: And Gorbatchev had to steer the perestroika vessel through the reefs. At that time it was not yet possible to announce to the people the things for which the people were not yet ready. (My emphasis, KG)

Pirker begins his comment on the "inertia of the masses" with the following remark:

“In that sense, the idea of breaking up the conditions through a new system of social openness was appropriate to the situation. In his report to the party, Gorbachev said that without "glasnost there is no democracy, and there can be no such thing ... Glasnost is necessary in the center, but also or perhaps even more at the base, where people live and work.

This still expressed an idea of ​​democracy which can only develop on the basis of socialist relations of production and property. It is an idea of ​​openness which does not model bourgeois parliamentarism, but points to a broad social debate, that uncovers wrong developments, repels the submissive mentality, activates forms of popular control, and thus liberates the creative potential of the grassroots. This was the initial philosophy of perestroika, which was expressed in the motto "More democracy, more socialism."

At this point, Pirker must have feared that he was abusing the reader with this compliment to Gorbachev, presenting him as a model of socialist democrat, since he relativizes it with the following sentence: "At least it seems so."

Once Pirker has showed us that Gorbachev was after all on the right path to true socialist democracy, he could not fail to explain why, in spite of all that, he "failed".

To this purpose he brings forth Gorbachev's personal characteristics: "His scant connection to the people and his social arrogance." These are the reasons why he "never reached great popularity" -- an aspect of which we have different remembrances between 1985 and 1987! -- and this has also prepared "the bases for the rise of his great rival Boris Nikolayevich Yeltsin."

This too is an astonishing misjudgement: where Pirker only sees rivalry, there was in fact, in the early years, a complete agreement between Gorbachev and Yeltsin on the goal, and an agreement on the division of tasks, as I have described in section IV of “Onion”: Gorbachev played the role of defender of the correct moderate course against the left and right oppositions, and Yeltsin played the role of the opponent who urges towards much broader reforms, but was only the forerunner on the way to the goal of both -- the restoration of capitalism in the Soviet Union.

This was, however, not achievable by treading straight paths, and without resorting to scams of staged struggles about the course to be taken.

Only after the goal was practically achieved was there competition between Gorbachev and Yeltsin, and only then there could be.

Pirker "identified" another reason for Gorbachev's "failure" in his being too dumb to recognize the aims of imperialism. He discovered in Gorbachev an "ignorance of the aggressive character of the essence of imperialism." An evidence of this "ignorance" was, for Pirker, the "nuclear thesis of the new thinking" about the "priority of the general interests of humanity over class interests."

Shouldn’t Pirker have taken some thought from the fact that this "nuclear thesis of the new thought" -- albeit still in an embrionary form -- had already been mentioned by Khrushchev? It was formulated as follows at the 21st Congress of the CPSU (1959): "If the American politicians and military were guided by general human considerations and not by selfish intentions, that would be better for everybody." (Cited with indication of the source in Taubenfusschronik, 2nd vol., p 235). This is the same Khrushchev, who during his visit to the US president Eisenhower (1959), declared that the latter had indeed recognized peaceful coexistence with the world of socialism! The "ignorance of the aggressive character of the essence of imperialism" did already strongly characterize Gorbachev's forerunner, something that appears to have escaped Pirker.

His studies of the 20th and 21st Congresses of the CPSU have clearly not been sufficient to understand that their guiding line was modern revisionism, one of the fundamental characteristics of which is the replacement of the struggle against imperialism for the conciliation and co-operation with it.

Pirker seems to stand far away from such a knowledge; for whatever reason, he apparently wants to keep his readers away from such knowledge by painting the picture of a Gorbachev, as someone quite devoid of concepts and drifted away by current events, someone who in no way is consciously endeavouring to bring about the end of the Soviet Union:

"The more perestroika was dragging along, the more radical became the theory of perestroika. It seemed that it wanted to upset the situation in a Left-ward move. 'Power to the people, factories to the workers, land to the peasants,' declares the center of power around the General Secretary. That was a promise of more and not less socialism. A true socialization beyond the nationalization of the means of production stood on the agenda. It will probably always remain a secret, which were the ideas that have really guided at the time the General Staff of perestroika."

If Pirker had thoroughly read Gorbachev's address to the representatives of mass media and had analyzed him as a Marxist then he would have realized that Gorbachev not only knew exactly where he wanted to go, but even announced his goal ­-- albeit not directly and unreservedly: the reintroduction of private ownership of the means of production! (See section IV).

But even before that speech -- to which Pirker does refers to in the last paragraph of his article under the heading “Enrich yourselves!” (JW of 28.02) -- the “Individual Activity Act” and the “Law on Co-operatives” had been approved in December 1986, and these Pirker, astonishingly, comments as follows: “It is difficult to say whether it was theoretical confusion or whether there was already an intention to destroy social property.”

How are such doubts possible when Gorbachev himself leaves no room for them in his statements either in Der Spiegel or in the speech in Ankara? Gorbachev's answer to the question in Der Spiegel's 1993 interview of whether he was still communist: "If you consider my statements, then it will be clear to you that my political sympathies belong to social democracy and to the idea of ​​a social state of the sort of Federal Republic of Germany."

And Gorbachev in Ankara in 1999: "When I personally came to know the West, I realized that I could not give up on the defined goal. And to be achieved, I needed to replace the entire leadership of the CPSU and the USSR, as well as the leadership in all socialist countries. My ideal at the time was the way of the social-democrat countries. "

Hasn’t Pirker found here every reason to be thankful to Gorbachev for having removed from him all doubts concerning his goals and motives? Apparently, not! He clearly wants to keep those doubts, and in addition he wants his readers to share them too: "One should", he writes, "protect Mikhail Sergeyevich from self-defamation of having conspired against socialism."

How is that? Pirker adds: Gorbachev "probably had no plan at the time. When the failure of the socialist renewal project was foreseeable, he let things run the way they were running."

Communists such as Rolf Vellay did not need any confession from Gorbachev, such as the cited ones, to recognize him as a conscious enemy of socialism. At the so-called Perestroika Conference of the DKP at the Frankfurt IMSF in 1987 Vellay stated clairvoyantly: "Gorbachev, the General Secretary -- is the counter-revolution at the head of the CPSU! Gorbachev, the president of the USSR -- is the end of socialism in the Soviet Union! The ‘New thinking’ -- is the paralysis of the revolutionary content of the world communist movement." (Rolf Vellay, Selected essays, letters and lectures, Issue 83, Berlin, May 2002, Schriftenreihe fur marxistische-leninistische Bildung der KPD).

How can it be explained that a Werner Pirker, whom the readers of the Junge Welt have known for years as an insightful analyst of imperialist machinations, is not only struggling to recognize the truth in the cases of Khrushchev and Gorbachev, but he declares the truth as not existing though it stands clearly in the day light? The answer is simple enough: Pirker "knows it" since long and also let us know it right at the beginning of the article: "The CPSU was not liquidated by the attack of enemy forces, but was a victim of itself."

If the facts contradict him, too bad for the facts! Since the CPSU, according to Pirker's decision, was not liquidated but liquidated itself, Gorbachev's confessions can only be inventions, at best a “self-defamation”, from which we must protect him...

The strange closing of eyes of Pirker, regarding long-established facts, is grounded in the fact that for him as for all anti-Leninists before him -- from Kautsky, through Trotsky and Tito to Gysi, Brie and Bisky -- the “Soviet system” founded by Lenin and consolidated by Stalin, the “Soviet model”, “the Leninist model of power and party”, “the state socialism”, “the bureaucratic system of command”, contained from the outset the germ of death and was necessarily doomed to fail, sooner or later, to "destroy itself." In this opinion, he finds himself in an astonishing agreement with Robert Steigerwald. Steigerwald says, similarly to Pirker: "The main cause of the historical decline is therefore the type of organization ... The Gorbachev group was confronted with this constellation of blind alleys. Today, their most important representatives boast that they initiated the path of destruction of the Soviet Union consciously and with credits taken from the social-democracy. I even think that what they invent is humbug, in order to portray their fiasco as their merit and portray them in the West as the dear children." (Robert Steigerwald, Kommunistische Stand- und Streitpunkte, GNN Verlag, Schkeuditz, 2002, p.34 ff.)

The consequence of such interpretations is the conclusion: there is nothing to learn from this model of socialism, except – how not to do it! The dire consequences of such a view must be studied, among other things, on the fate of the French and Austrian Communist Party and on the draft program of the DKP.

We asked in the headline: Why this comeback to the "onion Gorbachev?" The answer is: if the only consistent anti-imperialist newspaper in Germany and one of its most valued collaborators so clearly indicate that they are in need of help in the field of historical-materialistic analysis of historical facts, then anyone who can contribute to it should not deprive them and their readers from it.

Notas | Notes

[9] As citações do discurso de M.S. Gorbatchov perante o Conselho da Europa foram cotejadas com a versão em francês (www.ena.lu/discours_mikhail_gorbatchev_conseil_europe_strasbourg_juillet_1989-010003958.html) e com a tradução portuguesa de extractos incluídos no livro 50 Anos de Europa, os grandes textos da construção europeia, 2.ª edição revista e aumentada, publicação do Gabinete em Portugal do Parlamento Europeu, Novembro de 2010, pp. 202-205. (N. Ed.)
Quotations of M.S. Gorbachev's speech to the Council of Europe were compared with the French version (www.ena.lu/discours_mikhail_gorbatchev_conseil_europe_strasbourg_juillet_1989-010003958.html) and with the Portuguese translation of extracts included in the book 50 Years of Europe, the great texts of the European construction, 2nd revised and enlarged edition, publication of the Office in Portugal of the European Parliament, November 2010, pp. 202-205. (N. Ed.)

[10] Imre Nagy foi o líder revisionista húngaro que, conluiado com os serviços secretos imperialistas, lançou a jornada contra-revolucionária na Hungria em 1956, durante a qual gangues reaccionários torturaram e massacraram das formas mais cruéis largas centenas de comunistas. A orgia de «terror branco» desenrolou-se à vista e sem intervenção de tropas russas – um pequeno contingente que estava aí estacionado -- que tinham ordens do revisionista Khrushchev de não intervir. Só quando a contra-revolução se tornou incómoda para o próprio Khrushchev, foram dadas ordens às tropas russas de, em conjunto com parte sadia do exército húngaro, impedir e reprimir os desmandos contra-revolucionários.
Imre Nagy was the Hungarian revisionist leader who, in accord with the imperialist secret services, launched the counterrevolutionary round in Hungary in 1956, during which reactionary gangs tortured and massacred in vicious ways many hundreds of communists. The "white terror" orgy unfolded in sight and without the intervention of Russian troops - a small contingent that was stationed there - who had orders from the revisionist Khrushchev not to intervene. Only when the counterrevolution had become uncomfortable for Khrushchev himself did he give orders to the Russian troops of, together with a healthy part of the Hungarian army, preventing and suppressing the counterrevolutionary attacks.

[11] Designemos por RO e RDB respectivamente a «Revolução de Outubro» e «república democrático-burguesa».
Sejam: P a proposição «RO não foi um erro» e Q a proposição «alternativa a RO = RDB».
Então, a afirmação de Gorbachev corresponde a: P <--> não Q, onde o operador bicondicional <--> significa «se e só se» ou «é equivalente a».
Ora, aplicando o operador de negação à afirmação bicondicional, obtém-se a afirmação derivada equivalente: não P <--> Q, que é precisamente aquela que, correctamente, Kurt Gossweiler deriva.
Let us denote by OR and BDR respectively “October Revolution” and “bourgeois-democratic republic”.
Let P be the proposition “OR was not an error” and Q the proposition “alternative to OR = BDR”.
Then, Gorbachev's statement corresponds to: P <--> (not Q), where the biconditional operator <--> means "if and only if" or "is equivalent to".
Now, by applying the negation operator to the biconditional assertion, one derives the equivalent derived assertion: (not P) <--> Q, which is precisely the one correctly derived by Kurt Gossweiler.

[12] Tradução do russo a partir do texto publicado no jornal russo Soviétskaia Rossía, 17.08.2000, que cita como fonte o jornal eslovaco USVIT, n.º 24 de 1999. (http://www.sovross.ru /modules.php?name= News&file=article&sid=58241). (N. Ed.)

[13] Suplemento aquando da republicação de «As várias cascas da cebola Gorbatchev». Original em http://www.kurt-gossweiler.de/artikel/browder.htm (N. Ed.)
Supplement when of the republishing of 'The various layers of the onion Gorbatchev'. Original at http: //www.kurt-gossweiler.de/artikel/browder.htm (N. Ed.)