Vários eventos e
desenvolvimentos de 2016 chamam a atenção para três temas:
Desigualdade social
Todos os anos o Crédit
Suisse publica um relatório sobre a distribuição da riqueza mundial pela
população adulta (elaborado por três especialistas que já faziam isso na ONU).
O relatório de 2016 revela um quadro impressionante:
-- Os 1% do topo têm 51% da riqueza mundial; os 50% de baixo têm 1%.
-- Os 10% do topo têm 89%
da riqueza. Basta ter 72 mil euros de riqueza (sem dívidas) para pertencer aos
10% do topo. Para pertencer aos 50% de baixo é porque tem menos de 3.395 euros (sem
dívidas).
-- Embora a maioria dos
pobres se concentrem na Índia, África e países asiáticos pobres, há números
elevados de pobres na Europa e América do Norte, com respectivamente 34% nos
50% de baixo e 9% nos 20% de baixo. A grande maioria destes não tem riqueza,
mas só dívidas.
-- A desigualdade social
a nível mundial não pára de aumentar. No relatório de 2015 os 1% do topo tinham
48% da riqueza. O Banco Mundial (BM) bem declara como objectivo o combate à
pobreza. Mas onde ele e o seu apêndice FMI penetram a pobreza e desigualdade social
só aumentam. E não vale a pena BM-FMI deitarem as culpas a governos porque
todos eles são do agrado ou mesmo inspirados/instalados,
activamente/militarmente, pela casa-mãe: a administração dos EUA.
-- Em Portugal a
desigualdade social tem aumentado, conforme já referimos em outros artigos. Em
2016 era noticiado que a crise obrigou 9% das famílias a cortar comida aos
filhos e os sem-abrigo têm aumentado. Entretanto, há mais milionários e
bilionários e os salários dos gestores não param de aumentar.
Extrema-direita cresce
A extrema-direita tem
vindo a crescer, particularmente na Europa e na América do Norte.
-- Os partidos populistas
de extrema-direita têm vindo a crescer de forma significativa na Europa: França
(FN de M. le Pen), Itália (Força Itália, Partido 5 Estrelas, etc.), Alemanha (Alternativa,
PDN recentemente permitido pelo Supremo Tribunal apesar da sua doutrina nazi), Áustria (FPO, esteve quase a conquistar a presidência em 2016), Holanda
(Partido da Liberdade de Wilders, um dos mais votados), Suécia (Democratas Suecos), Dinamarca (DPP),
Hungria (Fidez no governo, e o Jobbik, 3.º mais votado e declaradamente nazi e
anti-semita), Polónia (PiS, PPP), etc.
-- Na América do Norte,
como se sabe, venceu um candidato da direita populista. A "doutrina" de Trump e
sua equipa parecem-se muito com a da extrema-direita populista europeia.
– Não nos enganemos com
os partidos de direita que têm tido uma posição doutrinária mais “soft”. Quando
tocar a reunir e na ausência de uma esquerda hábil e forte iremos encontrá-los
de braço dado com a extrema-direita, conforme a História já demonstrou. Eis um exemplo
recente: a Rússia (que apesar do seu actual capitalismo predador teve um
passado forte de luta contra o nazismo, é aliada de países com esse passado, e
tem uma esquerda forte) apresentou na ONU, no passado Novembro, uma proposta de
resolução advogando:
“Combater a glorificação
do nazismo, neo-nazismo e outras práticas que contribuem para alimentar formas
contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia, e a intolerância
que com elas se relaciona”.
A resolução foi aprovada
com 131 votos a favor. Mas teve votos contra dos EUA e da Ucrânia (e do Palau)!
E – pasme-se – 48 abstenções que incluíram todos os países europeus excepto a
Sérvia e a Bielorússia! Incluindo a abstenção da “socialista” França onde
também existe agora um novo partido social-democrata que se chama Partido
Comunista Francês.
- Vêm-se agravando os
ataques às liberdades democráticas na Europa e na América do Norte. Cargas
violentas sobre manifestações pacíficas, proibições de manifestações
(nomeadamente quando os trabalhadores lutam por manter os seus direitos, como
aconteceu em França), infracções à liberdade de expressão (múltiplos exemplos,
a que não escapam as universidades: em 2015 a biblioteca da Sorbonne proibiu a
aquisição de um livro de um historiador só porque ele defendia a condução por
Estaline da luta da URSS contra o nazismo na 2.ª GM), proibições de emprego de
comunistas (proibições às claras ou encapotadamente), re-escrita da história
incensando o papel de fascistas, etc.
- Portugal tem, no
essencial, escapado a este contágio. Mas não se deve deixar de estar atento ao
fenómeno. Pensamos ser preocupante a forma como nos últimos vinte anos (aproximadamente)
as populações idosas têm sido massacradas e sobressaltadas: pensões de miséria,
centros de saúde fechados implicando em enormes deslocações na procura de
cuidados; aumento geral da burocracia; declarações de impostos que obrigam a
ter internet (como se os idosos,
nomeadamente do interior, a tivessem! Não haja dúvida, com pensões de miséria
iam agora comprar computadores e estudar informática) ou a pagar a contabilista,
diminuição efectiva de descontos no IRS (p. ex., o cônjuge sem pensão de um
casal idoso, não tem agora, com a declaração individual, como declarar as suas
despesas de saúde), etc. Nos últimos vinte anos cada nova notícia para um idoso
é uma má notícia. Daí a tendência para desprezar a “democracia” existente, os
«políticos» e «partidos», e aspirar por um salvador. Quanto a nós, PCP e BES
não têm dedicado atenção eficiente a
este problema de uma larga camada da população portuguesa e que está em
crescimento.
-- Note-se que enquanto a
extrema-direita cresce e entra em coligações, aproximando-se cada vez mais do
poder e influenciando as decisões da direita menos radical (um exemplo recente:
o PM holandês do partido de direita VVD - uma espécie de PSD - ameaçado pelo
crescimento da extrema-direita de Wilders, a 2 meses das eleições, começou a usar
a conversa da extrema-direita contra os emigrantes), a esquerda consequente
está estagnada e fragmentada. Parece-nos que a formação de múltiplos “Gran Polo
Patriótico”, como na Venezuela, poderia ter um impacto positivo.
-- Note-se que também há
trabalhadores atraídos pela extrema-direita. Os trabalhadores só adquirem
consciência de classe e consciência política se tiverem condições para isso. Para
uma análise do populismo de extrema-direita e aspectos relacionados com isso tem
interesse ler: http://zzs-blg.blogspot.pt/2017/01/tracking-trump.html
Venezuela
Em 2016, apesar da
situação muito difícil que teve de enfrentar – oposição dominando a Assembleia
Nacional, guerra económica apoiada pelos EUA, a maior seca desde 1950 – o
governo de Nicolás Maduro conseguiu não só suster os ataques ferozes da contra-revolução
mas começar a inverter a situação, inclusive no plano económico. Um artigo de
um comentarista da Telesur apresenta de forma factual e concisa as 10 grandes
vitórias de Nicolás Maduro em 2016. A tradução em português deste importante artigo está disponível em https://pcb.org.br/portal2/13286
Entre as vitórias, é de
assinalar: o desfazer, por meios legais, as urdiduras da contra-revolução; o
ter impedido a Organização dos Estados Americanos, controlada pelos EUA, de
condenar a Venezuela; a taxa recorde de investimento social de 71,4% do
orçamento nacional (nenhum outro Estado do mundo gasta quase três quartos do
seu orçamento em investimento social); a “Misión Vivienda” que em 2016 entregou
359 mil habitações (a França, p. ex., apenas construiu 109 mil habitações
sociais em 2015); o sucesso do acordo entre os países da OPEP e NÃO OPEP para
uma redução concertada das exportações de petróleo, o que irá contribuir para
que a Venezuela obtenha um maior rendimento do petróleo; implementação de
medidas para aumentar a produção, nomeadamente de alimentos, tornando o país
menos dependente do petróleo.
Conforme justamente
assinala o artigo “… durante o ano, o mais duro e o mais longo, durante o qual
muitos apostaram no seu fracasso, o Presidente Nicolás Maduro frustrou todas as
armadilhas e todas as dificuldades, mostrou a sua excepcional dimensão de
estadista e de líder indestrutível da Revolução Bolivariana”.
Os desenvolvimentos
revolucionários da Venezuela são um grande tema da actualidade, com implicações
importantes nos ensinamentos teóricos e práticos da luta dos povos pela
libertação do jugo capitalista. Não é por acaso que os media ao serviço do capital, incluindo os de Portugal, omitem,
mentem, distorcem, ou deturpam o que se passa na Venezuela, e ridicularizam a
acção das suas figuras dirigentes. Não lhes agrada o exemplo transmitido pela
luta de um povo pela sua dignidade, soberania e contra a opressão.
Cabe à esquerda
consequente apoiar a revolução venezuelana e divulgar o que verdadeiramente aí
se passa.