Neste artigo:
O que são e não são os derivados
Derivados:
a resposta capitalista ao declínio da taxa de lucro
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O que são e não são os derivados
Nos artigos anteriores (http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/01/o-sector-financeiro-vi-jogos-com.html,
http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/01/o-sector-financeiro-vi-jogos-com_12.html,
http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/01/o-sector-financeiro-vi-jogos-com_22.html,
http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/02/o-sector-financeiro-vi-jogos-com.html) foram apresentados e caracterizados vários jogos
com derivados. Vamos resumir o que expusemos complementando a caracterização
dos pontos essenciais:
- Um derivado é um jogo de apostas sobre o valor futuro de uma variável de interesse económico (preço de activos, taxas de juros, cotações cambiais, cumprimento de obrigações, etc.).
- Existem vários tipos de derivados, mas todos eles são, actualmente, variantes dos três principais tipos que vimos nos artigos anteriores: forwards, opções e swaps. Como vimos, os «futuros» são variantes de forwards e os CDSs variantes de swaps. Todos são jogos de apostas sobre o futuro. Dissemos «actualmente» porque a especulação financeira está sempre pronta a inventar novos jogos.
- Ao contrário do que aparece muitas vezes divulgado, não é possível avaliar o risco (logo o preço) dos derivados, dado que as respectivas séries temporais não são estacionárias nem modelizáveis.
- Por isso mesmo, a fórmula de Black-Scholes para o preço das opções, que assume o modelo do passeio aleatório, não funciona e não satisfaz qualquer critério de risco mínimo. Vimos, especificamente (http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/01/o-sector-financeiro-vi-jogos-com_22.html), porque razão é impossível uma variável de «mercado livre» satisfazer as condições em que assenta a fórmula de Black-Scholes.
- Pelas razões anteriores os derivados são sempre jogos de alto risco, com possíveis perdas gigantescas a que nem escapam grandes corporações com equipas especializadas na área (embora -- claro! -- estas possam ser sempre resgatadas à custa dos contribuintes.
- Os derivados não são «mercadorias que desempenham funções monetárias», como alguns pretendem fazer crer. De facto, conforme é explicado em [41], não existe uma unidade monetária expressa em derivados; antes, a estes é atribuído um preço expresso numa qualquer moeda. Preço instável, imprevisível, dependente das mais variadas pressões especulativas. O próprio carácter transitório dos derivados torna-os inadequados como mercadorias. Conforme se afirma em [41], os «derivados são uma “medida de valor” muito instável assim como um “armazenamento de valor” muito insatisfatório».
Pululam nos media afirmações completamente erradas
e/ou mistificadoras do que são os derivados. Todas transmitindo ideias de uma
natureza respeitável, imprescindível e benéfica dos derivados. Todas levando
água ao moinho dos especuladores financeiros. Eis algumas delas que encontrámos
em portais portugueses a propósito dos swaps:
A ideia de
que um swap é um «Contrato de Gestão
de Risco Financeiro»
Não sabemos quem inventou esta «tradução» portuguesa para swaps. Ela é
mais uma das designações «respeitáveis», tão do agrado dos especuladores, para
quem os derivados são «produtos» (!) e «instrumentos»
(inócuos!). Neste
caso transmite-se a ideia absolutamente falsa de que com um swap se vai necessariamente diminuir o risco financeiro; porque, ninguém no seu
perfeito juízo, vai «contratar» uma «gestão de risco» que lhe pode acarretar
perdas bem maiores do que aquelas com que normalmente contaria.
Aliás, esta ideia inteiramente falsa é veiculada por outra designação
também em voga para os swaps ([42]):
«instrumentos financeiros de cobertura de risco», com
«cobertura» significando «protecção contra»!
A ideia dos swaps «bons» e
dos swaps «maus»
Há quem de forma ingénua distinga entre swaps «bons» e «maus» ([43]). É como se se dissesse que jogar ao blackjack é bom e ao poker é mau. De facto, todos os swaps são «maus» se por «mau» se
entender a possibilidade de perdas elevadas. Possibilidade que existe sempre. E dizemos «possibilidade» porque
quanto à probabilidade, esta, como já explicámos, é impossível de medir.
Poder-se-á pensar que os swaps simples
são bons e os exóticos (com condições complexas cozinhadas pelos «grandes») são
maus. Mas nem mesmo esta caracterização tem grande utilidade prática. Na
realidade, é perfeitamente possível que um swap
simples incorra em perdas mais elevadas do que um exótico. Exceptuam-se os
casos de fraude pura, quando, por exemplo, um dos contratantes já sabe de
antemão que um determinado evento vai acontecer ou uma fórmula de spread funciona «infernalmente» a seu
favor (ver nosso artigo anterior).
A ideia de que só alguns contratos de derivados são jogos especulativos
Numa condenação do Santander
Totta num contrato swap, foi
noticiado ([44]) que o tribunal tomou essa decisão por o considerar «um
contrato especulativo, um contrato de jogo, um contrato ilícito e, portanto,
nulo». Mas, caros senhores, não é só «este» que é especulativo, que é um jogo. Todos os contratos com derivados são jogos
especulativos (mais sobre este assunto abaixo). Deveriam então todos ser
proibidos e declarados ilícitos e nulos.
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ)
também sentenciou que os contratos swap
são anuláveis se houver uma alteração «anormal» das circunstâncias que se
verificavam aquando da sua celebração, nomeadamente ao nível das taxas de juro.
O que é uma alteração «anormal» das circunstâncias que se verificavam aquando
da celebração, nomeadamente ao nível das taxas de juro? O STJ não definiu. Pela
boa razão de que não é definível. A definição de «anormalidade» repousa por
enquanto, intocada e intocável, nos cérebros do STJ. Mas, caros senhores,
receio muito que vireis a encontrar que por cada alteração «anormal» das
circunstâncias há imensas alterações «normais» de consequências ainda mais
sinistras. De facto, todo o «anormal» no «mercado livre» é «normal», dado que o
«mercado livre», o sistema económico capitalista é um sistema caótico.
Claramente as sumidades da
justiça burguesa de Portugal, defensoras por definição da liberdade burguesa, sentem-se «às aranhas» para lidar com os novíssimos
«inventos» da economia de mercado. De mercado livre.
A ideia de que os bancos são bons samaritanos
Há
quem transmita a ideia de que os bancos são uns compinchas, que inventaram uns
«produtos» fantásticos que resolvem os problemas de risco financeiro. Vejamos o
seguinte encadeado de ideias ([45], sublinhado nosso): «1. O contexto de taxas
de juro em 2007 e 2008 era de taxas relativamente elevadas entre os 4% e os 5,4%
[…] 2. As empresas de transporte público eram (e ainda são) operacionalmente
deficitárias […] 3. […] as empresas […] foram acumulando dívida […] Tendo em
conta os três pontos acima, contrair empréstimos com taxas entre 4,5% e 5,4%
acrescidas de um spread de crédito […]
revelava-se problemático […] É
precisamente neste contexto que entram os bancos de investimento, que poucos
anos antes (em 2004 e 2005) […] tinham desenvolvido produtos de investimento
que através da venda de opções bonificavam a taxa paga. Esta experiência de
desenvolvimento de produtos exóticos foi usada posteriormente num contexto de
taxas de juros (relativamente) elevadas, para através da venda de opções usar o
prémio da venda para financiar taxas de juro abaixo da taxa de mercado.»
A síntese
é esta: as empresas acumulavam dívidas devido a juros elevados; felizmente a
partir de 2004-2005 apareceram uns produtos exóticos que os bancos usam «para
financiar taxas de juro abaixo da taxa de mercado». Cá temos os bancos como
samaritanos. Mas há mais (para já não falar de como é que se fazia a protecção
de risco antes do invento maravilhoso dos produtos exóticos a partir de 2004-2005)
que permanece no nimbo: 1) Esses produtos maravilhosos são contratos/jogos
entre duas partes; se uma ganha a outra perde; quem é a parte que perde? 2) Se
os bancos usam esses milagrosos produtos exóticos «para financiar taxas de juro
abaixo da taxa de mercado», porque é que simplesmente não usam sempre esses produtos entendendo-se entre
eles (Libor, Euribor) para sempre
manter baixa a taxa de mercado? E isto – Oh, milagre dos milagres! – contra
todas as forças de mercado?
* * *
A identificação da natureza
de jogo de alto risco dos derivados, ao serviço de especuladores financeiros,
não é só nossa nem de agora; foi já reconhecida nos primórdios dos derivados em
1730 ([46]).
Porque razão foram os
derivados «ressuscitados» e floresceram a partir de meados dos anos setenta, na
sequência da chamada «crise do petróleo»? Porque razão grandes bancos e outros
«grandes» não temem perdas nos jogos com derivados? Antes, os incitam e
estimulam? É o que vamos agora abordar.
Derivados: a resposta capitalista ao declínio da taxa de
lucro
Formas simples de derivados foram usadas
esporadicamente no passado para fazer face ao risco de preço em transacções de
mercadorias ([47]). De facto, no sistema capitalista se as mercadorias são
produzidas sem dar lucro no mercado, a produção para o capitalista (individual
ou colectivo) não tem sentido. Suponhamos que uma firma fabrica fios de cobre,
adquirindo cada trimestre um certo volume de toneladas de cobre. A firma
contrata um peço para a venda do seu produto, preço esse que toma em conta o
preço esperado do cobre em bruto. Se este, por causas não antecipadas, subir, a
firma enfrentará uma diminuição de lucros ou até perdas. Supostamente os derivados comerciais proporcionariam uma
protecção («hedging») face a este
risco comercial. Dizemos «supostamente» porque, na realidade, nem sempre isso
acontece e há outros meios de fazer face a este risco sem recorrer aos
derivados; meios, aliás, que continuam a ser usados e que eram quase exclusivamente
usados antes da explosão dos mercados de derivados nos anos 70.
De facto, essa explosão
ocorreu no contexto do declínio da rendibilidade capitalista que marcou o fim
da época áurea do sistema capitalista do pós-guerra. Esse declínio determinou o
abandono de políticas keynesianas e o retrocesso neoliberal, com a retirada de
capitais do sector produtivo e sua migração para o sector financeiro, com
maiores lucros proporcionados por práticas especulativas (a maior parte dos
lucros bancários e de outras instituições financeiras há muito deixou de ser o
resultado de mobilização de mais valias do sector produtivo), estimuladas por
práticas de desregulamentação; lucros obtidos num tempo curto e, em larga
medida, assegurados! Em caso de perdas o Estado ao serviço do sistema tapa os
«buracos» há custa dos contribuintes, quer através de «resgates», quer de políticas
de austeridade, ou outros meios.
Portanto, os potenciais prejuízos dos jogos com
derivados não amedrontam os grandes bancos, as grandes firmas financeiras, os
grandes especuladores. O actual «capitalismo de casino» é de um casino viciado,
que por princípio nunca perde ao jogo. Em caso de prejuízos, como os
responsáveis pela actual crise, o Estado dos grandes bancos, das grandes firmas
financeiras, e dos grandes especuladores, rouba os trabalhadores para tapar os
prejuízos.
(Atenção: ao invés do que se possa pensar, usamos
aqui a palavra «roubo» sem ser como mero desabafo emocional. De facto, (a) o
retrocesso das condições de vida dos trabalhadores para níveis anteriores ao da
aplicação da «austeridade», com enorme geração de pobreza e de emigração, em
contraponto com a subida de rendimentos dos grandes capitalistas -- um desvio
brutal de rendimentos do Trabalho para o Capital -- e (b) os atropelos legais
com que os serventuários políticos do capital retiram rendimentos ao trabalho,
desmantelam serviços públicos pagos pelos trabalhadores, e atacam direitos
adquiridos pelos trabalhadores, justificam o uso da palavra. «Roubo» é aqui a
palavra exacta e racional, que traduz a realidade concreta.)
A explosão dos mercados de derivados, iniciada
nos anos setenta, teve como novidade os derivados
financeiros. O fim do sistema financeiro de Bretton Woods em 1971 (sistema que consagrava o domínio imperial
dos EUA no pós-guerra, e estabelecia, a par de outras medidas, taxas de conversão
«fixas» das principais divisas capitalistas face ao dólar e a correspondência
entre este e o padrão ouro ([48]) estimulou os derivados nos mercados forex
e nas taxas de juro, não só nos EUA (proeminentemente) como também no Japão e
na Europa. Actualmente, segundo estimativas do Bank for International Settlements (BIS, Banco de Pagamentos
Internacionais) entre 80% a 96% de todos os contratos de derivativos são
financeiros; nada têm a ver com a cobertura de risco comercial. Um novo e
substancial estímulo aos derivados financeiros foi dado pelo declínio da taxa
de lucro que antecedeu a «crise do petróleo» em 1973.
De facto, e ao contrário do que propalavam (e
ainda propalam!) as sumidades da economia capitalista, de que os derivados
contribuiriam para o equilíbrio dos mercados financeiros ([49]), a verdade é
bem diferente: a explosão dos derivados contribuiu enormemente para a
desregulação dos mercados financeiros, conforme documenta a figura abaixo
([50]):
Variação percentual da cotação
iéne-dólar anotada com introdução de derivados ([46]). "FX" designa o
mercado forex.
Há quem refira a existência de uma procura
básica de derivados com a finalidade de cobertura (protecção) de riscos, não de
especulação ([41]). Isso é um facto. Mas há que ter em conta os seguintes
aspectos:
a) O risco de flutuações de valores de
variáveis económicas sempre existiu, mesmo quando ainda não existiam derivados.
De facto, como já observámos, sempre existiram outros meios de cobertura de risco, nomeadamente: seguros,
associações mutualistas ([51]) e juros bancários normais. Quanto a este último
aspecto, lembremos o exemplo da Showa (ver http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/01/o-sector-financeiro-vi-jogos-com.html) que perdeu 1,5BY num forward
de protecção quanto à cotação do dólar quando, se tivesse apenas contado com a
taxa de juro bancária normal, teria tido uma perda de 0,724BY (duas vezes
menor). ([52].) Em suma, os derivados, ao contrário do que os neoliberais
pretendem fazer crer, não são indispensáveis à cobertura de risco.
b) Os bancos e outras instituições incitam
potenciais clientes a jogar nos derivados porque obtêm chorudos lucros com essa
jogatina (spreads, comissões,
propinas, etc.). Para tal, os bancos estão directa ou indirectamente em
contacto com firmas de especuladores, em particular com as dos chamados fundos
de cobertura (hedge funds, [53]). De
facto, como é bem assinalado em [41], os
bancos têm necessidade de especuladores e entram frequentemente em
actividades especulativas, porque sem isso seria muito difícil encontrar
clientes interessados em representar a «outra parte» de um contrato. Os especuladores desempenham precisamente o papel de
«fazedores de mercado». O entrosamento entre actividades bancárias «normais» e
actividades especulativas torna muito difícil estabelecer a linha de demarcação
entre as duas; isso mesmo reconheceu um relatório do Senado dos EUA em 2009 ([54]).
No meio disto tudo, existem os clientes-“patos” (ou outra
coisa pior) que aceitam jogar aos derivados. Como os gestores das empresas
públicas portuguesas envolvidas no caso dos swaps.
c) Para além de incitamentos a clientes,
várias fontes reconhecem que muitos bancos procuram vender derivados que lhes
são proveitosos mas maus para os clientes. Além disso, os spreads cobrados por bancos e outras corporações nas transacções
com derivados são uma fonte de lucro (de facto, bem analisado, uma fonte de
apropriação de mais-valia) de que não querem prescindir. E esses spreads podem usar fórmulas infernais
como a que mencionámos no artigo sobre o caso da Allied-Lyons com opções (http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/01/o-sector-financeiro-vi-jogos-com_12.html),
proporcionando enormes lucros aos bancos.
d) Quanto aos especuladores -- como já
dissemos, aqueles que transaccionam derivados com interesse simplesmente no jogo de flutuações de cotações ou
preços, sem qualquer interesse pelo activo em causa -- procuram obter lucros
aplicando várias estratégias e vários montantes de investimento. O investidor
normal, como seja uma empresa, é incitado a efectuar um contrato com a
motivação de cobertura de risco. Como no exemplo acima, da firma que fabrica
fios de cobre, para se proteger contra o possível aumento de preço do cobre
daqui a seis meses, digamos. O especulador está-se a marimbar para o cobre; ele
não tem de fabricar nada com cobre. Pode entrar num derivado em que aposta que
o preço de cobre vai subir, mas, se um mês depois, verificar que a tendência é
para descer, entrará noutro derivado, contrabalançante, em que a aposta é na
descida; e pode repetir isto inúmeras vezes ao longo dos mesmos seis meses.
Desta forma, uma única jogada de uma
empresa pode ser mais arriscada do que dez jogadas de um especulador; e muitas
vezes é. Por outro lado, não devemos esquecer o compadrio entre especuladores e
bancos (veja-se, p. ex., o escândalo da Goldman Sachs que mencionámos no artigo
anterior).
* *
*
Os derivados foram culpados do despoletar da
Grande Recessão de 2008, determinando a sua forma e magnitude; mas a causa por trás disso foi o declínio
da taxa de lucro. Conforme temos vindo a dizer desde o nosso primeiro
artigo, o declínio secular de taxa de lucro (segundo a lei tendencial
descoberta por Marx) incitou o capital financeiro a deslocar-se para práticas
especulativas -- apostas em flutuações de preços e outras variáveis de
significado económico -- dado que o investimento em actividades produtivas (na
economia real) deixou de ser atraente para muitos investidores e bancos. Isto
mesmo é reconhecido e extensivamente caracterizado num trabalho recente de quem
conhece bem o mercado de derivados ([41]).
Em particular, a baixa
rendibilidade do sector produtivo e as baixas taxas de juro a partir de 2001,
conduziram bancos, firmas de serviços financeiros e gestores de fundos de
cobertura a lançarem-se desesperadamente no aumento da especulação com uma
série de novos «jogos» (ABS, CDO, CDO-squared, CDS, CPDO, etc.) de «inovação
financeira» num esforço de ultrapassar regulamentos e procurar furos nas regras
existentes. Os derivados tiveram o papel de eleição nesta «inovação financeira».
Permitiram, nomeadamente, uma rápida circulação de capitais, inculcando falsas
ideias: a de que o risco era menor do que aquilo que realmente era; a de que
representavam activos reais que podiam ser usados com garantias de empréstimos;
a de que permitiam de forma imediata a contabilização de lucros.
Como acontece com todas as actividades
especulativas chega sempre um momento de ajuste de contas, quando o valor
ilusório do capital fictício surge a descoberto e a bolha se desfaz. Também neste
aspecto não é preciso ser marxista para ver que uma nova crise vem a caminho
([55]).
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Próximo
artigo:
A explosão dos mercados de derivados
Os
reguladores que finjem regular
Perdas
com derivados que deram brado
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Notas
[41] Ver em particular o artigo de Tony
Norfield (“Derivatives and Capitalist Markets: The Speculative Heart of Capital”) já referido em [38]. Tony Norfield é
professor na School of Oriental and
African Studies, University of London.
Trabalhou durante 20 anos em departamentos financeiros de bancos da City
Londrina, onde liderou equipas que transaccionavam em swaps e futuros sobre taxas de juro e valores cambiais, bem como em
opções «exóticas» para clientes tais como conglomerados não-financeiros, fundos
de pensões, fundos de cobertura, bancos centrais, etc. Obteve, assim, uma
perspectiva clara sobre as dimensões especulativas dos mercados de derivados.
[42] "O que são swaps? . O Ei explica-lhe como funcionam estes
produtos, 26/7/2013. http://ei.montepio.pt/o-que-sao-swaps/.
[43] Exemplos disto em "Dinheiro Vivo 21/6/2013"
e em "Ana Suspiro, Guia prático. Como nasceu e cresceu o monstro dos Swaps,
Jornal I, 10/8/2013".
[44] JN, por Texto da Lusa, publicado por
Lina Santos. 9/11/2013.
[45] Miguel Noronha A propósito da questão
dos swaps, 23/4/2013; http://oinsurgente.org/2013/04/23/a-proposito-da-questao-dos-swaps/
[46] A Bolsa de Arroz de Dojima-Osaka, Japão,
que iniciou a sua actividade em 1730, é considerada como o primeiro mercado de
futuros. Nessa época os mercadores de arroz (mercadoria vital no Japão)
procuravam precaver-se contra flutuações de preços, mas rapidamente a
«precaução» redundou em especulação o que motivou proibições de contratos de
futuros pelo Xógun que caracterizou, acertadamente, a especulação como um jogo:
«Chegou recentemente aos nossos ouvidos que muitas pessoas se juntam nos
armazéns grossistas de arroz, competem sobre a subida ou descida dos preços do
arroz e chamam “tsumekaeshi”
a essa prática. Alguns proprietários cobram propinas de participação [spreads, diríamos agora] a vendedores e
compradores, como se fosse um jogo de azar aos dados. Este comportamento é
escandaloso e nós proibimo-lo. Se descobrirmos que há pessoas que continuam a
praticar “tsumekaeshi” puni-las-emos bem como aos proprietários de armazéns».
A citação é de Masahiko Sugie, Theory of Speculation and
Futures Trading (Tokyo: Chikura Shobo, 1985), pp. 12–14. Consta do artigo
The Dojima Rice Market and the Origins of Futures Trading http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/69204/mod_resource/content/4/CHY%20GED_LS-%23795938-v1-Dojima_Rice_Market_Case.pdf,
que contém detalhes interessantes.
[47] O risco de preço corresponde à situação
em que o preço recebido pelo vendedor de uma mercadoria é demasiado baixo ou o
preço pedido pelo vendedor de uma outra mercadoria necessária à produção é
demasiado alto.
[48] Ver, p. ex., A Brief History of Bretton Woods System - TIME
http://content.time.com/time/business/article/0,8599,1852254,00.html#ixzz2ofmGMc4U
[49] Ben Bernanke, presidente do banco
central dos EUA, era um grande defensor desta tese. Considerava os
derivados como «instrumentos financeiros» maravilhosos que iriam acabar com as
crises.
[50] A figura é semelhante à publicada em [9]
que cita como fonte o livro de Smithson CW, Smith Jr CW, Sykes Wilford D "Managing Financial Risk", 1995. Os
cálculos são nossos mas mantivemos as anotações.
[51] Cabe aqui lembrar as associações de
comerciantes -- incluindo as do comércio marítimo -- que durante séculos se
protegeram contra tremendos riscos -- assaltos, piratarias, naufrágios, etc. --
através de práticas mutualistas: cada comerciante contribuía com uma prestação
para um fundo comum destinado a fazer face a riscos.
[52] Note-se que o declínio da taxa de juro
decorrente do declínio do sector produtivo torna a protecção bancária menor.
[53] Os fundos de cobertura (protecção) – hedge funds – começaram como fundos que
combinavam várias estratégias de investimento (vários tipos de risco) de forma
a oferecer algumas garantias de risco a investidores. Rapidamente descambaram
em fundos de vilões que se entregam a todas as práticas especulativas e de
legalidade duvidosa, enriquecendo os respectivos gestores à custa dos «patinhos».
A referência [9] é das mais moderadas quando se refere a estes fundos da
seguinte forma (tradução nossa): «hedge
funds são fundos de investimento relativamente livres de fazerem o que
querem. Relativamente desregulados (por enquanto), cobram propinas muito
elevadas e não devolvem necessariamente o seu dinheiro quando você precisa, e
geralmente não lhe dirão o que fazem.»; «Ao contrário dos fundos comuns que são
estritamente controlados quanto às estratégias de investimento simples que
legalmente podem levar a cabo, bem como quanto às comissões de gestores e
requisitos de reporte a que são obrigados, os hedge funds podem levar a cabo estratégias complexas que incluem
empréstimos elevados, o uso de toda a espécie de derivados, vendas a
descoberto, e executar tudo isso em quase total segredo, com um mínimo de
requisitos de reporte. Não existe limite para o que os gestores dos hedge funds se podem pagar a si próprios
(15-30% dos lucros) […]»
[54] Citado em [41]; tradução nossa: «Um
recente relatório do Senado dos EUA sobre especulação também concordou que a
fronteira entre especulação e cobertura de risco é "extremamente difícil
de estabelecer, US Senate 2009, p. 54”,
referindo ainda que “Não se consegue distinguir ‘especulação’ de ‘cobertura’ inspeccionando
os dados das transacções em derivativos quer do BIS quer de transacções
individuais de mercadorias [commodity-exchanges]”».
[55] Steve Denning "Big Banks and Derivatives: Why Another Financial Crisis
Is Inevitable", 8/1/2013, Forbes. http://www.forbes.com/sites/stevedenning/2013/01/08/five-years-after-the-financial-meltdown-the-water-is-still-full-of-big-sharks/