O recente
caso BANIF, amplamente noticiado, é mais um de inúmeros exemplos do estado de
degradação a que chegou o capitalismo neoliberal nos países de «economia
[capitalista] avançada» -- EUA, Canadá, Japão e países da UE, incluindo Portugal.
O investimento produtivo nesses países tem vindo sempre a decrescer e os
salários dos trabalhadores também; mas o que tem vindo sempre a crescer é a
jogatina da especulação financeira, com a típica parafernália de ilegalidades e
negócios escuros do «capitalismo de casino». Em consequência, tem também
aumentado a desigualdade social.
Trata-se de
mais um crime económico de roubo ao povo, cujo esquema, já analisado detalhadamente
em muitos dos nossos anteriores artigos – ver o que escrevemos sobre a especulação
financeira, os jogos com derivados, os casos BPN, BCP, BPP, BES, o caso dos swaps, a evolução do capitalismo, etc.
--, é assim:
a) os
depósitos do povo comum na banca são usados, não para desenvolver a economia
real, mas sim para a especulação em valores mobiliários (acções, obrigações,
derivados) e empréstimos de risco elevado;
b) a
especulação é literalmente um jogo que permite ao grande capital realizar, a
curto prazo, lucros elevados, muito mais elevados do que aplicando os fundos
financeiros em actividades produtivas (a taxa de lucro em actividades
produtivas nas «economias avançadas» está em baixa);
c) como em
qualquer jogo, quando um ganha há outro que perde, pelo que existem sempre
protagonistas do grande capital que sofrem perdas elevadas (quando tal acontece
os activos envolvidos na jogatina passam a denominar-se de tóxicos, mas de
facto é o próprio jogo que é tóxico);
d) as perdas
do grande capital redundam em «buracos» nos bancos;
e) tais
perdas nunca preocupam os respectivos protagonistas do grande capital porque
nunca são pagas por eles – eles são demasiado grandes para ruir (too big to fail);
f) as perdas
da jogatina especulativa do grande capital são pagas pelo povo;
g) de facto,
o Estado, ao serviço do grande capital, trata de tapar os «buracos» usando o
dinheiro dos contribuintes – os famosos «resgates» --, «estabilizando» a
situação, isto é, para que um novo ciclo de roubo ao povo se reinicie em «a)». Na
realidade, o reinício representa sempre um agravamento das condições de vida do
povo porque, no processo de resgate – de salvação do grande capital --, o
Estado para poder tapar os «buracos» é «levado» a alienar activos importantes,
pagos durante anos e anos com o dinheiro dos contribuintes – as famosas
privatizações --, muitas vezes ao desbarato.
Em suma, o
Estado do grande capital defrauda o povo de múltiplas maneiras: porque as
poupanças não são devidamente investidas na produção de bens e serviços e no
apoio às famílias; porque as poupanças são usadas para pagar perdas de que o
povo não tem culpa, ao invés dos verdadeiros culpados que nunca pagam as suas
perdas, antes tratam de esconder o que possuem em paraísos fiscais; porque, ao
assumir as perdas, o Estado, além de usar dinheiro do povo, contrai dívidas que
servem de pretexto à assunção de políticas de «austeridade» e suas
consequências nos cortes salariais, de pensões, etc. (a receita alternativa de quantitative easing, agora também usada
pelo BCE, leva às mesmas consequências); porque as privatizações representam um
empobrecimento patrimonial do povo e novas formas de exploração dos
trabalhadores; porque tais políticas e privatizações estão sempre associadas à
degradação de serviços públicos. Por tudo isto, não é de admirar que a
desigualdade social tenha vindo sempre a aumentar.
O rombo
anunciado (22Dez) do Banif é de 2.255 M€ (M€ = milhões de euros) correspondendo
a fundos injectados pelo Estado para «recapitalização» (eufemismo de «tapar
buracos») do Banif entre 2007 e 2015 (489 M€ do Fundo de Resolução e 1.776 M€
directamente do Tesouro; independentemente dos nomes das fontes de fundos, eles
provêem todos dos impostos dos contribuintes. Destes 2.255 M€ só 489 M€ são classificados
como perdas com activos tóxicos, mas isto é pura prestidigitação porque o
dinheiro não se evapora; se ele saiu do Banif é porque foi para outras
paragens; incluindo as paragens do crédito malparado. A este respeito, convém
notar que o crédito malparado é quase todo consequência de empréstimos de risco
elevado a «amigos», configurando uma situação de ilícito que acompanha as
jogatinas.
O rombo do
Banif era já conhecido de Bruxelas antes de ser conhecido pelos portugueses,
razão porque Bruxelas se opôs a que o governo PSD-CDS fundisse o Banif com a
CGD. Como já vem sendo habitual, o governo PSD-CDS escondeu a situação do
Banif, e a entidade reguladora, o BdP, mais uma vez não regulou nada,
tornando-se objectivamente cúmplice do escamoteamento do governo do grande
capital.
Também, como
já vem sendo habitual, o valor inicial do rombo sofreu posteriores reavaliações
em alta. Está
agora em 3 B€ (B€ = biliões de euros; usamos bilião=mil milhões). Somando todos
os resgates bancários desde 2007, atinge-se um montante da ordem de 20 B€. Se
adicionarmos os rombos de outras malfeitorias (PPPs, swaps, «ajudas» a privatizações, etc.) e tivermos em conta os juros
da dívida pública, fica uma parte substancial desta explicada.
Só há uma
saída deste círculo vicioso como temos dito múltiplas vezes desde o início
deste blog: a nacionalização da banca sob controlo de comissões de
trabalhadores. Uma solução que já deu boas provas no passado (ver http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2015/05/a-banca-nacionalizada-em-portugal-1975.html
).
O PS aprovou
a venda do Banif ao Santander-Totta, com o custo aos contribuintes de 3 B€. A
decisão passou na AR com a abstenção generosa e conluiante do PSD e votos
contra do BE, PCP, PEV e PAN (além do CDS, por outras razões). Uma primeira
fissura no governo de «esquerda».