sexta-feira, 25 de abril de 2014

Vasco Lourenço: o 25 de Abril ao serviço do PS

No último artigo em que denunciámos a fantochada das comemorações oficiais do 25 de Abril de 1974 (http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2014/04/25-de-abril-comemoracao-da-direita.html ) denunciámos também a duplicidade de Vasco Lourenço, presidente da «Associação 25 de Abril»: por um lado, «capitão de Abril»; por outro lado, «capitão de Novembro», liquidador do «25 de Abril».
    A recente peroração de Vasco Lourenço no Largo do Carmo traz confirmações adicionais ao que nesse artigo dissemos. Confirmações adicionais que nos parece de interesse comentar.
    Note-se que o nosso interesse aqui não é o cidadão Vasco Lourenço, contra quem nada nos anima. Não questionamos as virtudes pessoais que têm sido apontadas a Vasco Lourenço. Só nos interessa aqui Vasco Lourenço enquanto representante e voz de uma corrente sociológica. A corrente que procedeu à liquidação do 25 de Abril – isto é, à liquidação de uma política anti-monopolista e anti-latifundiária dirigida ao socialismo, tal como constava do programa do MFA e das teses da oposição democrática no Congresso de Aveiro de 1973; liquidação do 25 de Abril em nome do «25 de Abril». Uma contradição fundamental e insanável.
   
    Eis algumas afirmações de Vasco Lourenço (VL) que nos suscitam comentários:
- «Os detentores do poder assumem-se, cada vez mais, como os herdeiros dos vencidos do 25 de Abril de 1974».
VL não disse «são, cada vez mais», mas sim «assumem-se, cada vez mais». Teria sido mais fácil dizer «são»; e bem mais compreensível do que dizer «assumem-se». VL, porém, esquivou-se a formulações concretas; prefere as formulações «espiritistas» sobre o que se passa nas cabeças dos actuais detentores do poder. Será esta uma questão menor, de lana caprina? Na realidade, não é. Não foi por acaso que VL disse «assumem-se» em vez de «são». É que dizer «são» levantaria de imediato a questão de saber se só os actuais detentores do poder «são». E os anteriores não foram? Não prepararam o terreno, as condições objectivas, para que os actuais fossem o que são? A resposta a estas perguntas remeteria, no final, para o que representou o 25 de Novembro e o que representaram as políticas do PS, partido amigo de VL. Resposta incómoda para VL. A afirmação de VL pode, assim, ler-se da seguinte forma: «Tudo que tem sido feito anteriormente a este governo foi feito dentro do mais puro «espírito» do 25 de Abril [a realidade objectiva da reconstituição dos monopólios e dos latifúndios, a reconstituição de um sector bancário privado omnipotente, a entrega da economia ao estrangeiro, pode, segundo VL encaixar-se nesse «espírito»]; infelizmente e apesar de um percurso brilhante desde o 25 de Novembro, “os detentores do poder assumem-se, cada vez mais, como os herdeiros dos vencidos do 25 de Abril de 1974”». É lícito perguntar: porque é que se «assumem»? Deu-lhes na veneta? E só agora é que se «assumem»? Mistério. VL aparece aqui, claramente, como representante da corrente ideológica que atribui os factos históricos a simples ideias surgidas nas cabeças de alguns figurantes, num dia em que acordaram mal dispostos, sem relação com uma realidade objectiva. Isto é, sem relação com os interesses económicos de classes sociais concretas. Admitir isso obrigaria VL a admitir que a política dos actuais dirigentes não é mais do que o corolário das políticas que têm sido seguidas desde o 25 de Novembro, ao serviço dos interesses económicos da burguesia, dessa mesma burguesia que, obviamente, teria de destruir o «concreto» do 25 de Abril. Porque com o «espírito» do 25 de Abril pode a burguesia bem. VL teria de admitir o que não lhe convém: que como construtor da aliança de classe que levou a cabo o 25 de Novembro ele (talvez sem o desejar) ajudou a construir o domínio dos «vencidos do 25 de Abril de 1974».
- «Se a nossa presença é tão desejada na Assembleia da República, tão imprescindível e tão insubstituível, não compreendemos o medo, sim o medo, de nos olharem para além da cereja em cima do bolo».
A afirmação de VL é pertinente. VL não compreende o medo. É que VL não foi suficientemente longe na análise do significado da «cereja» e do «bolo». Mais uma vez, não concretizou. VL e confrades representam a utópica «terceira via» entre o capitalismo e o socialismo, posta em letra de forma no «documento dos nove» de que VL foi co-autor; «terceira via» tão do agrado de um sector da pequena burguesia. Esse diminuto e utópico sector é a pequenina cereja, que só esperneia quando o grande e anafado «bolo» -- a grande burguesia – lhe pisa os calos (cortes nos salários de quadros da função pública, cortes nas promoções e verbas para as forças armadas, fortes restrições nos empréstimos bancários, nomeadamente às PMEs, etc.). Nessa altura a «cereja» pensa: espera aí, mas a terceira via não tinha um qualquer cheirinho de socialismo? Não será de falar nisso na AR? É claro que, por esta altura, com o «bolo» bem instalado no poder graças à antiga ajuda da cerejinha, tais elucubrações cerejais são «subversivas» além de serem de mau tom; podem, por exemplo, assustar a troika e os mercados compradores da dívida pública.
Estás a ver, cereja, de que é que o bolo tem medo?
- «Neste local simbólico que tão gratas recordações nos traz, podemos e queremos dizer, sem qualquer hesitação, que quem nos desgoverna subiu ao poder fazendo promessas que não cumpriu».
Só agora VL descobriu isso! Estranhamente, não reparou que todos os anteriores governos PS fizeram promessas que não cumpriram. Bem como os do PSD e CDS. Exceptuam-se aqueles breves governos de Nobre da Costa e Mota Pinto que só prometeram medidas de direita e cumpriram.
- «Temos de nos mobilizar a fundo para pôr cobro a uma situação que seria impensável há meia dúzia de anos».
Para VL, até há meia dúzia de anos, estava tudo bem. Não notou os cortes nos direitos dos trabalhadores, as revisões de direita da Constituição, as privatizações, os despedimentos, etc. Mas que distracção! É claro que se VL fosse um de muitos trabalhadores que desde o 25 de Novembro ficou no desemprego e a arder com salários não pagos porque os patrões fugiram para o estrangeiro, se calhar estaria menos distraído.
- «Temos de ser capazes de retomar as Presidências de boa memória de Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio»
Cá está. Com Eanes, Soares e Sampaio estava tudo bem. Para VL tem estado tudo, essencialmente, bem, desde o 25 de Novembro. Sá há cerca de meia dúzia de anos para cá é que há uns quantos dirigentes que – sem necessitarem disso, apenas porque se calhar acordaram mal dsipostos – se «assumiram» como herdeiros dos vencidos do 25 de Abril. Não haverá por ai um presidente a convencê-los a «assumirem-se» de forma diferente?
«A desvergonha é tanta que, no Governo, ao mais alto nível, há até quem se atreva a falar de uma nova restauração, fazendo de conta que não sabe que o novo 1640 está mesmo a caminho com a inevitável defenestração dos Miguéis de Vasconcelos que por aí andam»
Pois. A cereja fala de grosso. Recordando a acção de denodados conspiradores; não de acções populares, claro. Que tal um novo D. Sebastião ou um Bandarra a fazer de Eanes, Soares e Sampaio de «boa memória»? Um novo presidente que ajude a pôr tudo como era dantes? Meia dúzia de anos atrás?
   
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    Vasco Lourenço permanece fiel à ideologia de um certo sector da pequena burguesia: a «terceira via», entendida não como um estado de transição rumo ao socialismo, mas sim como a concretização de um capitalismo benevolente, atento aos interesses da pequena burguesia, das «classes médias», incluindo os quadros médios das instituições públicas. Um tipo de capitalismo que no passado só existiu em alguns países durante alguns anos e que está, já de há muito, totalmente extinto.
    Aliás, toda a história da economia portuguesa desde o 25 de Novembro é uma ilustração da impossibilidade de tal tipo de capitalismo. No sector do comércio foram liquidadas milhares de lojas e pequenas empresas, substituídas por grandes grupos do comércio por grosso e a retalho (Modelo Continente, Pingo-Doce, Makro); o mesmo se verificou no sector das indústrias e dos serviços, tendo-se assistido à constituição de grandes empresas nacionais (Corticeira Amorim, Mota-Engil, Portucel), à absorção de empresas nacionais por monopólios estrangeiros (Continental Mabor), à instalação de monopólios estrangeiros (Repsol, Cepsa, Vodafone, Volkswagen Autoeuropa). Muitas empresas nacionais importantes acabaram por ser liquidadas (caso, p. ex., da Sorefame que passou para a Bombardier e, depois, para a ADtranz). Foi esse também o destino de muitas grandes empresas privatizadas; só serviram aos capitais estrangeiros enquanto estes não descobriram outras paragens com mão-de-obra mais barata e menos direitos.
    Portanto, a lógica do capitalismo, desde o 25 de Novembro, lógica neo-liberal que passa pala necessária submissão da economia portuguesa aos ditames de grandes grupos económicos estrangeiros, tem sido esta: concentração, absorção e liquidação dos pequenos, deslocalização do que já não é rentável produzir em Portugal. É uma lógica que, em declínio de rendibilidade, tem necessariamente de cortar nas despesas públicas. Tem, necessariamente, de ferir os interesses da pequena burguesia que VL representa. E enfatizamos «necessariamente» porque é determinado pela própria lógica interna do capitalismo. Enganam-se aqueles que, como VL, julgam que vão impôr ou ensinar os capitalistas de como devem praticar o capitalismo. Por isso dizemos que a «terceira via» de VL e confrades é utópica. Mas mais do que isso: sempre que proponentes da «terceira via», «socialismo democrático», «social-democracia», ou seja lá o que for que chamem, estiveram no poder, acabaram sempre por seguir a lógica do capitalismo. Sempre. Quer se chamassem PS, PSD, CDS ou outra coisa qualquer. Puseram em prática a lógica que, inelutavelmente, nos conduziu onde estamos.
    Portanto, VL, nestes anos todos não aprendeu nada. A realidade concreta da história, a análise dos factos materiais, não lhe permitiu ir, nas suas concepções, para além dos quadros de referência habituais da classe a que pertence.
   
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    No último artigo recordávamos:
«[Na manifestação contra-revolucionária de Outubro de 1975] lá estava o Mário Soares [...]; noutras janelas, elementos do (ou afectos ao) «Grupo dos 9», como Vasco Lourenço; na manifestação, os «socialistas» lado a lado com grandes «revolucionários» esquerdistas, como os da FEC-ml, gritando a plenos pulmões «Vasco só há um, o Lourenço e mais nenhum!».
   
    Quanto à manifestação no Largo do Carmo, lemos no jornal:
«Na presença de Mário Soares [...] fortemente ovacionado à chegada, Vasco Lourenço declara: "Temos de ser capazes de retomar as Presidências de boa memória de Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio". Na assistência estavam ainda Maria Barroso, Vítor Ramalho, João Semedo, Arnaldo Matos, Marisa Matias e Júlio Isidro.»
   
    Em resumo, voltamos a encontrar os mesmos socialistas e seus aliados: o BE, consciência de esquerda do PS (o grilo do Pinóquio), e Arnaldo Matos, o antigo dirigente do MRPP conhecido em 1975 por «o grande educador do povo» (esta a designação informal; o título oficial era «grande dirigente e educador do proletariado português»). MRPP que também esteve presente citada manifestação de Outubro de 1975.
    O mesmos figurantes e as mesmas ideias. Ao serviço da campanha para guindar o PS ao poder. Ao serviço do embuste do povo. O 25 de Abril com cara de 25 de Novembro. O cheiro a bolor é insuportável.

domingo, 6 de abril de 2014

25 de Abril: a comemoração da Direita

Está em curso mais uma repetição da fantochada das comemorações oficiais do 25 de Abril. Fantochada organizada pela Direita. Este ano com o governo a gastar da ordem de 300 mil euros, cerca de três vezes mais do que em qualquer dos últimos dez anos. Um governo que, como os anteriores desde 25 de Novembro de 1975, e ainda mais que os anteriores é, em tudo, anti-«25 de Abril».
    Como se chegou a este paradoxo?
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    Sejamos claros: a revolução do 25 de Abril durou 1 ano, 4 meses e 25 dias. Neste curto período de tempo foram desmanteladas as instituições fascistas e construídas as de um Estado democrático, foi terminada a guerra colonial e desenrolado o processo que conduziu à independência oficial das ex-colónias, levada a cabo a Reforma Agrária na zona de latifúndio, efectuadas nacionalizações da banca e de muitas empresas importantes, construídas organizações de base como comissões de trabalhadores nas empresas e comissões de moradores nas autarquias, lançadas as sementes de um processo socializante único na Europa ocidental. E, apesar desse processo intenso, dizia um jornal americano que, surpreendentemente, a economia portuguesa estava em bom estado...
    Em 19 de Setembro de 1975 caía o quinto governo provisório encabeçado por Vasco Gonçalves. Caía o último governo do 25 de Abril.
    Por essa altura, no Verão Quente de 75, o patético Otelo mandava Vasco Gonçalves «descansar», achava que o PCP ainda tinha muitas sedes para queimar, e oscilava entre ser o «Fidel da Europa» ou o embaixador do «socialismo» sueco. No que lhe competia fazer, não fazia nada: o COPCON era apenas um tigre de papel que só mostrou os dentes contra os trabalhadores da Reforma Agrária; quanto aos bandos fascistas, por serem anti-PCP, Otelo permitia-lhes rédea solta.
    Sob tal protecção da revolução a direita do MFA, representada pelo «Grupo dos 9», iniciava um processo contra-revolucionário. Processo que, no sector civil, era liderado pelo PS em íntima colaboração com o embaixador americano Frank Carlucci, da CIA, levando pela arreata o PSD, o CDS e a extrema-direita, incluindo as forças spinolistas. O sexto governo provisório, de iniciativa da direita militar, consagrava o casamento do «Grupo dos 9» com o PS. Casamento revelado ao público na manifestação de apoio ao governo em Outubro. Pinheiro de Azevedo, o novo primeiro-ministro, arengou à multidão da janela de um edifício. Bem coladinho a ele, lá estava o Mário Soares -- o amigalhaço de Carlucci -- a dar-lhe as dicas (elas ouvem-se bem na reportagem que por misteriosas razões caiu no esquecimento dos memorialistas oficiais); noutras janelas, elementos do (ou afectos ao) «Grupo dos 9», como Vasco Lourenço; na manifestação, os «socialistas» lado a lado com grandes «revolucionários» esquerdistas, como os da FEC-ml, gritando a plenos pulmões «Vasco só há um, o Lourenço e mais nenhum!».
    Pelo sim pelo não -- não fosse o diabo tecê-las -- o casamento «Grupo dos 9»-PS-Direita-Extrema-Direita levou a cabo a provocação do 25 de Novembro, liderada no plano militar por spinolistas encabeçados por Ramalho Eanes -- aparece nas fotos da época em cima de um carro e de peitaça para a frente, em atitude de grande guerreiro vitorioso sobre o nada -- que liquidou o essencial do MFA, enviando os seus elementos consequentes para a prisão, e impôs, assim, um fim definitivo ao 25 de Abril. Vasco «o Lourenço», um dos liquidadores do 25 de Abril, é o actual presidente da «Associação 25 de Abril». Nunca vimos nem lemos dele qualquer manifestação crítica do seu papel no 25 de Novembro, na formação do sexto governo e na liquidação do MFA, pelo que nos assiste a razão em vê-lo não como o Vasco Lourenço do 25 de Abril, mas sim como Vasco «o Lourenço», personagem incensada pelo PS e restante Direita pelo seu papel na liquidação do 25 de Abril.
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    O que veio a seguir ao 25 de Novembro de 1975 foi a eliminação, por etapas, de tudo o que era «25 de Abril». A reconstituição dos monopólios e dos latifúndios. Com a participação maciça de capitais estrangeiros. Com a integração na Europa neoliberal dos monopólios e a perda quase total da nossa soberania. Em suma: PS-PSD-CDS e seus representantes na direita militar conduziram o país para o lindo estado em que nos encontramos.
    Era preciso, porém, enganar o povo. Era preciso fazer crer que o rumo de reconstituição do capitalismo monopolista e latifundiário era um rumo com a chancela do «25 de Abril». Os próprios autores do 25 de Novembro não se cansaram de clamar que o 25 de Novembro era um espécie de confirmação e «correcção de excessos» criados pelo 25 de Abril. Agora, sim, é que o povo iria ver o que era um «25 de Abril» purinho, limpinho, cheio de verdadeiro «socialismo», do «socialismo democrático» da marca Mário Soares. Pílula já na altura difícil de engolir, inclusive pelos mais desfavorecidos que instintivamente viram no 25 de Novembro a entronização de novos «senhores». Não admira, portanto, que as comemorações oficiais do 25 de Novembro sempre decorressem chochas, cada vez menos participadas, acabando por praticamente desaparecer.
    É que há coisas que ficam, ainda que atenuadas, na memória colectiva. A capacidade de determinar soberanamente o próprio destino, de construir uma vida digna com redução de desigualdades sociais, continua associada na memória do povo, na memória dos trabalhadores, ao 25 de Abril. Do 25 de Novembro só perdura o travo amargo da traição aos ideais de Abril. A traição de todos aqueles que prometeram a liquidação dos monopólios e latifúndios e não cumpriram. De todos aqueles que tinham a boca cheia de «socialismo» e se empenharam em repôr e reforçar o capitalismo. De todos os da «Europa connosco» que liquidaram o sector estatal e venderam Portugal ao capital estrangeiro. De todos os «democráticos» que em sucessivas revisões constitucionais restringiram cada vez mais a «democracia», os direitos dos trabalhadores, o direito a uma informação livre, não tutelada pelos grandes grupos económicos; dos «democráticos» que ainda hoje procuram, através de novas leis eleitorais e da «reforma estrutural do Estado», dar novas e potentes machadadas na «democracia».
    Havia, portanto, que continuar a vender a ilusão de que tudo que é feito é dentro do «espírito» do 25 de Abril. (Os da Direita são sempre muito «espiritistas».) Daí, as comemorações oficiais. Em que se empenha a Direita, não poupando despesas. Este ano, inclusive, a seta do PSD vai mudar durante as comemorações de laranja para vermelho (divulgado nos jornais)! A mensagem é esta: «O 25 de Abril não é anti-monopólios nem anti-latifúndios. Não é socialismo. Não, senhor. Não! O 25 de Abril é o que estamos a fazer: capitalismo neoliberal que rouba aos trabalhadores para dar ao grande capital. Submissão aos interesses do grande capital nacional e estrangeiro». Jardim Gonçalves e seus confrades devem estar a torcer-se de riso. Então não querem lá ver que o 25 de Abril foi feito para eles?!
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    Nas comemorações oficiais do 25 de Abril lá aparecem todos os anos umas avesinhas, da espécie esquerdinus ingenuus, a cantar comovidinhas o «povo é quem mais ordena». Coitadinhas, que não se dão conta que já há muito anos o povo não ordena nada. Coitadinhas, que não se dão conta que só estão a emprestar sustentação e respeitabilidade às teses da Direita. Por isso mesmo, estas avesinhas são observadas do alto sob o olhar enlevado dos passarões.
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    Pensamos, portanto, que só há uma forma adequada da Esquerda comemorar o 25 de Abril se quiser ser Esquerda, isto é, demarcar-se do regime de Direita instaurado com o 25 de Novembro: denunciar no parlamento e nas ruas o monumental embuste das comemorações oficiais; o embuste das comemorações da Direita que se apropriou do «25 de Abril» como mero estratagema de controlo ideológico. Comemorar nas ruas de forma independente, totalmente divorciada das comemorações oficiais, esclarecendo o povo de como foi traído, de quem o traiu, e aonde nos conduziu a traição aos ideais de Abril. Usando as palavras exactas. Todas as palavras exactas. Com bandeiras negras. O 25 de Abril morreu há muitos anos atrás. O povo, os trabalhadores, continuam de luto.
    Só assim, no nosso entender, a Esquerda ganhará o crédito popular de que não alinha em rotinas de parvoeira e está empenhada em construir um novo «25 de Abril». Totalmente novo.