5 – A «nacionalização» PS do BPN e seus custos
6 – A estranha negligência do BdP e o incrível Constâncio
7 – O inquérito parlamentar e seu esvaziamento pelo PS
8 – A reprivatização: entrega do BPN ao BIC
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5 - A «nacionalização» PS do
BPN e seus custos
A 3 de
Novembro de 2008, depois de no dia anterior José Sócrates anunciar que ia
propor à AR a nacionalização do BPN, o ministro das Finanças, Teixeira dos
Santos, veio prestar ao país esclarecimentos sobre a necessidade de
nacionalização devido ao «risco sistémico» (impedir o contágio a outros bancos
da falta de liquidez do BPN, assegurar a liquidez do BPN e proteger os
depositantes). A resposta do presidente do BPN, Miguel Cadilhe, é de que considera
a nacionalização «desproporcionada» e motivada por razões «políticas»; anuncia também
a sua saída do banco assim que a nacionalização se concretize. No mesmo dia o funcionamento
do BPN passava a ser acompanhado por dois administradores da CGD.
Teixeira
dos Santos, afirmava também, na Comissão de Orçamento e Finanças da AR, que a
nacionalização do BPN não deveria ter um impacto «significativo»
nas contas públicas e que «A nossa preocupação aqui é, de facto, fazer com
que os eventuais custos sejam mínimos e, se possível, que não haja custos para
os contribuintes que resultem desta operação» ([38]). Mais declarou que o BdP e
a CGD já tinham feito «uma injecção de liquidez» de 435 milhões de euros, um valor que disse ser «recuperável» por
corresponder a créditos, quando foi questionado sobre o dinheiro já gasto pelo
Estado e que este poderia ainda vir a gastar.
Ao
contrário do que afirmou Teixeira dos Santos a nacionalização teve (e continua a ter) um impacto brutal nas contas
públicas, na dívida pública. E o valor referido por Teixeira dos Santos ainda não foi recuperado. Terá Teixeira
dos Santos mentido conscientemente? Pensamos que não. Trata-se simplesmente da posição de classe do PS, da «costela» burguesa
dos seus membros, que os torna sempre complacentes perante os interesses da
alta burguesia. A mesma «costela» que veremos ser exibida por Vítor Constâncio.
*
* *
A 5 de
Novembro de 2008 a AR aprova a nacionalização do BPN, com os votos a favor do
PS e votos contra de todos os outros partidos. Mesmo o PSD, de onde provinha o
«bando» do BPN, votou contra! Era importante para o PSD aparecer como
«desligado do bando».
Para
entendermos o que significava esta nacionalização, regressemos ao artigo de Honório
Novo ([3]; notas e itálicos nossos):
«Ao "nacionalizar"
apenas o BPN [em vez do Grupo SLN], o Governo deixou nas mãos dos accionistas
-- alguns dos quais fortemente responsáveis pela gestão fraudulenta do BPN -- toda a parte restante do Grupo SLN. Permaneceram na posse desses accionistas
activos muito relevantes, designadamente de natureza imobiliária (por
exemplo, imóveis próximos de futuro aeroporto de Alcochete, ou em zonas
turísticas privilegiadas do Algarve, algumas referidas na mais recente campanha
eleitoral presidencial). Mesmo em contexto económico desfavorável, só estes
activos imobiliários da SLN foram avaliados em cerca 1300 milhões de euros
(recorde-se que a estimativa mais recente do Governo para o "buraco"
do BPN, a suportar por todos nós, ronda os 2100 milhões de euros, valor
mínimo).
O PCP
disse, e continua hoje a dizer, que o Governo deixou nas mãos dos accionistas
da SLN activos que poderiam e deveriam servir para evitar que a pesada factura
provocada pela acção mafiosa do "bando" do BPN vá, mais tarde ou mais
cedo, pesar tanto na bolsa dos contribuintes. […]» [Só bastante mais tarde o BE
veio a apoiar a solução proposta pelo PCP.]
«Defendemos
a nacionalização do Grupo [SLN] porque era essa a melhor forma -- como hoje é
mais evidente -- de defender o interesse público; defendemos a nacionalização
da SLN/BPN porque essa era a única forma
de impedir que os accionistas, que se tinham servido do BPN, continuassem a
beneficiar dos activos não nacionalizados do Grupo, e, simultaneamente,
ficassem livres de responder pelos prejuízos que causaram ao banco (que, no
fundo, é o que lhes garante esta "nacionalização" [PS] do BPN)»
O PS
apresentou um projecto de lei (viria a ser a Lei 62-A/2008) determinando no n.º
2 do artigo 2.º a «nacionalização de todas as acções representativas do capital
social do BPN», a cargo, portanto, dos contribuintes, sem qualquer cobertura
porporcionada pelos activos dos accionistas da SLN. Isto é, as vítimas do «bando» eram suportadas por todos nós enquanto os
membros do «bando» se ficavam a rir. E foi isso mesmo que veio a ser
aprovado pela mão do PS e do BE que votaram a favor do citado n.º e art.º,
tendo o PSD e o CDS optado pela abstenção. Só o PCP e «Os Verdes» votaram
contra.
«Todos os
que disseram não à solução de nacionalização do Grupo SLN são responsáveis
políticos -- mesmo que em graus diferenciados -- pelos prejuízos que o país vai
pagar com a solução de nacionalizar apenas os prejuízos do BPN: o Governo que
apresentou a proposta; o PS e o BE que votaram a favor da nacionalização das
acções do BPN; o PSD e o CDS, que brandiram o espantalho de uma vasta e
generalizada operação de nacionalização, para além do BPN, e se abstiveram
quanto à nacionalização de "todas as acções representativas do capital
social do BPN"; Cavaco Silva porque promulgou a Lei 62-A/2008 em tempo
record […]».
*
* *
A
Direcção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (CE) também abriu uma
investigação sobre a nacionalização do banco a 24 de Outubro de 2011 ([28]), com o objectivo de agregar toda
a informação necessária e garantir que a ajuda atribuída ao banco foi limitada
ao mínimo estritamente necessário, «no interesse de uma competição justa e dos
contribuintes portugueses». Apesar desta jesuítica bondade da CE, ela mesmo
reconhece que «não possui nesta fase a
informação necessária para tomar uma posição». A troika se tem encarregado
de tomar essa «posição», exigindo da população pobre portuguesa o pagamento dos
«buracos» abertos pelos ricos.
*
* *
Será que a
preocupação de Teixeira dos Santos era apenas a de evitar o «risco sistémico»?
Parece que não, tanto mais que o BPN representava apenas
2% de quota de mercado.
Um artigo recente da União de Reformados e Pensionistas da
Banca ([39]) vem trazer um importante esclarecimento a esta questão (itálicos
nossos): «Porque, para além da corrupção e das altas personalidades envolvidas,
o que muita gente não sabe, porque não foi divulgado, é que muito dinheiro da Segurança Social estava lá
depositado, e essa verdade não convêm a ninguém. […] »
«Os descontos que fazemos para a reforma são geridos
pela Centro Nacional de Pensões da Segurança Social ou a Caixa Geral de
Aposentações […]. Mas, como é óbvio, esse dinheiro não fica a “dormir” durante
anos para ser utilizado para pagar as pensões mais tarde. […] No caso da
Segurança Social, o dinheiro das reformas é gerido pela CGD que investe esse
dinheiro em títulos de dívida portuguesa, sendo assim a CGD um dos maior
credores do próprio Estado com um valor superior a 5 mil milhões de euros. […] Sabe-se que a CGD tinha várias contas no BPN
aproveitando os juros irreais praticados nesse banco, quanto não se sabe ao
certo, falava-se na altura em mais de 500 milhões de euros, mas talvez seja
muito mais. O BPN foi criado 1993, e em
1999 foi aberta uma ou várias contas pela CGD utilizando os fundos da Segurança
Social, sendo nessa altura José Oliveira e Costa o seu presidente e o ministro
responsável pela Segurança Social no governo Ferro Rodrigues […] Com a
gestão de um fundo de maneio de 2 mil milhões de euros, a Segurança Social
teria um depósito de cerca de 500 milhões no BPN (ou mais) o que representa 25%
de todo o fundo num banco que tinha apenas 2% de quota de mercado. Esse dinheiro investido pela Segurança
Social [1/4 de todo o fundo] foi o principal motivo da nacionalização do BPN,
um banco que custou ao Estado, segundo alguns cálculos, 8 mil milhões e que foi
vendido ao BIC por apenas 40 milhões. Esse escândalo não podia ser revelado.»
Isto é,
o «bando» locupletou-se à custa de fundos de pensões dos portugueses!
Uma
verdade que o «socialista» Teixeira dos Santos não devia e não podia deixar de
saber.
*
* *
Se em 2
de Novembro de 2008 Teixeira dos Santos falava num
«buraco» de 700 milhões de euros, esse «buraco» rapidamente disparou para
valores muito mais elevados. Já em 18 de Dezembro de 2008 as auditorias revelavam 950 milhões de euros de
perdas e imparidades ocultadas ou omitidas pelos ex-gestores. Em 3 de Fevereiro
de 2009 as perdas atingiam 1,8 mil milhões de euros, contabilizadas
as imparidades nos bancos Insular, Cayman e IFI. A estimativa do «buraco» foi
evoluindo, situando-se hoje em 8,3 mil milhões de euros (ver figura abaixo): 5%
do PIB e 11% do resgate da troika.
Concluindo:
A
nacionalização PS -- a única nacionalização na história deste partido que se
diz socialista -- descarregou sobre os bolsos dos contribuintes um enormíssimo
e crescente «buraco», resultado da actividade criminosa de um «bando» PSD,
mantendo intocáveis os activos do «bando».
Que
palmarés para o PS! Com socialistas assim está o grande capital descansado!
E já
vimos abundantemente que, de facto,
está (ver, a propósito, http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2013/06/seguro-portas-na-internacional.html
).
A evolução do «buraco». Começou com os anunciados
700 milhões de euros e já está em 8,3 mil milhões de euros.
6 - A estranha negligência do BdP e o incrível
Constâncio
Voltemos
ao já citado artigo de Honório Novo ([3]):
«Apesar
do BdP ter levantado dúvidas quanto à estrutura do Grupo SLN, a verdade é que
(apesar de problemas detectados por sucessivas inspecções do BdP, apesar das
reservas levantadas por auditorias externas às contas no ano 2000, apesar da
demissão de alguns administradores que se recusaram a assinar contas, e apesar
do BPN nunca ter indicado os destinatários finais de algumas das «empresas»
off-shore que o BdP chegou a identificar) nunca
a supervisão obrigou o Grupo a separar as suas duas áreas de actividade
(financeira e empresarial). […]
O BdP
detectou a quase totalidade destes problemas e irregularidades em diversas
inspecções. Só que tais irregularidades nunca foram eliminadas de forma
definitiva, e persistiram ao longo de toda a década de 2000. A supervisão nunca
determinou qualquer auditoria informática (que teria detectado a contabilidade
paralela do BI), nem nunca determinou qualquer auditoria externa ao Grupo
SLN/BPN feita por entidade por si indicada. Sublinhe-se que todos estes
caminhos estavam, já à altura, previstos na lei, e poderiam e deveriam ter sido
utilizados pelo BdP. Mesmo sem a utilização de medidas «extremas», também
previstas na lei (como a nomeação de administradores delegados), radica por certo na passividade da
supervisão o facto deste esquema ilegal e fraudulento se ter mantido impune e
em operação durante mais de oito anos.»
De facto,
a detecção pelo BdP de irregularidades está bem documentada ([40])
Diz ainda
Honório Novo:
«Para
além desta inaceitável passividade, recorde-se que o BdP manteve sempre uma postura de falta de colaboração com o
Parlamento, invocando sistematicamente o segredo profissional e bancário
para recusar entregar documentação e informações relevantes solicitadas pela
Comissão Parlamentar de Inquérito [CPI], não obstante as garantias de reserva
de confidencialidade e o facto da Comissão ter também como missão apurar a
forma de actuação da própria supervisão bancária.»
A isto pode
juntar-se as amnésias de Vítor Constâncio nas respostas oficiais ao PGR/DCIAP
(diz, p.ex., em 2004 que não conhece o BI e, em 2005, que não deu por nada
quanto às contas do BI já divulgadas nos media aquando da Operação Furacão).
Na CPI, onde foi ouvido a 9 e 16 de Junho de 2009, Constâncio tem algumas
frases memoráveis ([40]). Disse, p.ex., que não tinha
motivos para desconfiar do BPN, já que Oliveira e Costa tinha desempenhado
funções governativas e no próprio BdP, sendo inclusive nomeado para representar
o país no Banco Europeu de Investimento em 1991, após sair do Governo. Clara Machado, Directora-Adjunta do Departamento de Supervisão Bancária do BdP
também afirmou: «Era impensável, para mim, que conheci já há muitos anos
o Dr. Oliveira e Costa e conhecendo o percurso todo que ele teve, que houvesse
um esquema com todos estes contornos no BPN.» Isto é, para Constâncio e seus
émulos os banqueiros e pessoas «graúdas» nunca podem, por definição, cometer
ilícitos. Belos supervisores!
Outras frases memoráveis de Constâncio ([40]):
«Num sistema de organização capitalista de mercado de livre iniciativa,
há fraudes, há corrupção, há tudo isso, em todos os países e em todos os
sectores, e não há regulação e supervisores que descubram todas essas fraudes
quando elas estão a ser cometidas.»
«Não há
garantias absolutas em nenhum país e em nenhum sistema, nessa matéria, a menos
que queiram, de facto, que se constitua uma espécie de polícia de supervisão
com milhares de pessoas que se instalem ao pé de cada administração e de cada
direcção de serviço dos bancos, e de outras actividades, já agora, e que
controlem tudo. Não é esse o sistema em que vivemos, de facto, e, portanto, não
tenham ilusões de que haverá fraudes e corrupção nestas actividades, em todos
os países e também em Portugal.»
Mas,
então, se é assim, para que existem entidades supervisoras? Mais vale acabar
com a actividade supervisora do BdP, despedir Constâncios e sequazes e poupar
uns cobres. Constâncio diz-nos, ao fim e ao cabo, que o sistema capitalista
está podre. Sabemos isso. Mas diz-nos mais: que nada há a fazer, quando, de
facto, mesmo nas apertadas malhas do capitalismo, há. Quando Constâncio diz que
nada há a fazer isso é uma simples desculpabilização da sua passividade.
«Mas
também lhe quero dizer, […] olhos nos olhos, que nada me pesa na consciência,
em termos de ter cometido qualquer acto deliberado ou por omissão, que tenha
contribuído para esta situação em que se viveu no BPN, com o desfecho que é
conhecido.».
Não pesa
na consciência de Constâncio a sua atitude de passividade, objectivamente a
favor dos vilões financeiros (tudo «boa gente», claro), que está a obrigar
milhões de portugueses a ter de contribuir para pagar um «buraco» de 8,3 mil
milhões de euros. Bela consciência!
O incomodado Constâncio quando na
audição parlamentar quis passar a mensagem que no actual sistema capitalista a
negligência dos reguladores bancários é um facto normal.
Conforme
é afirmado em [40], a negligência do BdP
facilitou e protegeu o gangsterismo financeiro que tomou conta do grupo SLN/BPN.
É uma estranha negligência que só se entende, claro, como decorrente da
solidariedade de classe. E esse entendimento é ainda mais justificado quando se
sabe que Constâncio e C.ª não sofreram qualquer sanção, do regime português ou
do regime da UE; antes foram premiados!
Constâncio ascendeu a n.º 2 (vice-presidente) do BCE em 2010, «ano em que errou nas previsões macroeconómicas, falhou na regulação bancária,
ao actuar tardiamente no casos BPN e BPP, que custaram aos contibuintes
portugueses um montante superior a 9.500 milhões de euros» [41-42]. A C.ª de Constâncio continuou a gozar
de privilégios acrescidos de sultões ([43]). Quanto ao BCE
ficámos esclarecidos: são dignos candidatos a lugares cimeiros do BCE todos
que, por sua passividade, deixam livres o grande capital e seus representantes
políticos fazerem o que querem.
7 - O inquérito parlamentar
e seu esvaziamento pelo PS
Em 22 de
Novembro de 2008 o Grupo parlamentar do PS viabiliza a Comissão de Inquérito Parlamentar
(CPI). A 6 de Janeiro de 2009 a CPI sofre o primeiro contratempo: o BdP, o BPN,
as firmas de auditoria Ernest & Young, Deloitte, Bdo
Binder e PriceWaterHouseCoopers, recusam enviar documentação aos
deputados da comissão de inquérito! Todas (inclusive a entidade supervisora do Estado, BdP) invocando sigilo
profissional! (Ver mais detalhes em [44].) Em Janeiro de 2009, novos
contratempos: Oliveira e Costa e outros arguidos invocam a sua condição de
arguidos para não responder às questões dos deputados.
Um bom exemplo da farsa da representação da
soberania popular por um parlamento burguês.
O inquérito das comissões de inquérito da AR
é sempre o inquérito que a ocultação dos «podres» da burguesia consente.
*
* *
A CPI ouve
vários testemunhos que ajudam a compreender o caso BPN. Ouve também vários implicados
que demonstram uma notável «amnésia» ([45]). A maioria dos implicados, dos que
não se recusaram a responder com base no facto de o processo estar em
julgamento (casos de Oliveira e Costa e de José Caprichoso), respondeu «Não
sei», «Já não me recordo», etc. Já vimos atrás, as afirmações mentirosas e
amnésicas de Dias Loureiro. Um Dias Loureiro que a 27/1/2009 voltou a afirmar
na CPI que foi alertar o BdP sobre o «modelo de gestão» do BPN no que foi
desmentido, no dia seguinte, pelo ex-vice-governador do BdP, António Marta. Em
segunda audição, a 5/5/2009, Dias Loureiro mostrou-se amnésico quanto aos negócios em Porto Rico,
declarando que se limitou a assinar documentos.
*
* *
O
comportamento do PS na CPI foi aquele que seria de esperar de um partido que é,
de facto, de direita. Um PS que rejeitou o
recurso aos tribunais no levantamento do sigilo bancário no BPN e não se empenhou em levar ao
Tribunal da Relação de Lisboa a questão da apresentação de documentos por parte
do BdP e BPN, conforme parecer jurídico disponível na CPI.
Quanto ao relatório final, preparado pelo PS,
este foi contestado por toda a oposição no debate de 7/7/2009 na CPI. A esquerda
classificou-o como uma tentativa de branquear o papel de Vítor Constâncio
enquanto governador do BdP -- acusado de ter falhado nas suas funções de fiscalização
ao BPN.
Não nos
esqueçamos que Vítor Constâncio é um destacado militante
do PS que já foi Secretário-Geral! Ao PS também não convinha que no relatório
transparecesse algo revelador da «estranha» nacionalização do BPN por obra e
graça do PS.
O PS acabou
por aprovar sozinho as conclusões do
relatório, contra a posição de todos os restantes partidos [46].
8 - A reprivatização: entrega
do BPN ao BIC
A chamada «reprivatização» do BPN é mais um
exemplo do conluio, do favorecimento criminosso, do regime ao grande capital
financeiro.
Tratou-se de uma simples entrega de mão beijada. Vejamos porquê.
Depois de
ter incorporado o BPN na CGD, em 2008, com gestores a ganhar 17 mil euros/mês (o
presidente, Francisco Bandeira, acumulou 15.350 € de salários como vice da CGD
com 63.070 € do BPN, tornando-se o mais bem pago da Caixa, superando Faria de
Oliveira, [47]), o governo PS aprova em Novembro de 2009 a reprivatização do
BPN (diploma promulgado pelo PR em Dezembro). Em Agosto de 2010 o Governo
anuncia que o BPN será vendido no mínimo por 180 milhões de euros. Em Maio de
2011, no âmbito do memorando de entendimento com a troika, é acordada a venda
do BPN sem um preço mínimo;
prepara-se assim a venda ao desbarato. Em 31 de Julho 2011, o governo de Passos
Coelho anuncia que o BPN foi vendido ao Banco BIC Português, um banco luso-angolano
controlado por Isabel dos Santos e Américo Amorim.
Foi
vendido, não por 180 milhões de euros, mas sim por 40 milhões de euros! Em
Janeiro de 2012 é conhecido que o Governo pretende fazer um aumento de capital
de 600 milhões de euros no BPN, um valor superior aos 500 milhões de euros
previstos. Mas o BIC não está satisfeito: reclama do Estado 100 milhões
de euros em Julho de 2013 ([48]), embora o seu presidente Mira Amaral (PSD)
considere «muito positivo» o balanço do primeiro ano de integração do BPN no
BIC (pudera!), [49]; mas não se esquece de confirmar que o BIC deixa para o Estado a «responsabilidade» por «tudo o que é passado»
([50]); não vá haver algum amnésico do PS, PSD, CDS que esteja esquecido de que
segundo o acordo com o BIC este pode devolver ao Estado (a todos nós) os
créditos em incumprimento. Foram, aliás, criadas três (!) empresas públicas para gerir a «má»
herança do BPN: 4.232 milhões de lixo tóxico (capitais
fictícios quase sem valor ou de valor questionável). Portanto, o BIC comprou o BPN a «preço de
saldo» e limpo de «impurezas».
Em Maio de 2010 é também aprovada em
Assembleia Geral da SLN a mudança de nome da sociedade para Grupo Galilei. E, também aqui, o Estado (todos
nós) ficou com 300 milhões de dívida da SLN ([51]). Que se
poderia esperar de um Estado que representa os interesses do grande capital, em
especial do capital financeiro?!
Em Outubro
de 2011 a Comissão Europeia anuncia a abertura de uma «investigação aprofundada»
para determinar se a proposta de reestruturação do BPN «está em consonância»
com as regras da União Europeia em matéria de auxílios estatais. Vai descobrir,
«aprofundadamente», que está.
A Unidade
Técnica de Apoio Orçamental calcula em 1,3 por cento do PIB o impacto no défice
do custo direto da nacionalização do BPN em 2010 e 2011, um valor que supera os
1,2 por cento do PIB de impacto dos cortes nos subsídios de férias e Natal. Em Fevereiro de 2012 o PS anuncia que
vai requerer a constituição de uma comissão de inquérito ao processo de
reprivatização do BPN.
Enfim, o filme de certa forma repete-se, com
negócios lucrativos lucrativos da Galilei e da Parvalorem (uma das três empresas
públicas criada pelo Ministério das Finanças para gerir os ativos tóxicos do
banco) por Oliveira e Costa e outros donos do ex-BPN, negócios com contornos
pouco claros ([52-53]), com o Estado a arcar comprejuízos e a dar benesses de
milhões aos grandes capitalistas ([54-55]), com o governo a ignorar o pedido do Tribunal
de Contas de uma auditoria externa ao ex-BPN ([56]), com a nomeação do antigo administrador do BPN,
Franquelim Alves, para secretário de Estado do Empreendedorismo ([57-58]) e,
claro está, com a nova e inevitável comissão de inquérito, a deparar outra vez
com obstáculos à entrega de documentação por parte do BdP ([59]).
Dizia
Honório Novo no seu artigo ([3]): «[…] é
possível e perfeitamente natural […] criar um novo banco público, de pequena dimensão e actividade mais específica [HN
referia o apoio às PMEs], […] repondo no médio prazo todos os encargos e
prejuízos que o "bando" do BPN transferiu para o bolso dos
portugueses.». Sim, é possível; mas, como é comprovadamente óbvio, está totalmente
fora de ser «perfeitamente natural» para o grande capital que domina Portugal e
para os políticos que o representam.
Mas o «caso
da reprivatização» é já outro «caso», que mereceria uma análise aprofundada no tema
das privatizações levadas a cabo pelos sucessivos governos do PS, PSD e CDS, que
não foram mais do que a entrega de Portugal ao grande capital; entrega que se
tornou possível com as premissas lançadas pelo golpe contra-revolucionáro de 25
de Novembro de 1975.
É um outro
«caso», onde, para já, só vemos os «vilões do costume»; e não parece provável
que venham a aparecer claramente os «vilões oficiais».
Referências:
[38] Nacionalização do BPN não terá impacto
«significativo» nas contas públicas, Diário de Notícias, 4/11/2008. http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=1038904
[39] «A verdade escondida por trás do escândalo
do BPN», UBR (União de Reformados e Pensionistas da Banca), Economia, Notícias, 29/4/2013: http://www.ubr.pt/?m=201304
[40] «Insólitos do
Banco de Portugal no caso BPN», Esquerda.net dossier | 9 Julho, 2009.
[41] Vítor Constâncio, wikipedia.pt.
[42] «Supervisores do Banco de Portugal foram
promovidos», Diário de Notícias, 2/5/2012
.
[44] «Relatório: BPN,
BdP e auditores acusados de recusar documentos», DN, Lusa, 30/6/2009 .
[45] «Antigo administrador responde à maioria
das perguntas com "não me recordo"», Lusa 17/3/2009. http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=208694&tm=6&layout=121&visual=49
Um dos inquiridos foi Francisco Comprido
(antigo administrador do BPN), que durante algumas horas tentou «sacudir a água
do capote» com respostas vagas. Uma síntese das respostas (comentada como uma
espécie de stand-up comedy) consta de um ficheiro áudio extraído do
programa da TSF O Governo Sombra.
[46] Cristina Ferreira, «Relatório da Comissão de Inquérito ao caso BPN segue
em frente sob o fogo da oposição», Público, 08/07/2009
[47] «Governo colocou
gestores a ganhar 17 mil euros/mês», Diário de Notícias, 29/4/2012 .
[48] Cristina Ferreira «Contrato polémico do BPN leva BIC a exigir ao
Estado cerca de 100 milhões», Público,
15/07/2013.
[49] «Balanço positivo
de integração do BPN no BIC», Lusa, 29/3/2013.
[50] João Miguel Ribeiro «BPN: Mira Amaral
confirma que BIC deixa para o Estado a “responsabilidade” por “tudo o que é
passado”», PT Jornal, 15/7/2013.
[51] «Estado fica com 300 milhões de dívida da
SLN» Diário de Notícias, 3/5/2012.
[52] «BPN:
ex-donos mantêm negócios milionários», Diário de Notícias, 4/4/2013.
[53] «Saiba quem são e
que negócios têm os ex-donos do BPN», Visão, 6/4/2013.
[54] «Banco angolano
ficou com o melhor do antigo BPN», Diário de Notícias, 3/5/2012.
[55] Paula Sá, «Estado
já tem 13 mil créditos do BPN em contencioso», Diário de Notícias,
4/3/2013.
[56] «Governo ignorou Tribunal de Contas»,
Diário de Notícias, 2/5/2012.
Lusa, 2/2/2013.
[58] «BE indignado por
Cavaco Silva dar posse a ex-BPN», Lusa, 3/2/2013.
[59] «Deputados
unânimes no levantamento de sigilo do Banco de Portugal», Expresso, 20/6/2012.
Os 24 arguidos do caso BPN acusados pelo Ministério
Público em Novembro de 2009. Os arguidos não pronunciados no julgamento estão a
cinzento. Fonte: [28].
Nome
|
Cargo/profissão
|
Acusação
|
Almiro
Silva
|
Accionista da SLN
|
1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
|
António Franco
|
Administrador do BPN (entre 2006 e 2008)
|
1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
|
António Marques Cavaco1
|
Accionista da SLN
|
1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
1 crime de falsificação de documento sob a forma de cumplicidade
|
Fernando Cordeiro
|
Accionista da SLN
|
1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
|
Filipe B. do Nascimento
|
Advogado
|
1 crime de burla qualificada
1 crime de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada como autor material
|
Francisco Sanches
|
Administrador da SLN
|
2 crimes de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento
1 crime de infidelidade
1 crime de aquisição ilícita de acções
|
Hernâni Ferreira
|
Gerente da sociedade FO Imobiliária
|
1 crime de burla qualificada
|
Isabel Cardoso
|
Administradora da Planfin
|
1 crime de abuso de confiança sob a forma de cumplicidade
1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
1 crime de falsificação de documento como autora material
|
Isabel Ferreira
|
Colaboradora da Planfin
|
1 crime de abuso de confiança
1 crime de falsificação de documento
|
José Monteverde
|
Sócio de uma empresa ligada à SLN
|
1 crime de abuso de confiança sob a forma de cumplicidade
1 crime de burla qualificada
|
José Oliveira e Costa
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Presidente executivo da SLN (entre 1998 e 2008)
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1 crime de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento
1 crime de infidelidade
1 crime de branqueamento de capitais
1 crime de fraude fiscal qualificada
1 crime de aquisição ilícita de acções
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José Vaz de Mascarenhas
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Presidente do Banco Insular de Cabo Verde
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2 crimes de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento
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Leonel Mateus
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Administrador da Planfin
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1 crime de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento
1 crime de infidelidade
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Luís Caprichoso
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Administrador da SLN
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2 crimes de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento
1 crime de infidelidade
1 crime de aquisição ilícita de acções
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Luís Ferreira Alves
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Responsável da Labicer
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1 crime de burla qualificada
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Luís Reis Almeida
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Administrador da Planfin
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1 crime de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento
1 crime de infidelidade
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Manuel António Sousa2
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Accionista da SLN
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1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
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Manuel Marques Cavaco1
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Accionista da SLN
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1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
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Manuel Silva Santos
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Galerista
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1 crime de branqueamento de capitais como autor material
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Ricardo Oliveira
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Administrador da SLN
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1 crime de burla qualificada
1 crime de falsificação de documento, como autor material
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Rui Almeida Fonseca
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Accionista da SLN
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1 crime de burla qualificada sob a forma de cumplicidade
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Rui Guimarães Dias Costa
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Sócio da Labicer
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1 crime de fraude fiscal qualificada
1 crime de burla qualificada
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Telmo Belino Reis
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Sócio da Labicer
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1 crime de abuso de confiança
1 crime de burla qualificada
1 crimes de fraude fiscal qualificada
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Empresa:Labicer
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Laboratório industrial de cerâmica
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1 crime de fraude fiscal qualificada
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1Os Cavaco eram
accionistas da construtora Irmãos Cavaco. 2Manuel António Sousa é um
industrial ligado à empresa Rações Veríssimo.