No
primeiro artigo do caso BPN (http://revolucaoedemocracia.blogspot.pt/2013/11/o-sector-financeiro-v-o-caso-bpn.html
) analisámos: 1 – Preliminares; 2 – Fraudes (2.1 O esquema básico; 2.2 Alguns
casos concretos). Neste artigo vamos analisar:
2 […]
2.3
Um banco que dava milhões ao «bando»
2.4
O engodo das taxas de juro elevadas
3 – Nojeiras para todos os gostos
4 – Os processos e os arguidos
------------------------
2.3 Um banco que dava
milhões ao «bando»
«Enquanto
ao comum dos mortais eram exigidos uma pilha de documentação e garantias para
assegurar um empréstimo para a compra da casa, durante vários anos o BPN
estendeu uma passadeira vermelha a um grupo restrito de pessoas: dos processos
que decorrem nos tribunais e das auditorias realizadas nos últimos anos, percebe-se
que praticamente bastava pedir crédito» ([13]).
Para além
dos casos já mencionados de Dias Loureiro, Duarte Lima, Domurbanis, etc.,
poder-se-iam citar muitos mais casos do «bando de amigos». Um exemplo, é o de Luís Duque, advogado, vereador da Câmara
de Sintra e ex-presidente da SAD do Sporting, que recebeu do BPN deu 80 milhões
com falsas garantias bancárias; foi constituído arguido por suspeita de burla
qualificada, corrupção e fraude na obtenção do empréstimo. Outro exemplo, é o
de Arlindo de Carvalho, ex-ministro da Saúde e militante do PSD que rebeu perto
de 20 milhões de euros em operações de crédito. Noutros casos, envolvendo
empresários e advogados, o BPN forneceu créditos para carros de luxo (vários Mercedes, Porsche e Lamborghini) e um iate
ancorado em Vilamoura ([6]).
Passos
Coelho e Miguel Relvas também não estão inteiramente limpos das concessões de
créditos a amigos (ver [6]).
Mesmo já em pleno cenário de crise, o
ambiente de dissipação não cessou. Um mês após ter assumido a presidência
do BPN, Abdool Vakil tomou uma decisão que levou a um processo em tribunal com pedido
de indemnização: aumentos de ordenados para todo o conselho de administração, instruindo
os recursos humanos a transformar o salário bruto em retribuição líquida.
A auditoria
preliminar extraordinária da Deloitte concluiu, entre outras matérias, que as
perdas não reconhecidas associadas ao banco (imparidades) atingiam, a 14 de
Outubro de 2011 (quando o relatório foi entregue), 330 milhões de euros.
Eis uma
lista parcial (de 29/5/2012, [14]). Segundo a fonte, «Os valores são
indicativos e foram pesquisados na internet, em jornais (principalmente no
Diário de Noticias) e no livro "O escândalo do BPN" e completados com
a reportagem da SIC em 22/12/2012)». Quanto a nomes, a mesma fonte acrescenta que
«É possível que alguns estejam inocentes ou já tenham regularizado os créditos».
Principais
«beneficiados» pelo BPN/SLN e quantitativos «sacados» (Fonte: [14])
Nome
|
Quantitativo (milhões €)
|
Nome
|
Quantitativo (milhões €)
|
Abdul Rahman El-Assir
|
38,2
|
Invesco (off-shore)
|
17,5
|
Almerindo Duarte (Transiberica)
|
23,0
|
Jared Finance (off-shore)
|
46,6
|
Almiro Silva
|
14,1
|
Joaquim A. Coimbra (Turiton-Imobiliária)
|
11,0
|
António Coelho Marinho
|
0,7
|
Joaquim Pessoa (vendeu ao banco uma colecção de arte pré-histórica
falsa)
|
5,3
|
António J. B. Cardoso Cunha
|
8,4
|
José Augusto Rodrigues Monteverde (BIGMUNDI)
|
5,6
|
Antorini Brasil Participações
|
0,4
|
José M. G. Pereira (gerente do balcão BPN nas Amoreiras)
|
10,0
|
Aprígio J. F. Santos, presidente da Naval
|
140,0
|
José Neto (via Banco Insular)
|
4,9
|
Arlindo de Carvalho e José Neto (empresa Pousa Flores)
|
74,4
|
José Oliveira e Costa (PROGLOBO)
|
15,3
|
Arlindo de Carvalho (via Banco Insular)
|
4,9
|
José Oliveira e Costa, António Franco (ex-admin.), José Vaz de Mascarenhas
(ex-pres. do BI) e Ricardo Pinheiro (ex-dir. do Dep. de Op. do BPN)
|
222,1
|
Armando Pinto
|
0,3
|
Labicer (Empresa)
|
82
|
Boavista Futebol Clube
|
3,6
|
Luís C. Caprichoso (PLEXPART)
|
0,8
|
Capinha Lopes (arquitecto)
|
9,2
|
Luís Duque, vereador da CM de Sintra
|
80,0
|
Carlos Marques (stand SportClasse); advogados Diamantino Morais, Teresa
Rodrigues
|
100,0
|
Luís Filipe Vieira
|
20,0
|
Casa do Douro
|
26,5
|
Marbay Enterprises (off-shore)
|
4,2
|
CNE - Cimentos Nacionais e Estrangeiros
|
90,4
|
Merfield Servises (off-shore)
|
6,6
|
Dias Loureiro
|
10 a 30,0
|
Orienama Investments
|
0,7
|
Duarte Lima (empréstimo para comprar obras de arte: Miró)
|
6,0
|
Pedro Lima e Vítor Raposo (Homeland)
|
43,7
|
Duarte Lima (Homeland)
|
6,0
|
Redshield Services (off-shore)
|
12,5
|
EFISA (Banco)
|
126,0
|
Reltona Enterprises (off-shore)
|
12,6
|
Emídio Manuel Catum (PLURIPAR)
|
134,7
|
Solrac (off-shore)
|
115,1
|
Emídio Manuel Catum e Fernando Fantasia
|
72,1
|
Telmo Belino
|
3,6
|
Fernando E. Fantasia (OPI 92 e PAPREFU - imobiliárias)
|
80,8
|
Tempory Limited (off-shore)
|
3,8
|
Financial Advisory Services
|
2,4
|
Tomás Taveira (arquitecto)
|
0,8
|
Francisco Guedes e Leonel Gordo (gerente e subger. do balcão de Fátima)
|
3,6
|
Vítor Baía (Suderel- Gestão Imobiliária SA e Cleal)
|
4,0
|
Galilei
|
talvez 1000,0
|
Vitória Futebol Clube
|
7,0
|
Imobiliária Pousa Flores
|
1,6
|
Webster Worldwide Assets
|
26,8
|
|
|
Yolanda Oliveira e Costa (PROGLOBO)
|
3,4
|
TOTAL até 29/5/2012: 3.660,46
milhões
2.4 O engodo das taxas de
juro elevadas
Operações
fraudulentas no sector financeiro têm frequentemente como condimento essencial
a oferta de elevadas taxas de juro, irrealistas face aos indicadores
macroeconómicos. Isto acontece mesmo quando a fraude não implica um esquema de
pirâmide. E isto aconteceu com o BPN que também teve a sua pirâmide.
O BPN era o
banco que praticava as maiores taxas de juro em depósitos a prazo. Em Janeiro de 2008, a taxa de juro dos
depósitos a prazo a três meses praticada pelo BPN oscilava entre 3,25% a 4,75%, a partir de 500 € ([15]).
(Os valores que indicamos são sempre de taxa bruta anual.) Na CGD a taxa era de
apenas 1,8 % para depósitos
acima dos 25.000 €! E para 500 € uns míseros 0,25%. Para além disso, no BPN era possível obter, com pagamento
semestral de juros, uma taxa anual bruta de 5,10% (!) para depósitos com montantes iguais ou superiores a 2500 €. Existe o provérbio de que
«quando a esmola é muita o pobre desconfia». A ganância ou a ingenuidade não
permitiram que muitos depositantes do BPN desconfiassem. Num artigo de Janeiro de 2010 do jornal Expresso ([16]),
dizia o autor: «Numa excelente
reportagem de Susana André, na SIC, vimos os rostos e as vidas de muitos pequenos
clientes do BPN. Enganados e roubados no pouco que tinham por gente a quem
sobra dinheiro e que usou o seu talento e bons contactos para pôr em prática
esquemas engenhosos. Um padre que depositou as contribuições dos seus
paroquianos para uma obra social pergunta: "como é que um bando de
engravatados foi capaz de ficar com o dinheiro destinado aos pobres?"»
Como se a alta burguesia se interessasse por pobres!
Para além dos «normais» depósitos a prazo
ainda havia a emissão de papel comercial
da SLN-Valor, um produto financeiro subscrito nos balcões do BPN, em 2007 e
2008, com uma taxa de juro de 7%, superior à praticada nos depósitos a prazo.
Resultado: em Setembro de 2009 os subscritores do «papel comercial» ainda
estavam a arder com o dinheiro (só tinham sido liquidados os juros relativos à
primeira emissão e somente dez por cento do capital) tendo entrado com um
pedido de falência da SLN-Valor, SA, no Tribunal do Comércio de Lisboa ([17]).
Em Setembro de 2009, um grupo de trabalhadores do BPN considerando ter sido
enganado pelas anteriores administrações do banco e abandonado pela actual administração,
no que respeita à venda do papel comercial da SLN-Valor, enviou uma mensagem
electrónica aos depositantes lesados -- anonimamente «por receio de represálias»
-- dizendo: «Nunca foi nossa intenção vender-vos produtos de risco. Fomos
enganados pelas anteriores administrações e fomos abandonados por esta, que tem
administradores com muita responsabilidade em todo o problema […] Ao longo dos
últimos três meses alertámos o BdP, que nada fez, a CMVM, que nada fez, o
Governo, que nada fez, e o Presidente da República, que nada fez.» No mesmo
documento os trabalhadores demonstram, com um e-mail que lhes foi
enviado pelo administrador no final de Julho de 2008, que fizeram a venda por
solicitação das chefias (as quais equipararam o papel comercial com depósitos a
prazo) e que nunca receberam prémios pela venda destes produtos. Mostraram-se
também disponíveis a ajudar as vítimas da fraude no tribunal ([18]).
O BPN também teve a sua pirâmide. O gerente da agência do BPN das
Amoreiras, José Mário Pereira, prometia juros de 30% (!) a quem investisse nas
suas aplicações financeiras. «Como era impossível pagar aqueles juros de forma
legal, o Dr. Pereira sacava dinheiro de outras contas, daquelas contas de gente
rica que nunca são mexidas» ([6]) e de novos depositantes. O esquema durou 10
anos, deu um rombo de 10 milhões em várias contas e 1,2 milhões de lucro ao Dr.
Pereira. «Entretanto, o Dr. Pereira andou fugido durante dois anos e lá acabou
por ser preso pela PJ no ano passado [2012]. Já foi julgado? Não. Aquando da
revisão das medidas de coação, o Dr. Pereira foi libertado. Pelo que percebo, o
Dr. Pereira está livre.».
Note-se
que, já depois de nacionalizado, em Janeiro de 2009, o dirigente do BE Francisco
Louçã acusou José Sócrates de ter faltado à verdade no debate quinzenal no
Parlamento, acerca das taxas de juro praticadas pelo BPN. Sócrates tinha dito
que o BPN nacionalizado estava a praticar taxas semelhantes aos restantes,
enquanto o site do BPN anunciava taxas que eram o dobro das da CGD. Louçã disse
ainda que «o primeiro-ministro recusou a ideia de que o BPN, banco falido, está
a pagar com dinheiros públicos juros mais altos» mas, de facto, era verdade ([19]).
3 - Nojeiras para todos os
gostos
Para além das grandes linhas mestras do comportamento ilegal do «bando»
BPN/SLN, poder-se-ia encher um livro sobre o regabofe do BPN no respeitante a outras,
muitas, «actividades menores» que vão constantemente e até aos dias de hoje,
sendo reveladas: «pequenas» corrupções, tráfico de influências, burlas com activos,
facilitanços a amigos, tratamentos priveligiados em ligações perigosas, e mesmo
pura e simples libertinagem. Vamos aqui dar, apenas, uma reduzida súmula, que
fornece um bom retrato da decadência moral, cínica e despudorada, pronta para
todas as traficâncias, da classe capitalista que nos governa (uma lista
bastante exaustiva é apresentada em [6]):
Figo e Scolari pagos
através da offshore que funcionava como «saco azul» da SLN
O
ex-futebolista Figo e o treinador Scolari foram dois de muitos «amigalhaços»
que receberam centenas de milhares de euros da SLN através da offshore
Jared Finance LLC (BI), a qual funcionava como «saco azul» da SLN. A revelação
foi feita no julgamento do caso BPN por uma testemunha de acusação (um
inspector tributário) que participou na investigação. Mostrou um documento
apreendido numa busca, em que Figo e Scolari aparecem numa vasta listagem de
pagamentos feitos pela SLN através da offshore, incluindo pessoas e
empresas. A testemunha realçou que a offshore
era ainda utilizada para ocultar custos que o grupo SLN tinha mas não pretendia
revelar, entre eles um prejuízo de 180 milhões de euros apurado em 2003 e
relativo às offshores do universo SLN ([20]).
Cavaco Silva: acções
a preço de saldo e mansão em Albufeira
Cavaco
Silva e filha adquiriram acções da SLN a um preço só acessível a Oliveira e
Costa e três sociedades ligadas à SLN: 1 euro. Outros investidores
compraram-nas a 1,8 e 2,2 euros ([21]). Mais tarde, Cavaco
Silva e filha venderam as acções a Oliveira e Costa, recebendo 2,4 euros por
cada, ou seja, uma valorização de 147%, tornando-se nos investidores que viram
o seu investimento na SLN mais valorizado. Cavaco Silva teve um ganho de 147,5 mil
euros e a filha de 209,4 mil euros. É claro que o «investimento mais
valorizado» numa SLN fraudulenta e improdutiva significa, de facto, uma maior
dose de extracção do dinheiro aos incautos: os comuns depositantes e pequenos e
accionistas.
Em
Novembro de 2008, incomodado por estas notícias, Cavaco disse que «nunca
exerceu qualquer tipo de função no BPN ou em qualquer das suas empresas; nunca
recebeu qualquer remuneração do BPN ou de qualquer das suas empresas; nunca
comprou ou vendeu nada ao BPN ou a qualquer das suas empresas», omitindo a participação como accionista da
SLN.
Mais tarde,
a revista Visão revelou o negócio da compra por Cavaco
Silva de uma mansão de três pisos e piscina em Albufeira (2007). A compra,
feita por permuta de uma vivenda que já possuía em Montechoro, foi contratada
por um empresário ligado à SLN. Quando a notícia foi publicada, a escritura
pública do lote de Cavaco ainda não se encontrava na Conservatória de Albufeira
(!), tendo vindo depois a saber-se que tinha sido assinada no escritório de
Eduardo Catroga em Lisboa ([4]). Um comunicado oficial (site do PR) veio a confirmar
que Cavaco Silva só pagou Sisa depois de notificado e que foi favorecido no
negócio da permuta. As Finanças apuraram que, ao contrário do que havia sido
declarado, existia uma diferença entre os valores patrimoniais dos bens
permutados, a favor de Cavaco, claro ([22]).
Os
«estranhos» negócios entre Cavaco e a SLN foram divulgados nos media e, em particular, num artigo do
Diário de Notícias de 29 de Abril de 2012 ([23]). No dia seguinte Cavaco reage
a esse artigo com um «COMUNICADO DA PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA». Sobre o não
pagamento de imposto na permuta da casa de férias, Cavaco Silva diz estar «mesmo convencido
que pagou mais do que lhe competia pagar». Sobre as acções, esquiva-se de novo,
dizendo que não tinha ligações ao BPN, quando o que estava em causa era a compra
e venda de acções à SLN e não ao BPN. Mas diz mais (itálicos nossos): «O Prof.
Aníbal Cavaco Silva e a sua mulher, num
quadro de diversificação de riscos que
a ciência económica recomenda, têm, há muitos anos, a gestão das suas poupanças
entregue a vários bancos […] o BPN foi um dos bancos que geriu parte das
poupanças do Prof. Cavaco Silva e da sua mulher […]». Isto é, além da esquiva,
pretende justificar-se com a «diversificação de riscos que a ciência económica
recomenda». Ficamos assim a saber que, se Cavaco comprou acções a 1 euro à SLN e
depois as vendeu por 2,4 euros, fê-lo meramente por razões científicas…
«Fortes razões» para admitir que BPN
financiou PSD
No citado
artigo de Honório Novo ([3] no artigo anterior) é referido o seguinte:
«[…] O
desenvolvimento do Grupo faz-se também mercê da colaboração e/ou da contratação
de várias outras pessoas que tinham desempenhado altos cargos públicos, com
especial relevo para responsáveis dos governos de Cavaco Silva (como Dias Loureiro,
Daniel Sanches, Lencastre Bernardo, Rui Machete, Arlindo Carvalho, entre
outros). Este «chapéu-de-chuva» politicamente influente, permitia ao Grupo
SLN/BPN seguir «tranquilamente» a sua estratégia de crescimento e
diversificação, sempre suportada de forma activa por alguns dos accionistas de
referência do Grupo.»
Na
verdade, as ligações do «caso BPN» a quadros superiores do PSD são de tal
multiplicidade que mereceram a seguinte apreciação por parte do coordenador do
BE, João Semedo (30/11/2012, [24]): «Tenho fortes razões
para admitir que alguns daqueles muitos e muitos milhões que circularam entre o
BPN e a sua clientela favorita, alguns desses milhões alimentaram candidatos e
alimentaram partidos», tendo a seguir esclarecido «O partido que estava mais próximo
dessa realidade, por via dos seus antigos ministro, era o PSD, era a isso que
eu me estava a referir». Por outro lado, o Diário de Notícias descobriu 11
figuras ligadas à SLN entre os financiadores da corrida de Cavaco Silva a Belém
em 2006 ([25]).
Avião
do BPN para prostitutas
É este o título de uma notícia recente do
Correio da Manhã ([26]) onde se relata que «Óscar Silva, o economista que
Oliveira e Costa foi buscar à Credifin para fundar no Porto, em 1998, a BPN-Créditus,
esteve em Inglaterra com alguns amigos a assistir a uma prova de automobilismo
viajando no jacto privado do BPN. Para animar a viagem fez-se uma escala num
país do Leste para recolher prostitutas. […] Óscar Silva, inebriado com os
lucros fáceis que lhe permitiam fazer fortuna pessoal, reunia os parceiros da
Administração da BPN-Créditus em casas de alterne portuenses, em memoráveis
noitadas que animaram boîtes como o Calor da Noite ou a Taverna do Infante […].
A apetência de Óscar Silva pelo mundo da noite perdurou para além do términus
da sua ligação ao banco de Oliveira e Costa, adquirindo o clube de striptease
Penthouse, […] através de uma offshore
sua pertença. Óscar Silva, que não está contactável -- ausente alegadamente em
Espanha -- também tem outras ligações a sociedades offshores, como à sucursal em Portugal da Hersea Capital Corp. Ltd,
com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, que por sinal detêm quotas em duas
empresas imobiliárias do ex-administrador da Créditus: a Ediopera e a
Servilote, com sede na sua residência na zona da Foz, no Porto.»
Eis um exemplo de como são dissipadas no
sistema capitalista as mais-valias criadas pelos trabalhadores.
O Correio da Manhã relata ainda que, após uma auditoria detectar um buraco de 25 milhões de euros na BPN-Créditus,
Óscar Silva foi obrigado a sair da administração com um acordo extrajudicial.
Um dos sócios de Óscar Silva era «Benjamim Correia, conhecido no mundo da noite
como "Marcelo", irmão de Ilídio Correia morto em Miragaia, Porto,
pelo "gang da Ribeira"». Benjamim Correia «esteve […] várias vezes na
mira das autoridades, tal como os seus irmãos, por terem protagonizado
episódios de grande violência. A investigação à "Noite Branca",
iniciada pela PJ do Porto, revelou que os irmãos Correia disputavam com o grupo
da Ribeira o controlo da segurança.»
Enfim, a lumpen-burguesia de braço dado com o
lumpen-proletariado.
4 - Os processos e os arguidos
A 20 de
Novembro de 2008, na sequência de buscas efectuadas em residências de José Oliveira
e Costa ([26]), este foi constituído arguido e detido por suspeitas de burla,
branqueamento de capitais e fraude fiscal. Interrogado por um juiz do Tribunal
Central de Instrução Criminal (TCIC), o juiz decreta no dia seguinte a prisão
preventiva de Oliveira e Costa.
A 21 de
Novembro de 2008, Dias Loureiro, antigo administrador-executivo da SLN garante
desconhecer a existência do Banco Insular, bem como de irregularidades no BPN,
afirmando que pediu ao BdP «especial atenção» ao BPN em 2002 e que o seu lugar
de conselheiro de Estado estava à disposição do PR. A 22, o ex-vice governador
do BdP, António Marta, afirmou que Dias Loureiro lhe foi perguntar «por que é
que o BdP andava tão em cima do BPN» e que ele lhe respondeu que «isso tinha
que ver com o facto do banco ter uma gestão pouco transparente». Dias Loureiro
teria então dito, das pessoas à frente do BPN, que «era tudo boa gente».
A 24 de
Novembro, Vítor Constâncio garante que Dias Loureiro nunca «denunciou nada de
concreto». No mesmo dia Dias Loureiro diz que não vê «razão» para renunciar ao
cargo de Conselheiro de Estado, afirmação a que Cavaco Silva dá crédito
afirmando que Dias Loureiro lhe garantiu solenemente não ter cometido
irregularidades. Apesar da «solenidade» da «garantia», o avolumar do lixo veio
a determinar o pedido de demissão do «Conselheiro de Estado» seis meses depois
(27/5/2009).
Em Julho
de 2009, Dias Loureiro é constituído arguido e ouvido pelo DCIAP relativamente
a dois negócios, o da Biometrics e o da Redal de Marrocos. À saída, nega ter
cometido irregularidades e que só agora percebeu as implicações do negócio da
Biometrics.
Nesse mês é também constituído arguido o ex-ministro da Saúde Arlindo Carvalho e
dois administradores da sociedade Pousa Flores. Oliveira e Costa fica em prisão
domiciliária com pulseira eletrónica.
À medida
que prosseguiram as investigações o número de arguidos foi aumentando, até que
em Novembro de 2009 o Ministério Público acusa 24 arguidos no âmbito de um
processo de «corrupção e gestão danosa do BPN», o caso mais mediático
envolvendo administradores e quadros do grupo SLN (ver tabela no final, [27]). Algumas
das acusações vão-se acumulando: por exemplo, só em Novembro de 2012 o TCIC
indigitou Oliveira e Costa e mais três arguidos por falsificação de documentos
([28]).
O
julgamento começou a 15 de Dezembro de 2010, com os arguidos dispensados de
comparecer no tribunal por motivos de débil estado de saúde (Oliveira e Costa),
e motivos familiares e profissionais! ([29].) Se fosse um pobre que roubasse um
pão provavelmente não teria dispensa de comparecer no tribunal por motivos de
saúde, familiares ou profissionais. Além disso, apesar das burlas de Oliveira e
Costa terem gerado prejuízos superiores a dois biliões de euros, a juíza indeferiu o arresto de bens do
banqueiro e sua mulher.
A justiça burguesa é sempre complacente para
com os seus pares. É uma «justiça» de classe, para servir essencialmente os 1%
ou menos da população que controlam o país.
Em Outubro
de 2012 são pronunciados 16 dos 24 arguidos. O despacho de acusação dá como
provado que Oliveira Costa teve como objectivo desde 1997 desenvolver uma
«estratégia de obtenção de poder pessoal e influência […] aceitando conceder a
terceiros que com ele colaborassem, dividendos retirados do BPN, ainda que em
prejuízo do mesmo». Entretanto, Oliveira Costa recebeu uma indemnização de
quase 800 mil euros, quando abandonou a SLN e o BPN, prevendo o acordo entre a
SLN e o ex-banqueiro que Oliveira Costa receba uma pensão mensal de nove mil
euros!
Na
contestação às acusações Oliveira e Costa teve o desplante de afirmar que
queria salvaguardar o «interesse da economia nacional» e que nunca foi sua
intenção «tirar quaisquer benefícios pessoais ou para terceiros» ([11]).
*
* *
Um outro
processo instaurado pelo Ministério Público foi o do «circuito ilícito de circulação de património» entre empresas
ligadas ao BPN e ao grupo Pousa Flores, com negócios fictícios de propriedades
para encobrir prejuízos do grupo SLN/BPN. Em Julho de 2007 foram constituídos
os primeiros arguidos que vieram a perfazer um total de 5: Arlindo de Carvalho,
ex-ministro da Saúde do Governo Cavaco Silva, administrador da Sociedade Pousa
Flores; José Neto, administrador da Sociedade; Coelho Marinho, administrador do
BPN; Dias Loureiro e Oliveira e Costa.
Também aqui
deparamos com exemplos de complacência da justiça. A 8 de Julho de 2012 o
tribunal condenava o BPN a pagar a Coelho Marinho uma indemnização de 178.655
euros, além deste ficar proprietário de um Mercedes de luxo e de um complemento
da pensão de reforma de 5.000 € por mês! Coelho Marinho, ex-administrador do
BPN, arguido por ter sido um dos ex-responsáveis do banco que receberam
dinheiro da Jared Finance LLC ([30]). Ainda o julgamento não terminou e não se
sabe a pena que recairá sobre Coelho Marinho e já o tribunal lhe concede
benesses de luxo.
*
* *
O
«famoso» Dias Loureiro aparece em vários
processos do caso BPN. Para além dos já citados é arguido na venda da Plêiade à
SLN por recepção de luvas. Aparece também indigitado em processos crime
conjuntamente com Duarte Lima e Arlindo de Carvalho, em torno da compra de
acções no âmbito da SLN ([31]).
O BPN
também instaurou um processo cível contra Dias Loureiro e Oliveira e Costa, em
Outubro de 2009, por prejuízos, exigindo uma indemnização de 2,5 milhões de
euros por um negócio relacionado com uma coleção de quadros de Miró.
*
* *
Duarte
Lima, outro «famoso» PSD, antigo líder parlamentar, é detido
a 17 de Novembro de 2011, juntamente com o filho Pedro Lima, e fica a aguardar
julgamento (em prisão domiciliária, com pulseira electrónica desde Maio de 2012),
no processo relacionado com a aquisição de terrenos no concelho de Oeiras (o
«negócio da Homeland» que já mencionámos; [32]). Em causa um empréstimo do BPN de
42,995 milhões de euros à sociedade de Duarte Lima, Pedro Lima e Vítor Raposo,
tendo ficado, como garantia, o penhor das unidades de participação de Homeland,
no valor de 10 milhões de euros, e a propriedade sobre os 44,7 hectares. Isto
é, Duarte Lima e comparsas receberam mais de 40 milhões de euros do BPN
a troco de «garantias» bancárias de baixo valor. Duarte
Lima, Pedro Lima, Vítor Raposo, Francisco Canas, e os advogados João Almeida e
Paiva e Miguel Almeida e Paiva encontram-se com termo de identidade e
residência. A 20 de Março de 2013, menos de um mês antes do início do julgamento,
a Parvalorem, sociedade criada no âmbito do Ministério das Finanças para
recuperar créditos do BPN, aceitou a dação em pagamento dos terrenos. Os
terrenos no valor de 21 milhões € serviram, assim, para extinguir uma dívida de
53,5 milhões € da Homeland de Duarte Lima ao Estado! Mais uma enorme benesse do
Estado aos vilões ([33]).
O
julgamento em que Duarte Lima e mais cinco arguidos são acusados de burla
qualificada ao BPN de mais de 40 milhões de euros e de branqueamento de
capitais, abuso de confiança, falsificação e
infidelidade, decorre na 7.ª Vara Criminal de Lisboa ([34]).
*
* *
Um outro processo em curso é o dos «financiamentos fictícios do BPN»,
que surge no âmbito da
operação de combate à corrupção Rollerball. Estão em causa crimes de
burla qualificada, falsificação, fraude fiscal, corrupção e branqueamento de
capitais, com um montante envolvido na ordem dos 100 milhões de euros. Em
relação com este caso Carlos Marques, foi preso preventivamente em Outubro de
2010; após ter devolvido mais de 16 milhões de euros ao BPN passou ao regime de
prisão domiciliária. Existe um total de 8 arguidos neste processo de que se
conhecem 7: Luís Duque, vereador da Câmara de Sintra e ex-presidente da Sporting
SAD; Carlos Ortigueira, bancário; Carlos Marques, empresário do ramo
imobiliário e automóvel; Teresa Cantanhede Rodrigues, advogada; Nelson Rego, João
Sardinheiro e Diamantino Morais (mais detalhes em [28]).
*
* *
O BdP
também instaurou um processo sobre o BPN, concluído em Julho de 2012, no âmbito
do qual foram decididas contraordenações a aplicar a 23 arguidos ([35]).
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* *
Os
julgamentos dos processos instaurados pelo Ministério Público prosseguem, aos
solavancos, como é típico da «Justiça» portuguesa. Na realidade, o juiz
desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa, Rui Rangel, considerou que o sistema judicial «não está preparado para um processo com esta dimensão, que pode
arrastar-se muitos anos, pois há muitos incidentes de que as partes podem e vão
recorrer. […] a Justiça ainda não deu o salto qualitativo, pois precisa de
tempo, mais meios e mais formação para conseguir resolver casos como o do BPN.
[…] a legislação tem falhas que podem levar à prescrição.» ([36]).
Arrisquemos, sem grande risco, um
prognóstico: só daqui a muito tempo terminarão os processos e, se não
presceverem, as penas vão ser simbólicas. Entretanto, o povo trabalhador
português vai continuar a ser expoliado para pagar os saques dos vilões que se
vão manter, no essencial, nas mãos deles e de seus familiares. Para a alta
burguesia o crime compensa.
Aliás, já
se está a assistir a isto mesmo. Oliveira e Costa e outros
donos do ex-BPN continuam a controlar negócios milionários na área do
imobiliário, da saúde, do cimento e até do petróleo, através da Galilei, a
antiga SLN que mudou de nome e beneficiou de uma reestruturação da sua dívida
com o Estado ([37]). O «falido» Oliveira e Costa é o 2.º maior acionista da Galilei!
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Conclui no
próximo artigo, com:
5 – A «nacionalização» PS do BPN e
seus custos
6 – A estranha negligência do BdP e
o incrível Constâncio
7 – O inquérito parlamentar e seu
esvaziamento pelo PS
8 – A
reprivatização: entrega do BPN ao BIC
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Referências
[13] Diário de Notícias, 29/4/2012.
[16] Daniel Oliveira,
«O Futuro dos Outros», Expresso, 21/1/2010.
[17] «BPN:
Grupo de credores requer falência da SLN Valor e pede 775 mil euros», Diário
de Notícias, 24/9/2009.
[18] «Funcionários do BPN acusam actual administração
de “abandonar trabalhadores”», P Diário de Notícias, 29/09/2009.
[19] «Taxas
de juro BPN: Sócrates deu informação falsa no debate parlamentar», Esquerda.net,
16/1/2009.
[20] Notícia da Lusa, 17/03/2011.
[21] Ver artigos do Expresso de 30/5/2009 e de
8/1/2011.
[22] «Cavaco Silva confirma suspeitas de
favorecimento», esquerda.net, 2/2/2011.
[24] Luís Manuel Cabral, «"Fortes razões"
para admitir que BPN financiou PSD», Lusa, 30/11/2012.
[25] «Caras do BPN deram 130 mil para campanha do
Presidente», Diário de
Notícias, 29/4/2012.
[26] Luís Lopes, Tânia Laranjo «Avião do BPN para
prostitutas», Correio da Manhã,
11/4/2013.
[27] As buscas foram efectuadas pela Polícia
Judiciária, a Inspecção Tributária e a Guarda Fiscal.
[29] Notícia da Lusa, publicada por Ana
Meireles, de 30/11/2012.
[31] «Gestor do BPN tem pensão milionária»,
Diário de Notícias, 8/7/2012.
[32] «PGR diz que Dias Loureiro,
Duarte Lima e Arlindo Carvalho são alvo de processo», SOL/Lusa, 21/7/2012.
[33] «Duarte Lima pediu extinção de
pedido de indemnização de 54 milhões por dívida ao BPN», SOL, 19/7/2013.
[34] «Duarte Lima mantém-se em prisão domiciliária», Lusa/SOL,
19/8/2013.
[35] «Duarte Lima começa a ser julgado no caso BPN», Diário
de Notícias, 28/5/ 2013.
[35] Notícia da Lusa, 15/6/2012.
[36] «Justiça sem capacidade para lidar com caso BPN,
DN No debate sobre o "Escândalo BPN"», organizado pelo Diário de
Notícias, 4/5/2012.
[37] «BPN: ex-donos mantêm
negócios milionários», Visão, 4
Abril, 2013.