Janeiro
de 1978. Em apenas três anos e oito meses após o «25 de Abril» o PS tinha
efectuado uma viragem de 180º. Da grandiloquente vozearia a favor do marxismo,
do socialismo auto-gestionário, do «É aos trabalhadores que compete organizar a democracia» (Mário Soares
à chegada a Lisboa em 28/4/74), nada restava. O PS, tendo liderado com a CIA a
contra-revolução vitoriosa, não tinha agora o mínimo pejo em aliar-se à
extrema-direita, ao CDS, onde se acolitavam muitas figuras do salazarismo. Uma
aliança julgada impossível na altura. Quer por muitos PSs, quer pelos
comunistas aderentes da peregrina ideia da «maioria de esquerda»! (Ideia que,
contra toda a evidência -- exaustiva e esmagadora evidência -- ainda andou
lastimosamente a peregrinar por muitos anos.)
O II
Governo Constitucional tomou posse a 23 de Janeiro de 1978. Liderado por Mário
Soares, era constituído por 12 ministros do PS e 2 do CDS. Estes últimos eram
Vítor Sá Machado, Ministro dos Negócios Estrangeiros, e Basílio Horta, Ministro
do Comércio e Turismo. De facto, tinha mais um ministro do CDS: o general
Firmino Miguel, Ministro da Defesa, bem conhecido pelas suas posições
reaccionárias. Apesar de Mário Soares lhe augurar um brilhante futuro, o
governo só aguentou sete meses, tendo terminado o seu mandato a 29 de Agosto de
1978. Entre outras razões, porque a Reforma Agrária não estava a ser
desmantelada ao ritmo desejado pelo CDS.
O II
Governo Constitucional vai, como
é óbvio, continuar a destruir as conquistas da revolução, nomeadamente da
Reforma Agrária (Luís Saias do PS) e dos direitos dos trabalhadores (Maldonado
Gonelha do PS). Isto, apesar de a 26 de Janeiro Salgado Zenha, figura
proeminente do PS, dizer que o novo governo iria «fortificar a democracia».
Bela demonstração de um dos muitos significados de «democracia»
O CDS,
para além da importante pasta dos Negócios Estrangeiros, teve um papel
fiscalizador e incentivador do ritmo de destruição das conquistas da revolução.
A sua participação no governo conferiu-lhe também uma aura de respeitabilidade
«democrática»; melhor dizendo: constituiu uma afirmação de que o regime saído
da contra-revolução estava já pronto a acolher no seu seio a extrema-direita.
Ainda para mais, acolhida por um dos componentes da «maioria de esquerda»! Que
apoteose! Juntamente com o regresso dos monopólios e latifúndios, significava,
em muitos sentidos, o regresso ao 24 de Abril. Inclusive, com a ascensão de
figuras gradas do antigamente.
1978
Fevereiro
Notícia
|
Comentário
|
1/2. R.
J. Bloomfields, novo embaixador dos
EUA em Lisboa: «os comunistas não representam ameaça imediata».
|
Continuaram
(e continuam) a não representar.
|
2/2.
Soares apresenta hoje à tarde o programa do governo. Carlucci jantou com M.
Soares.
|
Carlucci
controlando se tudo está a ir bem.
|
3/2. Soares na apresentação do programa do
governo na AR: «primeiro a economia depois o socialismo».
|
Confusionismo ao gosto soarista. Aparentemente
no socialismo não haveria economia! De facto, o que Soares pretende convencer
é de que irá construir o socialismo, mas… com economia capitalista.
|
3/2. Soares na apresentação do programa do
governo na AR: «Não se trata agora de meter o socialismo na gaveta, mas de
salvar a democracia».
|
Mais confusionismo. Para Soares só há democracia
capitalista; isto é, a ditadura dos ricos. Precisamente por (e para) isso
Soares meteu o socialismo na gaveta. E temos agora a democracia dos ricos.
Nesta tirada
|
3/2.
Salgado Zenha na apresentação do programa do governo na AR, depois de dizer
que «a solução encontrada é patriótica, salutar e democrática» pretendeu
saber do secretário-geral «qual a razão porque se prosseguem os contactos
«com duas forças políticas que se opõem ao governo, encarniçadamente, quando
já existe um acordo maioritário».
|
Para
Zenha, PS-CDS é o máximo expectável de democracia.
Campinos,
Machado Rodrigues e mais 3 socialistas é que não ficaram convencidos:
abandonaram a AR.
A
solução PS-CDS também agrada aos EUA: Jimmy Carter felicita Soares.
|
13/2. Termina a discussão do programa do governo
na AR. A finalizar a sessão Salgado Zenha diz que não há partidos com
«pecados originais», daí que se justifique a aliança do PS com o CDS.
|
Para Zenha –
|
13/2. A finalizar a sessão na AR, de
apresentação do programa PS-CDS, Salgado Zenha deseja, com humor, «boa sorte»
à oposição e, voltando-se para os deputados das bancadas do PSD e do PCP
afirma «que Deus vos acompanhe!».
|
Assistimos a esta triste palhaçada, da saudação
final e teatral de Zenha. Bem ao gosto PS. Um PS que tanto gosta de se
afirmar «laico e socialista».
|
16/2. Soares ao jornal Portugal Socialista:
«se este governo falhasse nada de bom poderia vir para a esquerda».
|
A «esquerda»,
|
20/2. A Intervenção Socialista (João Cravinho,
Jorge Sampaio, Nuno Portas, Bénard da Costa, etc.) dissolve-se e adere ao PS.
|
Pois claro. Agora com o PS de braço dado com o
CDS é que o «socialismo» vai avançar.
|
20/2.
António Reis (PS): «governo já deu provas de um novo estilo de governar».
|
Sim.
Mais à direita.
|
A
destruição da Reforma Agrária continua. 10/2: no debate do programa na AR o
novo ministro da Agricultura, Luís Saias, mostrou-se disposto a aplicar a «lei
Barreto». A 21/2 a CAP defende a «lei Barreto», revelando claramente que
estrato social representa a CAP. E Barreto . A
27/2, as organizações da lavoura criam uma confederação nacional: CNA. Um
despertar muito tardio do pequeno e médio campesinato, de impacto reduzido.
A
destruição dos direitos dos trabalhadores também prossegue. A 12/2, Gonelha
clarifica: «política social determinada pela política económica»; isto é, se os
capitalistas não tiverem lucros ao seu agrado, então salários baixos e
despedimentos irão ser o «socialismo democrático» do PS-CDS. A 16/2, o governo
diz que vai actualizar pensões e salários mínimos; irão ser constantemente
«comidos» pela inflação. Também a 16/2, diz Gonelha: «temos hoje capacidade de
dar resposta a qualquer crise» e que essa «capacidade de encaixe leva-nos a
encarar com algum optimismo a guerrilha pontual [movida pelas lutas dos
trabalhadores e pela CGTP]» (nesta notícia o JN publica quatro fotos de Gonelha
em gesticulações comicamente pomposas, típicas do personagem). Contudo, o CDS
anuncia mais de um ano de austeridade. A 24/2, é revelado que Portugal tem os
impostos mais pesados da OCDE. Ainda temos o IRS dos mais altos da EU.
Continuidade de regime.
Num artigo
de 19/2, o JN revela que em Maio passado o PS tinha comemorado no Porto o «dia do trabalho» com uma reunião onde se
vitoriou longamente a Carta Aberta. Nesse mesmo mês, em Portalegre, no decorrer
de uma efervescente reunião da Comissão Nacional do PS foi aprovado o
«documento Gonelha» intitulado «A questão sindical - análise, projecto e táctica»
em que o PS se esforçava por aparecer («se encontrar» – ! – diziam eles) como partido dos
trabalhadores. Cria-se a fundação José Fontana e um novo Órgão Sindical de que
é director F. Marcelo Curto. Conclui o JN: «É aí que o PS inicia a jogada que
vai, não conduzi-lo à vitória, mas à derrota no interior da Carta Aberta, que
passa a ser dominada pelo PSD e pelo PCP(m-l) agora aliado [esteve sempre] ao
reformismo social-democrata.» A Carta Aberta dará, mais tarde, lugar à UGT.
Com o CDS
no poder, 600 oficiais saneados no 25 de Abril sentem agora reunidas as
condições para reclamar o regresso às fileiras. Muitos serão atendidos.
Março
Notícia
|
Comentário
|
10/3. Projectos do PS para as empresas em
autogestão aprovados por maioria. Em vez de geridas pelos trabalhadores
(cerca de 30 mil em autogestão) as empresa passam para os patrões, com
comissões de trabalhadores.
|
Eis o que Mário Soares entendia por autogestão
socialista. As comissões de trabalhadores rapidamente passarão para os
amarelos, e depois desaparecerão por serem redundantes.
|
Sucedem-se
as greves (Sonae, Oliva, Sociedade Nacional dos Sabões, Mondrel,
Sonae/Novoplan, Função Pública, Professores, etc.). Mas a revolução há muito
acabou e as lutas dos trabalhadores são bem mais difíceis.
A 2/3,
Silva Lopes (PS), governador do BdP anuncia que as medidas de austeridade vão
ser muito reforçadas. A 15/3 sobem o imposto profissional (+10%) e o imposto de
transacções (actual IVA). A 24/3, a energia eléctrica aumenta quase 50%.
A 8/3, é
noticiado que foram semeados mais de 250 mil ha pelas UCPs e Cooperativas do
Alentejo. Estrénuo esforço dos trabalhadores que infelizmente vai ser
destruído.
A 20/3, PS
e CDS partilham a nova administração da RTP. (Esta e posteriores «partilhas»,
com monopólios pelo meio, passa a ser a «liberdade de informação»; isto é,
liberdade de só dizer o que permite o capital.) A 29/3, Soares Louro diz que
«TV vai mudar». Ah, pois vai, vai. Vai ficar totalmente ao serviço do capital e
do imperialismo.
Abril
Notícia
|
Comentário
|
3/4.
Vital Moreira em comício no
|
Desde
que Vital Moreira passou para o PS, já podem.
|
14/4. M. Soares ao Le Monde: «uma política
realista para deter o vento que sopra da direita»
|
|
14/4. M.
Soares ao Le Monde: «Nem eleições antecipadas nem revisão
constitucional. Aguentaremos até 1980.»
|
Não
aguentaram. E a revisão constitucional estava na forja. Quando a lei não
agrada… muda-se a lei. A 9/4, Freitas do Amaral admite: «Trabalhamos há 6
meses na revisão constitucional.»
|
27/4. M. Soares à France-Inter considera
que edificar actualmente o socialismo em
|
Estão a ver porque o PS pôs o «socialismo na
gaveta»?
|
28/4. M. Soares a jornalistas espanhóis: «O
socialismo ainda não foi construído em nenhum país.»
|
Em que mundo viverá Soares? E que entenderá ele
por «socialismo»? Afinal, o «socialista» de «Partido Socialista», significa o
quê?
|
30/4. M.
Soares em
|
Claro.
Eles andam sempre a passar-se de um lado para o outro. E nem dão pelas
diferenças.
|
A reacção
instala-se nas FFAA, atingindo o próprio Vasco Lourenço que leva um pontapé do
CR, de saída de governador militar de Lisboa (1/4). Já tinha cumprido o seu
papel de líder militar da contra-revolução. Agora, só lhe restava carpir
mágoas, o que vem penosamente fazendo até hoje. Penosamente, para os que
estiveram com a revolução, bem entendido. Na hora do pontapé os amiguinhos do
PS não fizeram nenhuma manifestação em prol de «o Lourenço e mais nenhum».
Também a
1/4 – surpresa! – registam-se aumentos de cerca de 25% no cabaz de compras. E a
3/4 é noticiado que o 3.º pacote de medidas de austeridade vai ser anunciado no
dia seguinte. Não se tomam medidas de fixação de preços ou de tectos dos
grandes vencimentos; mas aos salários dos trabalhadores, a esses sim, é imposto
um limite de aumento que irá rapidamente ser comido pela inflação: 22% nesta
altura. A 13/4 são anunciados, para breve,
novos aumentos de preçosde produtos essenciais. A 20/4, é também
anunciado o aumento do preço da carne de porco. A 17/4, M. Soares classifica os
protestos populares generalizados contra a subida de preços como acções contestatárias desenvolvidas pela
«extrema-esquerda» e «acções subversivas da ordem democrática»! É este o
«socialismo democrático», onde o povo fica de fora.
Por todo o
lado os direitos dos trabalhadores são espezinhados, mesmo nas grandes
empresas: A Soares da Costa não aplica a legislação e despede como quer (os elementos sindicais activos)
sem que nas notas de despedimento indique os motivos (3/4). O PS assobia para o
lado.
A 6/4, na
AR, é posto à votação um voto de protesto do PS contra críticas a Ramalho Eanes
por parte do PSD. Obtém o apoio do CDS e do… PCP! (Sobre uma disputa entre
comadres havia a abstenção. Assim, até parece que o PCP esteve com o «25 de Novembro».)
Estão em
curso conversações com o FMI. A 7/4, Vítor Constâncio diz na AR que «governo
não aceitará “linha dura” do FMI». Mais tarde, aceita.
Maio-Junho-Julho-Agosto
Notícia
|
Comentário
|
7/5. Acordo com o FMI: aumenta a taxa de juro
(4%) do crédito e mantém os salários que são comidos por inflação elevada.
Soares considerou um «êxito» o acordo conseguido com o FMI.
|
O primeiro acordo do PS com o FMI. O primeiro de
vários de iniciativa PS. Até Sócrates. Todos lesivos dos trabalhadores
portugueses.
No mesmo dia é anunciado que o custo de vida
teve um aumento médio de 35,6% no espaço de um ano; isto é, desde que o PS
detém o poder.
|
7/5. Sete socialistas exigiram a liberdade
imediata para Edmundo Pedro.
|
Edmundo Pedro do PS é o contra-revolucionário que
obteve armas dos meios militares para matar comunistas. Exceptuando uma curta
prisão VIP, nada lhe aconteceu, claro.
A 6/6, voltou ao Secretariado do PS. Promoção
por serviços prestados.
|
13/6. M. Soares no Sabugal: «futuro pertence ao
socialismo democrático».
|
Isto depois de ter dito que o punha na gaveta.
Ou será a prática PS-CDS o tal «socialismo democrático»?
|
5/7.
António Barreto critica nos EUA o acordo PS-CDS («incompleto e mal feito»).
Não gosta da actual equipa do MAP (Ministério da Agricultura e Pescas). Diz
também que saiu do governo por desacordo com M. Soares, pois queria combater
mais o PCP. Enfim, um anti-comunista puro.
|
A 6/7, a
Federação de Lisboa do PS critica Barreto e apoia a equipa do MAP. A 9/7,
outras Federações do PS manifestam-se contra Barreto que acusam de
«identidade de princípios e de acção» com a direita. Até Manuel Alegre teria
pedido a expulsão de Barreto do PS!
A 10/7,
numa reunião do PS no Solar de Mateus, o «presidencialismo» é defendido por
Barreto e Medeiros Ferreira sob o lema: «criação de um bloco hegemónico para
apoiar o futuro PR». Tipo Ein Führer. O direitismo é de tal monta que
até os direitistas Cardia, V. Constâncio e A. Reis se sentem obrigados a
demarcar-se, a 11/7, das «conclusões de Mateus».
|
13/7. M.
Soares procura acalmar os ânimos dentro do CDS.
|
Sem
comentários.
|
14/7.
CDS: «Se não sai a equipa do MAP, poderá cair o governo».
|
O CDS
esperava um MAP à Barreto, correndo rapidamente com os comunistas do Alentejo
e liquidando sem delongas a Reforma Agrária. Opunha-se à equipa de António
Campos do PS, que também queria liquidar a Reforma Agrária mas a ritmo mais
lento.
|
14/8. M.
Soares entrevistado pela rádio: «golpe antidemocrático», assim classificou o
que está a passar-se, mas, «o PS não fará obstrução ao governo Nobre da
Costa».
|
Tinha-se
consumado o fim do governo PS-CDS e Eanes tinha escolhido Nobre da Costa, um
tecnocrata pró-PSD, para PM. O socialista Soares falou de grosso («golpe
antidemocrático») mas não fez «obstrução». Pois. E para não ferir a
susceptibilidade do compadre Eanes (compadre na contra-revolução) apressou-se
a esclarecer a 15/7: «aquela coisa do “golpe antidemocrático” não se referia a
Eanes». Referia-se, talvez, a
|
Este
período é marcado por avanços importantes do capital e dos latifúndios.
Avanços
do capital:
Desintervenções na Grão-Pará,
Xavier de Lima e Habitat, e apoio financeiro à J. Pimenta (4/5). A 28/5, um
encontro de industriais portugueses exige a revisão do regime das contratações
colectivas de trabalho e desfere violentos ataques ao sector nacionalizado;
Marcelo Curto (PS) dá-lhes a mão nesse mesmo dia, afirmando num encontro dos
metalúrgicos socialistas que «empresas privadas não são máquina de exploração –
mas de progresso». Ah, grande socialista!
A 30/6, a J Pimenta é
desintervencionada e fala-se nos órgãos de comunicação em 700 despedimentos na
calha. A 25/7, a J Pimenta despedirá de facto 1400 trabalhadores, 75% do
pessoal! A 18/8, a Comissão de Trabalhadores (CT) da J. Pimenta «exige» a
intervenção directa do Poder. Uns líricos, se calhar também convencidos de que
o PS é de esquerda. A 20/8, J. Pimenta é aplaudido por investidores e credores
que querem a desintervenção da firma. Estais a ver, CT da J. Pimenta? Chama-se
a isto, capitalismo.
O capital mostra-se impaciente
em vingar as afrontas do «25 de Abril» e, claro, exercer a sua função de sugar
as mais-valias produzidas pelos trabalhadores, sem restrições. A 1/7, o 1.º
Encontro de Investidores Estrangeiros do Norte e Centro proclama que a
«instabilidade laboral prejudica o investimento estrangeiro» (isto dos
trabalhadores terem direito à greve é uma chatice). A 21/7, a CIP diz-se sem
confiança no governo, e que só avançará a «contribuição da indústria privada
quando deixar de sentir obstáculos». Nada de obstáculos! A 4/8, os empresários
de hotelaria querem impor salários inferiores aos então vigentes.
O avanço do capital configura,
de facto, a recuperação dos monopólios. São favorecidas as grandes empresas (o
grande capital), mas não as PMEs que se queixam a 27/6 em reunião: «estamos a
caminho da devastação, da miséria e da falência». Mas só agora viram isso.
Lutas
dos trabalhadores:
Os trabalhadores procuram
opor-se ao avanço do capital e à destruição dos seus direitos, mas deparam,
como é óbvio, com uma lógica do Poder muito diferente da do período
revolucionário, agravada por um anti-comunismo e anti-sindicalismo feroz.
A 17/6, a CGTP repudia em
comunicado a acção da PSP que «amedrontou os operários» no dia da greve da
construção civil. A intimidação constante dos trabalhadores em luta pelos seus
direitos passa a vigorar pela mão do PS. Até hoje. A 20/7, a CGTP vai solicitar
audiência urgente ao governo, sobre: violações sistemáticas e impunes do
patronato às leis do trabalho, objecções de fundo ao diploma criador dos
«juízes sociais» de nomeação do governo. Esta e posteriores audiências caíram
em orelhas moucas. Numa bela demonstração de que o Estado e a sua Lei estão
sempre ao serviço da classe dominante. Acrescente-se que a invenção PS dos
«juízes sociais» constituiria uma nova versão do corporativismo fascista. A
29/7, Luís Veloso, da União de Sindicatos do Porto, falou da «paciência com
limites» dos trabalhadores perante a inflação galopante e que «mais de milhão e
meio de trabalhadores se pode manifestar a qualquer momento». O capital não se
amedrontou. Sabia bem onde estava o poder judicial e o das armas.
Pelo sim, pelo não -- e para
desactivar a unidade na luta dos trabalhadores e promover a colaboração de
classes --, o capital pela mão do PS-PSD, anuncia a 23/8 que a Carta
Aberta-Madisca (Movimento Autónomo Democrático de Intervenção Sindical) dava
lugar à UDTP (União Democrática dos Trabalhadores Portugueses). A futura UGT.
Avanços
dos latifúndios:
Entregas de reservas a
latifundiários, a 4/5, na zona da reforma agrária: 15 mil pessoas ficarão no
desemprego mas o governo está a estudar soluções (pois, está a «estudar»),
revelou o porta-voz do CDS (!); a 10/5, trabalhadores rurais, UCPs e
Cooperativas, sindicatos agrícolas, industriais corticeiros e suas organizações
de classe, técnicos do MAP, instituto dos produtos florestais, comissão
permanente para os assuntos da cortiça, todos contestam a «lei Barreto da
cortiça» (ver artigo anterior) que descapitaliza UCPs e Cooperativas. A lei,
contudo, permanece. A bem da penetração capitalista e latifundiária no
Alentejo. A 13/5, um plenário das UCPs pronuncia-se: «não se aceitam entregas
de reservas que destruam postos de trabalho». Sem efeito. A CAP está cada vez
mais provocadora: a 19/4, ameaça com «corte de víveres às cidades» e a 22/5
corta em Albergaria-a-Velha a estrada nacional dando 30 dias de prazo ao
governo para acabar com a reforma agrária.
A 8/7, as UCPs denunciam os
ataques à reforma agrária afirmando que haverá mais 25.000 desempregados se
forem atendidos todos os pedidos de reservas. A 10/6, Freitas do Amaral (CDS)
faz saber que divergências com o PS no MAP «são e vão ser conciliáveis». Mas
não irão ser.
Aspectos
económicos:
O custo de vida não pára de
aumentar. A 29/6, os telefones encarecem mais de 50%.
É concluído o acordo com o
FMI, com V. Constâncio a explicar, a 20/5, que o objectivo do acordo é o
«saneamento financeiro da economia portuguesa». É sempre esta a justificação.
Ainda agora, com a Grécia, também foi. O diabo está no detalhe: saneamento de
quê, para quê e ao serviço de quem?
A 19/7, Constâncio declara que
a dívida externa deve duplicar dentro de 5 a 6 anos (em 1977 era de 4,4 biliões
de dólares).
A 25/7 o
escudo vale menos 60% que em 1973.
Aspectos
sociais:
É apertado o controlo dos
meios de comunicação, que perdura até hoje: a 14/5, Soares pede poderes
legislativos à AR (são-lhe concedidos a 3/6) -- «é necessário reforçar a
autoridade democrática» -- para combater o fascismo, organizações extremistas,
o separatismo, e… os abusos da liberdade de imprensa; liberdade que por esta
altura já não era muita. A 15/5, o conselho de ministros aprova alterações à
lei de imprensa. A 31/5, João Gomes (PS) promete sanear o SECS -- Secretaria de
Estado da Comunicação Social; isto é, deixar só ficar os politicamente
correctos.
O branqueamento e inserção de
fascistas na vida pública, prossegue: a 7/5, 9 pides são julgados: 2 são
absolvidos e outros dois são apenas condenados a suspensão… política!; a 15/5,
Carlos Azeredo (militar de direita) e Cal Brandão defendem o réu da rede
bombista Mota Freitas. (Quando o bombismo e terrorismo é contra a esquerda,
mormente comunistas, então é apoiado pelo regime «democrático» e deixa de ser
terrorismo para ser «justa indignação das populações».) Mota Freitas veio a ser
absolvido a 7/7, juntamente com o seu associado, o agente Regadas!
A 5/7, os estudantes do Ensino
Superior vão fazer pela 1.ª vez desde há uns anos um cortejo da mini-queima. É
o regresso da alienação estudantil que permanece até hoje.
A 16/7, Freitas do Amaral
propõe que uma «Confederação de Associações de Famílias» se tornasse num
parceiro social fundamental! Enfim, lembranças do «Deus, Pátria e Família» de
Salazar.
Aspectos
políticos:
A 3/7, Sá Carneiro, regressado
ao poder no PSD, impõe nova estratégia sob o lema grandiloquente de «projecto
de salvação nacional»! Vêem, como
o projecto de Cavaco Silva já tinha sido inventado por Sá Carneiro? (Andamos de
salvação em salvação. Mas sempre condenados.) O projecto de Carneiro é um
chorrilho de tiradas triviais, demagógicas e populistas, cabendo na
«compreensão» das camadas mais atrasadas da população (principalmente, o campesinato
do Centro e Norte): salvar a democracia, travar a degradação de nível de vida,
aumento do bem-estar, adesão à Internacional Socialista contra bloqueamento do
PS. A 22/8, Sá Carneiro propõe aumentar o número de círculos eleitorais, uma
medida que teve em dada altura bom acolhimento do PS. O aumento de círculos
eleitorais com deputados uninominais tornaria rotineira e sem sobressaltos a
alternância PS-PSD no poder, com ou sem CDS.
A 24/7, o CDS faz cair o
governo. Álvaro Cunhal volta a apelar á maioria de esquerda! A 28/7, Eanes
exonera Soares (mas o governo mantém-se em funções). A 29/7, Sá Carneiro
defende a formação de um «governo com base e iniciativa presidencial». É esta a
solução de Eanes anunciada a 10/8: Nobre da Costa (que foi ministro de Soares)
será o próximo PM. «Boa escolha!» diz o CDS. A 17/8, a CIP concorda: «a melhor
solução para agora». Os órgãos da direita europeia rejubilam (14/8): Le
Matin (França): «uma garantia para os economistas europeus»; Die Welt
(RFA): «imagem de marca do novo Portugal ».
Fomos aprovados. Estamos no bom caminho.
* * *
A 26/8 é
formado o III governo, por tecnocratas do PSD, CDS e PS, com afirmações vazias
de Nobre da Costa: «acção pragmática voltada para a resolução de problemas»,
«terão de ser tomadas algumas medidas políticas de fundo», «controlar a
inflação e conter o desemprego», etc.