“Stalingrad” by the pro-Nazi historian Antony Beevor
O historiador
britânico Antony Beevor é um dos actuais expoentes da corrente
historiográfica dominante que caracterizámos noutro artigo. Os seus livros de
reescrita reaccionária da 2.ª GM estão na moda. O autor tem coleccionado
galardões de grandes instituições imperiais: Cavaleiro da Ordre des Arts
et des Lettres, membro da Order of
the Cross of Terra Mariana, comandante da Order of the Crown, Runciman
Prize da Anglo-Hellenic League,
Medlicott Medal por serviços
prestados à história do RU (!), etc.
Quais os interesses que serve este cruzado? Uma primeira indicação é-nos prestada
pela insuspeita wikipedia: os seus
livros foram banidos de livrarias russas sob acusação de simpatias nazis do
autor, de escrever sobre a Rússia sem usar fontes russas, e promover falsos
estereótipos introduzidos pela Alemanha Nazi durante a 2.ª GM.
A vitória da
URSS sobre o nazi-fascismo na 2.ª GM continua a incomodar os reaccionários de
todo o mundo, incluindo os de uma Europa cada vez mais fascistizada.
Estalinegrado,
onde se travou a maior batalha da história, onde o exército soviético sob o
alto comando de Estaline esmagou os exércitos nazi-fascistas da Alemanha e
seus aliados (Itália, Hungria, Eslováquia, Roménia, Bulgária, batalhões de
voluntários fascistas holandeses, belgas, dinamarqueses, franceses, etc.)
tornou-se algo odioso, intragável, para a reacção de todo o mundo. Antony
Beevor é um porta-voz desse ódio.
Estalinegrado
foi o ponto de viragem na derrota do nazismo alemão. Sem Estalinegrado não
teria havido em 1945 a derrota total da Alemanha e a libertação da Europa do
terror de povos e trabalhadores escravizados, o fim dos campos de extermínio.
Só depois de Estalinegrado, no início de 1943, os políticos ocidentais
começaram a perder a esperança na derrota da URSS ou, pelo menos, numa longa
guerra de desgaste que tornasse a URSS irrelevante e permitisse aos
ocidentais rever a aliança com a URSS e voltar aos tempos de acordos de
divisão do mundo com Hitler. Os desembarques na Itália e na Normandia só
tiveram lugar quando essas esperanças imperiais se perderam e os políticos
ingleses e americanos recearam o avanço mais profundo do exército libertador
soviético na Europa.
Por estas razões a vitória soviética em
Estalinegrado tornou-se o evento mais odiado pelos reaccionários, que move
historiadores como Beevor a reescrever essa história, alinhando com os nazis.
Em Setembro
deste ano o comunista sueco Mario Sousa, um estudioso da história da URSS, publicou
uma excelente apreciação do livro Estalinegrado de Antony Beevor publicado
em Portugal pela Bertrand. A apreciação de Mario Sousa é convincente.
Baseia-se em evidência dura e em relatos de autores e testemunhas oculares
insuspeitas de parcialidade pró-soviética (o escritor Theodor Plievier, o historiador
Roger R Reese, o general hitleriano Franz Halder, Chefe de Alto Comando
Militar, o general hitleriano Heinz Guderian).
Dada a
importância aqui deixamos a sua tradução.
|
The British historian
Antony Beevor is one of today’s exponents of the mainstream historiographical
current that we have characterized in another
article. His books of reactionary re-writing of WWII are in vogue. The
author has collected awards from major imperial institutions: Chevalier of
the Ordre des Arts et des Lettres,
member of the Order of the Cross of
Terra Mariana, commander of the Order
of the Crown, Runciman Prize of
the Anglo-Hellenic League, Medlicott Medal for services rendered
to the history of UK (!), etc.
What interests does
this crusader serve? A first indication is provided by the unsuspected
wikipedia: his books were banned from Russian bookstores on charges of Nazi
sympathies of the author, of writing about Russia without using Russian
sources, and of promoting false stereotypes introduced by Nazi Germany during
WWII.
The
victory of the USSR over Nazi-Fascism in the WWII continues to annoy
reactionaries all over the world, including those of an increasingly fascistic
Europe.
Stalingrad,
where the greatest battle of history was fought, where
the Soviet army under Stalin's high command crushed the Nazi-Fascist armies
of Germany and its allies (Italy, Hungary, Slovakia, Romania, Bulgaria, fascist
volunteer battalions of Dutch, Belgian, Danish, French, etc.) has become
something hateful, unpalatable, for the reaction of the whole world. Antony
Beevor is a spokesman for this hatred.
Stalingrad
was the turning point in the defeat of German Nazism. Without Stalingrad there
would have been no total defeat of Germany in 1945 and the liberation of
Europe from the terror of enslaved peoples and workers, the end of
extermination camps. Only after Stalingrad, in the beginning of 1943, did
Western politicians begin to lose hope on the defeat of the USSR or, at
least, on a long war of attrition which would render the USSR irrelevant and
allowed Westerners to revise the alliance with the USSR and go back to the
times of agreements on world divisions with Hitler. The landings in Italy and
Normandy only took place when these imperial hopes were lost, and British and
American politicians feared a deepest advance of the Soviet liberation army
in Europe.
For these reasons the Soviet victory
in Stalingrad became the most hated event by the reactionaries, and compels
historians like Beevor to rewrite its history, in alignment with the Nazis.
The
Swedish communist Mario Sousa, a scholar on USSR
history, published last September an excellent review of Antony Beevor’s Stalingrad, which you can read here.
Sousa’s review is compelling. It is based on hard evidence and on accounts of
authors and eye-witnesses unsuspected of pro-Soviet biases (writer Theodor
Plievier, historian Roger R Reese,
Hitler’s General Franz Halder, Chief of Army High Command, Hitler’s General
Heinz Guderian).
(A translation in
Portuguese is given below.)
|
* * *
Apreciação
crítica de Mário Sousa sobre o livro Estalinegrado
de Antony Beevor:
“Estalinegrado” de
Antony Beevor – uma peça de propaganda da guerra nazi
Sábado, 2 de
Setembro de 2017
O livro Estalinegrado de Antony Beevor tem sido
altamente elogiado pelos media suecos.
Antony Beevor, um ex-oficial do exército britânico, foi agora apresentado como
escritor da história bélica. Isso surpreendeu-me e despertou a minha
curiosidade. De acordo com críticos da direita, o livro é «um livro brilhante e
muito bem escrito» (diário sueco Svenska
Dagbladet) e «Estalinegrado supera
a maioria do que se tem escrito sobre a Segunda Guerra Mundial» (jornal sueco Vestmanlands Läns Tidning). Espantoso, pensei!
Eles gritaram quando os nazis foram derrotados e destruídos em Estalinegrado! E
agora admiram o Estalinegrado de
Antony Beevor!? Talvez tenham ganho juízo depois de todos estes anos? Apesar de
tudo foi um combate contra o nazismo. Talvez eles queiram prestar um pouco de
justiça à vitória soviética depois de todos estes anos? Foi com estes
pensamentos na cabeça que comecei a ler o Estalinegrado
de Beevor.
Inicialmente
pensei fazer uma curta apreciação. Não era fácil. Rapidamente se tornou óbvio
que o livro Estalinegrado de Beevor
era um livro de propaganda contra a União Soviética, com páginas e páginas
cheias de mentiras, uma falsificação total da história. Refutar todas essas
mentiras necessitaria vários livros. Uma apreciação abordando apenas as
mentiras mais grosseiras encheria muitas colunas de um jornal. E ainda que a
apreciação que aqui apresento tenha sido reduzida ao mínimo, é todavia o obro
do que tinha tido em mente.
Logo na primeira
página da introdução comecei a perguntar-me se não havia algo de errado. Beevor
ataca o exército soviético de uma forma brutal, e não os nazis que invadiram a
União Soviética e levaram a cabo uma guerra de extermínio e genocídio, matando
mais de 25 milhões de pessoas em quatro anos! Imediatamente na primeira página
do livro Beevor chama a atenção para o facto de que o exército soviético
executava os desertores. Mas não diz nada sobre as execuções alemãs de
desertores! Porque razão Beevor só critica o exército soviético? É bem sabido
que a polícia militar alemã executou vários milhares de desertores alemães, e
sem julgamento. Também é bem conhecido que, quando o exército alemão estava
cercado em Estalinegrado, a polícia militar alemã executou vários milhares de
soldados alemães que tentavam roubar algo para comer dos pacotes de comida
lançados por aviões militares alemães (Theodor Plievier [TP], Stalingrad, Time Life Books, New York
1966 p 271). Esses pacotes eram primeiro que tudo destinados aos oficiais e à
polícia militar.
Milhões de
civis soviéticos executados pelo exército alemão
Porque razão
Beevor não fala disto? E, primeiro que tudo, porque razão Beevor não fala dos
milhões de civis soviéticos executados pelo exército nazi? Não fala de todos os
comunistas e judeus, sobre famílias inteiras que eram separadas de outros civis
nas vilas e cidades conquistadas e depois executadas pelo exército alemão?
Porque não fala Beevor dos milhões de pessoas escorraçadas de suas casas apenas
com a indumentária que vestiam na altura para morrer de frio a 20 graus
negativos? Porque não escreve sobre os milhões de cidadãos soviéticos feitos
prisioneiros pelo exército alemão e enviados para a Alemanha para ser vendidos
como escravos? Porque não escreve Beevor sobre as centenas de milhares de
raparigas soviéticas vendidas como escravas sexuais na Alemanha? Porque não
escreve Beevor sobre os mercados de escravos em toda a Alemanha nazi onde essas
pessoas eram vendidas? Esta é a face real do exército alemão e da invasão
alemã. Mas Beevor não tem nada a dizer sobre isto. Beevor pretende esconder os
crimes nazis.
Beevor também
escreve que existiam «50.000 cidadãos soviéticos em uniforme alemão» (Antony
Beevor [AB], Stalingrad, Penguin
Books 1999 p.xiv) Ele designa-os por «hiwis» e menciona-os ao longo do livro. Procura
fazer-nos acreditar que a população soviética acolheu bem os nazis. Beevor escreve
que em Estalinegrado havia 50.000 russos nas divisões da frente e 70.000 noutras
(AB, p184)! Os russos teriam assim constituído quase metade do exército alemão
em Estalinegrado! Uma afirmação completamente idiota e falsa, que não é
suportada por nenhum livro de história da Guerra, incluindo livros alemães.
Beevor quer que acreditemos em como houve deserção soviética massiva para as
linhas nazis. Não é verdade. É verdade que, durante a guerra, houve cidadãos
soviéticos que foram para o lado nazi, mesmo em Estalinegrado. Mas Beevor não
diz de onde vieram esses «russos em uniforme alemão». Foram pessoas que, por
várias razões, se voluntariaram para o lado nazi durante a guerra. Mas foram
poucos.
Obrigados a
trabalhar como escravos para os nazis
A maior parte dos
«cidadãos soviéticos em uniforme alemão» foram pessoas forçadas a trabalhar
como escravos para os alemães. Tinham sido feitos prisioneiros em vilas e
cidades e forçados a transportar equipamento para os alemães e a efectuar todo
o trabalho pesado e sujo. Eram brutalmente maltratados e passavam fome. Muitos
deles morriam e eram substituídos por novos escravos. Juntamente com judeus e
outra gente dos campos de extermínio da Polónia, alguns destes prisioneiros
eram usados para limpar campos minados, enfrentando morte certa. Estas equipas
de limpeza de minas eram completadas todos os dias com mais judeus e «cidadãos
soviéticos em uniforme alemão». Algumas mulheres soviéticas prisioneiras tinham
de trabalhar na cozinha e limpar as acomodações dos soldados alemães durante o
dia. De noite eram usadas como escravas sexuais. Quando o 6.º exército alemão
ficou cercado em Estalinegrado e os alemães fugiram da área cercada, essas
mulheres soviéticas foram forçadas a ir com eles em camiões superlotados.
Milhares de soldados alemães feridos foram abandonados à morte pelo frio e pela
fome (TP, p.192).
Os «cidadãos
soviéticos em uniforme alemão» de Beevor eram principalmente cidadãos
soviéticos aprisionados e escravizados. As insinuações de Beevor sobre
deserções soviéticas massivas são apenas uma forma atrair o leitor para a sua
fábula. Pode-se acrescentar que parte dos «cidadãos soviéticos em uniforme
alemão» tinham sido de facto levados pelos alemães da França para a Rússia!
Durante os anos 30 o general francês Weygand – o general que se rendeu aos
alemães – criou uma legião de russos de direita como parte do exército francês.
Tencionava-se que a legião tomasse parte «na guerra do Ocidente» que a França e
a Inglaterra preparavam contra a União Soviética. Estas tropas ficaram sob
comando nazi depois da capitulação francesa. No exército alemão havia também
tropas de nazis ucranianos. Beevor chama-lhes “nacionalistas ucranianos» (AB, p.23).
Procura dar uma imagem positiva destas tropas apoiantes dos nazis. Os nazis
ucranianos foram os piores assassinos durante a Guerra. Perseguiram todos os
opositores da Ucrânia ocupada e eram os piores assassinos nos campos de morte
alemães onde judeus e anti-fascistas ucranianos desapareceram, tal como milhões
de prisioneiros de guerra soviéticos.
A falsificação
nazi da história
O livro reproduz
a versão dada pelos oficiais nazis sobre Estalinegrado. Só raramente deixa os
«russos» falar. Os oficiais soviéticos só são mencionados quando não o pode
evitar. Beevor não está interessado no que os estrategas por trás da vitória
soviética em Estalinegrado teriam a dizer; por exemplo, o general Jukov, ou os
generais Rokossovski ou Tchuikov, ou outros generais soviéticos que destruíram
os exércitos alemães em Estalinegrado. Para Beevor -- um oficial e gentil-homem
do exército britânico --, a aristocracia dos oficiais alemães é mais
importante. O facto de esses vermes terem iniciado uma guerra em que morreram
50 milhões de pessoas não perturba Beevor. Contudo, é aos soldados soviéticos
que o mundo ocidental deveria agradecer a sua liberdade. Os soldados da União Soviética,
um país que em dez anos venceu a batalha contra o analfabetismo e o subdesenvolvimento,
construiu fábricas e siderurgias, produziu as máquinas mais sofisticadas, e as
armas mais avançadas, esmagou a Alemanha nazi e libertou o mundo do nazismo.
Até no que se
refere a crimes de guerra e genocídio a história de Beevor é a história dos
generais nazis. Segundo Beevor, Hitler foi o único culpado e o comando do
exército nazi era contra ele. Mas isto não é verdade. As origens do comando do
exército nazi são as «brigadas livres» que esmagaram a revolta dos
trabalhadores a seguir à Primeira Guerra Mundial e contribuíram para colocar
Hitler no poder em Janeiro de 1933. Foi com o apoio do Comando do Exército que
Hitler foi eleito Presidente do Reich [Império] e Chanceler do Reich pelo parlamento
alemão de 1934, tornando-se Comandante Supremo do Exército Alemão com o título
de Führer [Condutor]. Os oficiais e soldados tinham de efectuar um juramento de
fidelidade pessoal a Hitler. A ditadura nazi foi concretizada com o apoio do
Comando do Exército. Beevor afirma que «um certo número de comandantes se
recusou a reconhecer ou a não ligar» (AB, p.15) às instruções dos assassínios
nazis, as «ordens especiais» para a União Soviética sobre «as medidas
colectivas de repressão contra vilas e áreas de actividade guerrilheira e a
“Ordem dos Comissários” [ordem de assassínio de todos os comissários políticos]»
(AB p.14), e que estavam contra a «guerra racial» (AB p.15) e a «condenação à
fome» (AB p.15) como meio de esmagar o povo da União Soviética. Beevor não
possui qualquer evidência a apoiar as suas afirmações. Se existiam tais
oficiais no exército alemão, eram poucos. Mais de 25 milhões de pessoas mortas
em quatro anos na União Soviética mostra que se tratou do extermínio massivo de
um povo no qual todo o exército alemão e seus aliados tiveram de tomar parte.
Mentiras sobre
a União Soviética
O primeiro terço
do livro de Beevor trata da guerra antes de Estalinegrado e, como o resto do
livro, é um ataque sujo e difamatório da União Soviética e dos seus líderes. É
o relato sobre os primeiros meses de guerra enviado para todo o mundo em 1941
pela propaganda nazi, que foi adoptada mais tarde pelos propagandistas do
capitalismo do pós-guerra. É o relato do exército soviético à beira do colapso
total e de um Estaline que tornou o exército incapaz de conduzir a guerra e que
proibiu os seus generais de retaliar contra o inimigo. Beevor não poupa
palavras. Até a embaixada soviética em Berlim leva tareia. Segundo os nazis, e
agora segundo Beevor, o embaixador soviético era conhecido como um «carrasco»
que media «quando muito cinco pés de altura, com um pequeno nariz adunco e uns
poucos tufos de cabelos negros numa cachola careca». É isto história? Na
embaixada, o embaixador «tinha uma câmara de tortura e de execuções construída
na cave para lidar com suspeitos de traição» (AB p.7).
Esta história
fazia parte da propaganda de Guerra nazi. É agora história burguesa. Os ataques
contra Estaline constituem uma classe à parte, ao longo de todo o livro. A «mente
torcida de Estaline» (AB p.4), «Estaline, o ditador totalitário» (AB p.6), a
«sequência de obsessivos cálculos errados» de Estaline (AB p.9), «Estaline, cuja
natureza intimidatória continha uma forte marca de cobardia» (AB p.9), a «mistura
inimitável de paranóia, megalomania sadista e revanchismo de velhos desrespeitos»
de Estaline (AB p.23), «Estaline até renegou o seu próprio filho» (AB p.26), Estaline
cuja «falta de preocupação pela população sofrendo de fome era tão cruel quanto a de Hitler» (AB p.37). Não é
difícil compreender por que razão Beevor é adorado pelos jornais capitalistas e
por pessoas reaccionárias.
Beevor escreve
que Estaline, Beria e Molotov pensaram em ceder «a Ucrânia, a Bielorrússia e os
estados bálticos» aos nazis na esperança de obter a paz. Mas que o embaixador
búlgaro declarou «mesmo que vos retireis para os Urais, ainda acabareis por
ganhar» (AB p.9). Segundo Beevor, a questão teria assim ficado resolvida e a
União Soviética decidiu avançar e combater contra a Alemanha nazi! É preciso
ser muito estúpido para acreditar que alguém normal engolisse este tipo de relato.
Para acreditar que os líderes de um grande e poderoso país deixassem uma
decisão tão importante sobre o futuro do seu país depender de algumas palavras
pronunciadas por um embaixador de um país insignificante do ponto de vista
militar e, ainda para mais, de um estado vassalo de Hitler!
Firmemente
decidida a defender o território soviético
Contrariamente às
afirmações de Beevor a liderança soviética decidiu firmemente defender cada
polegada do território soviético. As grandes siderurgias que foram construídas
na década de 1930 para além das montanhas dos Urais, a uma distância segura de
qualquer invasão do ocidente, são evidência suficiente. Aí se tornaria possível
continuar a produzir armas e outro equipamento militar mesmo durante uma longa
guerra. Todas as indústrias soviéticas de grande escala foram transportadas
para aí quando a invasão aconteceu. O primeiro capítulo do livro termina com a
mensagem de rádio de Molotov ao povo soviético. Isto também não satisfaz
Beevor. Segundo ele, «à escolha de palavras por Molotov faltou inspiração e a
sua prestação foi desajeitada». Contudo, Beevor é obrigado a admitir que este
«anúncio criou uma reacção poderosa através da União Soviética». «Os
reservistas não esperaram pelas ordens de mobilização. Apresentaram-se
imediatamente» (AB p.10). Como isto é estranho! Então não houve deserções
massivas para os alemães? Não houve uma «calorosa recepção dos civis» (AB p.26)?
Beevor também
toma de empréstimo materiais da CIA. A velha fábula segundo a qual «no total
foram executados, postos na prisão ou demitidos 36.671 oficiais» (AB p.23) do
exército soviético em 1937, regressa de novo. Esta fábula foi divulgada por um
agente da polícia britânica, mais tarde agente da CIA, Robert Conquest (ver Lies on the History of the Soviet Union –
From Hitler and Hearst to Conquest and Solzhenitsyn. Mário Sousa, Sweden, 1998–
disponível na Stalin Society, BM Box 2521, London WC1N 3XX). Segundo Beevor, as
baixas soviéticas no início da história foram devidas à escassez de oficiais.
Beevor fala de novo contra o seu melhor juízo. Os oficiais demitidos foram
cerca de 22.000 (de 75.000). A sua demissão foi decidida em assembleias gerais
das unidades militares. Não tinham a confiança dos soldados. Porém, o número de
oficiais soviéticos em 1941 era já acima de 300.000! (ver
Roger R Reese [RR], The Red Army and the
Great Purges, Stalinist terror – New Perspectives, Cambridge University Press 1993, p.198). A União Soviética tinha feito tremendos
preparativos para a defesa contra a Alemanha nazi. O número de oficiais
demitidos só podia ter um efeito ténue durante os primeiros meses de guerra. O
motivo da retirada das forças soviéticas durante os primeiros meses da guerra radica-se
na dimensão dos exércitos. Beevor escreve que as forças de invasão nazi eram «Cerca
de 3.050.000 tropas alemãs, com outros exércitos pró-Eixo, aumentando o total
para quatro milhões de homens» (AB p.12). Mas o exército de invasão contra a
União Soviética era de mais de 5 milhões de homens, o maior exército de invasão
da história da humanidade. A União Soviética tinha 2,9 milhões de homens nas
suas fronteiras ocidentais. A União Soviética não conseguiu formar um exército maior
durante os 10 anos de preparação. Além disso, os nazis puderam concentrar os seus
ataques em certas zonas onde a sua superioridade numérica era de mais de cinco
para um. Nessas zonas, os nazis concentraram grandes unidades blindadas que
eram muito difíceis de travar. É isso que principalmente explica as vitórias
alemãs durante os primeiros meses da guerra. Contudo, essas vitórias foram
duramente conquistadas. Não era um mar de rosas, conforme a descrição de
Beevor, com meninos alemães bronzeados pelo sol, passando uma viagem de férias
pela União Soviética e desfrutando da "calorosa recepção dos civis".
Histórias de Beevor vs Franz Halder
É interessante comparar as mentiras de Beevor com as informações do chefe do Alto
Comando Militar alemão, o general Franz Halder. Halder foi o Chefe do Alto
Comando de Hitler de Agosto de 1938 a 24 de Setembro de 1942. Liderou todas as
guerras nazis, em todas as frentes, durante esses anos. Halder escreveu um
diário pessoal e secreto nesse período. O diário contém as suas próprias notas
sobre a guerra, escritas na taquigrafia de Gabelsberg, uma velha língua
taquigráfica que poucas pessoas podiam ler. O Diário de Guerra de Halder não
pretendia ser divulgado, mas foi publicado após a guerra sob o título The Halder War Diary, 1939-1942. Um
livro muito interessante, contendo muitas verdades que Halder e os potentados
nazis não queriam revelar. Beevor fala de histeria, pânico geral e de «O caos
do lado soviético» (AB p.73). Mas logo no primeiro dia da invasão, 22 de Junho
de 1941, Halder escreve durante a noite que «não há indícios de tentativa de retirada
operacional. Essa possibilidade também pode ser removida» (The Halder War Diary 1939-1942, [HWD] Greenhill Books, Londres 1988
p.412/3). Os soldados soviéticos não pretendiam fugir dos alemães; lutavam
contra eles.
Dois dias depois,
24 de Junho, Halder escreve: «A resistência teimosa das unidades russas
individuais é notável», «é agora claro que os russos não estão a pensar em
retirada, estão sim a jogar tudo o que têm para conter a invasão alemã» ( HWD p.419).
Uma semana após o início da invasão, 29 de Junho, Halder escreve: "os relatórios
de todas as frentes confirmam indicações anteriores de que os russos estão a lutar
até ao último homem" (HWD p.433). O general Halder, tal como Hitler e todo
o comando militar, pensou que a invasão alemã iria forçar os soldados
soviéticos a fugir e que os alemães iriam destruir o exército soviético. Foi o
que aconteceu com a França, que era uma grande potência militar. Mas a guerra
contra a União Soviética tornou-se cada vez mais amarga. Os nazis infligiram
grandes perdas ao exército soviético e forçaram-no a recuar. Mas as forças
nazis também sofreram grandes perdas. De acordo com Halder, após 10 dias, em 3
de Julho, os alemães tiveram «Perdas totais de cerca de 54.000» e um «grande
número de baixas hospitalizadas (quase 54.000) (HWD p.453/4)». A 4 de Julho, as
notas de rodapé de Halder são de perdas elevadas nos tanques atacantes, perdas de
até 50% em certas unidades blindadas (HWD p449). A verdadeira guerra foi
completamente diferente da do livro de Beevor.
Os
«lendários» generais de Beevor oriundos das melhores «famílias
militares»
Uma das teses de Beevor, é que houve uma contradição quanto à estratégia entre
Hitler e os generais alemães. Para Beevor, o comando do exército alemão, com
todos os seus generais «lendários» (AB p.66) e «brilhantes» (AB p.16)
provenientes das melhores «famílias militares» (AB p.15) da Alemanha, era muito
competente e teria ganho a guerra se o «irresponsável» e o «ignorante» Hitler
não tivesse imposto as suas ideias sobre a condução da guerra. Mas não existe no
The Halder War Diary nada que apoie
esta tese. O Comando do exército alemão, exactamente como Hitler, tinha uma ideia
completamente falsa da União Soviética. Tal como Hitler, o comando alemão tinha
avaliado que a União Soviética seria fácil de derrotar e que a guerra
terminaria em poucas semanas. Analisando a situação no 11.º dia da invasão, 3
de Julho, Halder escreve no seu Diário de Guerra que «provavelmente não há
exagero em dizer que a Campanha Russa foi vencida no espaço de duas semanas»
(HWD p.446). O comando alemão esperava que a derrota da União Soviética fosse
concluída em 3 de Julho de 1941!
Em 4 de Julho,
Halder escreve: «À medida que nossos exércitos avançam, qualquer tentativa de
resistência adicional provavelmente logo entrará em colapso e teremos de
encarar a questão de destruir Leninegrado e Moscovo" (HWD p.450). Hitler e
os generais compartilhavam a mesma ideia insensata do curso da guerra e as
mesmas ilusões sobre a vitória. Mais do que isso. Também concordaram com os
crimes de guerra, não só quanto ao extermínio da população soviética, mas
também quanto à destruição total das cidades soviéticas. A 8 de Julho de 1941,
Halder descreve uma reunião com Hitler durante a qual a situação de guerra foi
analisada e foram tomadas decisões importantes. Hitler estava firmemente
resolvido «a arrasar Moscovo e Leninegrado, a torná-las inabitáveis, de modo a
aliviar-nos da necessidade de ter de alimentar a população durante o inverno.
As cidades serão arrasadas pelas forças aéreas. Os tanques não devem ser usados
para esse fim. Será uma catástrofe nacional que privará dos seus centros não
só o bolchevismo mas também o nacionalismo moscovita» (HWD p.458). Ninguém no
comando do exército se opôs ao plano de Hitler. Teria sido levado a cabo se a
União Soviética não houvesse derrotado os nazis. Na mesma entrada, Halder
escreve sobre os trimestres de inverno: "As nossas tropas não devem ser aquarteladas
em vilas e cidades, porque queremos poder bombardeá-las a qualquer momento em
caso de revolta» (HWD p.459). Podemos ver aqui o verdadeiro rosto dos generais
nazis. Os generais «lendários» de Beevor das melhores «famílias militares» eram
tão criminosos de guerra quanto Hitler.
Na mesma reunião
com Hitler, 8 de Julho, foi decidido o ataque contra Smolensk. Esta cidade,
localizada na estrada principal para Moscovo, deveria ser tomada conjuntamente
com Yelnya e Roslav antes do ataque contra Moscovo. O chefe do Alto Comando,
Franz Halder, escreve no seu diário: «Depois de destruir os exércitos russos numa
batalha em Smolensk, iremos bloquear as ferrovias que cruzam o Volga, ocupar o
país até esse rio e, depois disso, prosseguir para destruir os restantes
centros da indústria russa por meio de expedições blindadas e operações aéreas»
(HWD p.459). Devemos lembrar que as tropas nazis estavam a 100 km de Smolensk
e, a partir desta cidade, são mais 500 km para Moscovo e outros tantos quilómetros
para o Volga. Tudo seria tão fácil! Mas não aconteceu assim. A batalha de
Smolensk foi, segundo Beevor, uma brincadeira para os nazis e um «desastre»
para a União Soviética «na qual vários exércitos soviéticos ficaram
encurralados e onde «muitas outras divisões soviéticas foram então sacrificadas»
(AB p.28/9). Então a estrada para Moscovo deveria estar aberta! Porque razão
não foi então a ofensiva contra Moscovo prosseguida? Beevor explica o porquê.
Hitler ordenou parar no final de Julho. O seu «instinto para evitar a estrada
para Moscovo era em parte para evitar, supersticiosamente, o caminho de
Napoleão» (AB p.32). Portanto, Hitler tornou-se «supersticioso» e ordenou que o
exército parasse! Será que se pode chamar a isto história?
Smolensk é defendida
Contrariamente ao
que Beevor afirma, a batalha de Smolensk custou muito cara aos nazis. Os
defensores de Smolensk lutaram teimosamente, sem pensar em render-se, e o
exército soviético fez fortes contra-ataques. Foi uma luta por cada subúrbio,
cada casa e cada rua. Os nazis foram obrigados a parar para poder dispor de
novos fornecimentos em homens e equipamentos. O general Halder escreve no seu
Diário de Guerra, a 11 de Julho, que as tropas blindadas soviéticas na batalha
de Smolensk «Em todas as ocasiões, grandes corpos, se não todos, conseguem
escapar do cerco» (HWD p.465). Já em 13 de Julho, Halder e o Alto Comando Militar
sugeriram a Hitler que «Nós devemos interromper temporariamente a corrida em
direcção a Moscovo" (HWD p.470). Era simplesmente impossível avançar. Em
15 de Julho, Halder informa que «as tropas russas estão agora, como sempre, a
lutar com uma determinação selvagem» (HWD p.474). Durante a semana seguinte, o
exército soviético consegue penetrar nas linhas alemãs em vários lugares. Em 26
de Julho, Halder escreve: «Panorama geral: a defesa inimiga está-se a tornar
mais agressiva; mais tanques, mais aviões. Para além de dez novas divisões já antes
assinaladas, mais quinze novas divisões foram assinaladas» (HWD p.485). No
mesmo dia, grande parte das tropas soviéticas cercadas conseguiram romper, e
com as principais forças soviéticas, criaram uma nova linha de defesa em frente
a Moscovo. As tropas nazis avançando para Moscovo estavam consideravelmente
esgotadas e enfraquecidas. As perdas nazis tornaram-se muito pesadas e o exército
nazi não conseguiu fornecer-se de novos homens e equipamentos.
Em 30 de Julho,
Hitler decidiu deferir o pedido feito pelo Alto Comando em 13 de Julho, e
ordenou que se passasse à defensiva. Halder comentou nestes termos esta decisão
no seu Diário de Guerra: "O comando supremo do exército assinou uma nova “directiva",
que adopta as nossas propostas! Esta decisão liberta todos os soldados
pensantes da horrível visão que nos obsediou nos últimos dias, uma vez que a
obstinação do Führer fez parecer iminente o último atolamento da campanha
oriental. Finalmente, conseguimos uma pausa!» (HWD p.490). O Alto Comando
finalmente obteve a sua pausa. Hitler não decidiu parar a ofensiva porque era «supersticioso»
e estava em contradição com o Alto Comando. Hitler decidiu parar a ofensiva
porque o Alto Comando exigiu isso e a situação dentro do exército assim o
exigiu. A mentira de Beevor sobre o supersticioso Hitler é óbvia.
Os nazis tiveram
que parar em Smolensk pela primeira vez durante a Segunda Guerra Mundial, de
modo que isto foi o fim da "blitzkrieg" [guerra relâmpago] nazi. Em
11 de Agosto, Halder escreve: «Toda a situação torna cada vez mais claro que
subestimámos o colosso russo» (HWD p.506). Após seis semanas de guerra, Halder
escreve: «Total de baixas para o período de 22 de Junho a 13 de Agosto de 1941:
389.924» (HWD p.521).
Em 28 de Agosto escreve: "Situação dos tanques:
«Armd. Gp. 1:
média de 50 por cento, [Armd. Gp. = corpo blindado]
«Armd. Gp. 2:
média de 45 por cento,
«Armd. Gp. 3:
média de 45 por cento,
«Armd. Gp. 4:
Melhor (material checo!),
«Em média entre
50 e 75 por cento» (HWD p.518/20).
Os nazis
precisavam de tempo para obter novas tropas e material para a frente. Só em Outubro
os nazis puderam retomar a ofensiva em direcção a Moscovo com novas armas e
novas divisões. Beevor explica a nova ofensiva de Hitler dizendo que este «mudou
novamente de ideias» (AB p.33). De acordo com Beevor, Hitler já não era «supersticioso»...
Para a União Soviética, a batalha de Smolensk foi um sucesso estratégico. A
defesa de Moscovo pôde ser garantida.
Tula parou os nazistas
Beevor torce a verdade e nega factos históricos em cada página do livro. Vamos
dar um pequeno detalhe sobre a cidade de Tula. A estrada do sul para Moscovo
passa por Tula. Beevor escreve: «no flanco sul, os panzers de Guderian passaram
para além de Tula para ameaçar a capital soviética por baixo» (AB p.36). Isto transmite
a impressão de que Tula já havia sido conquistada. Mas a verdade é que os
tanques de Guderian nunca tomaram Tula. Os defensores desta cidade lutaram sem
pensar em desistir. Após muita luta dura, o general nazi Guderian, chefe do 2º
exército motorizado alemão, foi forçado a desistir da conquista de Tula.
Guderian escreve nas suas memórias que «O rápido avanço em Tula, que tínhamos planeado,
teve de ser abandonado de momento» (General
Heinz Guderian - Líder Panzer [GHG], Da Capo Press 1996 p,233). «Numerosos
T34 russos entraram em acção e infligiram grandes perdas nos tanques alemães»
(GHG p.237). O exército blindado de Guderian ficou bloqueado perto de Tula, a
cerca de 200 km de Moscovo! Um mês depois, a contra-ofensiva soviética rechaçou
os tanques de Guderian para mais 130 km. Por causa desse fracasso, Guderian
perdeu o comando do 2.º exército motorizado alemão.
A descrição de
Beevor das batalhas coincide com a dos generais nazis. De acordo com Beevor «Foi,
no entanto, o clima que rapidamente se tornou o pior obstáculo para a Wehrmacht».
Mas, os bons alemães de Beevor «lutaram o melhor que puderam» (AB p.36), embora
«os motores dos tanques estivessem congelados» (AB p.40) (e então os dos tanques
soviéticos?) e a «má visibilidade dificultou a "artilharia voadora" da
Luftwaffe» (AB p.39). Do lado soviético, de acordo com Beevor, não foi de forma
alguma uma questão de acções heróicas na defesa do país, mas de uma «resistência
suicida» (AB p.39) e de «motins por alimentares, saque e embriaguez» (AB p.38).
A parada no dia 7 de Novembro em Moscovo foi, segundo Beevor, apenas um truque
para enganar os jornalistas. É impossível ter dúvidas sobre as simpatias de
Beevor. Tem prazer malicioso quando o exército soviético é forçado a recuar e tem
admiração pela ofensiva nazi. Mas, infelizmente para Beevor, a ofensiva deparou
com mais e mais problemas. No final de Novembro, os nazis estavam completamente
exaustos. O Alto Comando parece não ter ideia sobre a situação da guerra. A 23
de Novembro, Halder escreve no seu Diário de Guerra: «Situação militar: Leste:
a autoridade militar da Rússia não é mais uma ameaça» (HWD p.563). No entanto,
13 dias depois, em 6 de Dezembro, o exército soviético empreende a
contra-ofensiva que empurrará os nazis para 250 km de distância de Moscovo.
Depois que os nazis foram derrotados fora de Moscovo, Beevor tinha de encontrar
uma desculpa. Foi, entre outras coisas, «a quase supersticiosa recusa de Hitler
em encomendar roupas de inverno» (AB p.44). Mais uma vez o Hitler
supersticioso! Todavia, e apesar do facto de que os nazis foram obrigados a
retirar 250 km, Beevor escreve que «a ofensiva geral de Estaline se deteriorou numa
série de brigas desordenadas» (AB p.43). O leitor provavelmente interrogar-se-á
sobre se a batalha de Moscovo realmente terminou com a vitória soviética. Na
verdade, assim foi! Os soviéticos ganharam a batalha, e os nazis nunca mais se
aproximaram de Moscovo.
Os nazis nunca mais
conseguiram reconquistar os territórios em torno de Moscovo. Tomemos outro
exemplo das muitas mentiras de Beevor, a que diz respeito à divisão motorizada Grossdeutschland. Beevor quer-nos fazer
acreditar que antes da ofensiva final contra Estalinegrado, Hitler tinha
enviado a Grossdeutschland (e a
Divisão SS Leibstandarte Adolph Hitler)
para a França. Beevor escreve que «as divisões Grossdeutschland e SS
Leibstandarte panzer grenadier deveriam ser enviadas de volta para a França»
(AB p.81). Beevor acrescenta que o chefe do Alto Comando alemão, o general
Franz Halder, comentou essa questão no seu Diário de Guerra em 23 de Julho de
1942: "Essa tendência crónica para subestimar as capacidades inimigas está
gradualmente a assumir proporções grotescas e a tornar-se positivamente um
perigo» ( HWD p.646). É isto verdade? Quando se lê o Diário de Guerra de Halder
percebe-se que a entrada em questão não é sobre a Grossdeutschland ou sobre a SS
Division Adolph Hitler, mas sobre a disposição de tropas em torno de Rostov
ordenada por Hitler! Na mesma página do Diário da Guerra, Halder escreve no dia
24 de Julho: «A Leste de Rostov, novo sucesso da Grossdeutschland» (HWD p.646). Não há aqui nada sobre o envio da Grossdeutschland para a França. No Diário
de Guerra de Halder pode-se seguir a rota da Grossdeutschland a partir de 5 de Julho de 1942. Em Julho, a Grossdeutschland estava ao sul de Estalinegrado.
Em 14 de Agosto, foi enviada para ajudar a divisão do Grupo de Exércitos perto
de Rjev (HWD p.657), a cerca de 200 km a Oeste de Moscovo, onde, segundo
Halder, «as nossas próprias perdas, principalmente em tanques, são altamente
desagradáveis» (HWD p.657). A Grossdeutschland
teve sorte. Se não tivesse sido enviado para Rjev, teria sido destruída em Estalinegrado,
que era o destino do 4.º exército blindado nazi ao qual pertencia a Grossdeutschland.
Mentiras acerca de Katyn
Outra das mentiras descontraídas de Beevor diz respeito ao massacre da floresta
de Katyn, perto de Smolensk. Na sua campanha de difamação contra a União
Soviética, Beevor devia, obviamente, dedicar um capítulo ao NKVD, acusando esta
organização dos crimes mais horrendos. Beevor escreve que «Outro departamento
do NKVD, criado por Beria no Outono de 1939, lidou com prisioneiros de guerra
inimigos. A sua primeira grande tarefa foi a liquidação de mais de 4.000 oficiais
polacos na floresta em Katyn» (AB p.86). Uma asserção tão séria exige uma
explicação, mas Beevor não é capaz disso. Ele toma as suas informações directamente
de Hitler! A existência de valas comuns de um grande número de oficiais polacos
foi tornada pública pelo departamento de propaganda de Hitler e Goebbels em 13
de Abril de 1943. Os nazis acusaram o governo soviético de ter organizado o
massacre de 15 mil oficiais polacos. A área de Katyn estava então sob ocupação
alemã desde 1941. Durante esses dois anos de ocupação, os nazis nunca
mencionaram nenhum massacre perto de Katyn. E durante esses dois anos, os nazis
mataram milhões de pessoas em campos de concentração e nos países ocupados,
entre eles na União Soviética. Porquê tornar público os «massacres soviéticos»
de 15 mil pessoas em Abril de 1943?
Deve notar-se que
o anúncio do massacre foi feito em 13 de Abril, apenas um mês após a grande
derrota nazi de 2 de Fevereiro de 1943 em Estalinegrado. Os nazis precisavam de
uma peça de propaganda. O ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Eden,
expressou no Parlamento, em 4 de Maio de 1943, que os assassinos nazis de
centenas de milhares de polacos e russos usam a história dos massacres para
destruir a unidade dos aliados. Esse pronunciamento acabou com a história nazi
do massacre da floresta de Katyn. Mas durante a guerra fria contra a União
Soviética, novas acusações surgiram sobre um massacre soviético na floresta de
Katyn. Desta vez não vieram da Gestapo, mas dos Estados Unidos e da
Grã-Bretanha. As acusações foram renovadas mais tarde pela contra-revolução na
União Soviética através de Gorbachev e Ieltsin. Foi criada uma comissão de
inquérito para examinar a questão uma vez mais e descobrir quem realizou o
massacre da floresta Katyn. A comissão de inquérito soviética e polaca e, mais
tarde, a comissão russo-polaca, não conseguiu encontrar nenhuma evidência do
envolvimento soviético, embora quisessem fazer isso a todo o custo. Os
resultados da comissão mostram que os oficiais polacos que morreram em Katyn
foram assassinados com armas alemãs e que as vítimas eram cerca de 4.000, e não
15.000, como disse Hitler.
A tradução sueca
não concorda com o original em inglês! Na edição sueca (Historiska Media 2000, página 99), diz que 15 mil oficiais polacos
foram executados em Katyn. Mas na edição original (Penguin Books 1999, p.86)
diz que 4.000 oficiais polacos foram mortos em Katyn. Foi Antony Beevor quem
quis assim, ou foi o editor sueco? De qualquer forma, isto mostra a seriedade
de seus livros de história!
Os nazis são heróis de Beevor
As mentiras de Beevor são tão frequentes que é cansativo ler o livro. Tudo o
que Beevor escreve é retirado da propaganda de guerra nazi para manchar a
União Soviética: «A maioria dos recrutas [soviéticos] lançados na batalha tinha
frequentemente recebido pouco mais do que uma dúzia de dias de treino, alguns
ainda menos" (AB p.89), «Três batalhões de oficiais estagiários, sem armas
ou rações, foram enviados contra a 16.ª Divisão Panzer» pelo «comandante do
exército, que estava claramente bêbado» (AB p.89). O livro de Beevor parece-se às
vezes como uma piada sobre alemães inteligentes que eliminam idiotas russos e «limpam
as florestas [desses idiotas russos]» como «[se fosse a] um tiro a um veado
bastante grande» (AB p.96). Os «pilotos da Luftwaffe despacharam o seu inimigo
“mit Eleganz" [“com elegância”;
em alemão no original]» (AB p.110) e «os jovens e bronzeados pilotos de caça»,
«parecem ter oferecido a visão mágica de um cavaleiro teutónico aéreo numa
brilhante armadura» (AB p.115)! E, como era de esperar, os «pilotos de caça
soviéticos ainda sofriam de um medo instintivo do inimigo» (AB p.138). Nos
capítulos sobre Estalinegrado, Beevor continua com a sua história de
propaganda. Os «ataques russos» foram, segundo ele, «chocantemente
desperdiçadores e incompetentes» (AB p.124) e «os obstáculos reais para os
atacantes, como em breve sentiriam, eram a paisagem urbana arruinada» (AB p.129),
e não os defensores soviéticos. Para tudo o mais, há as expressões típicas como
«o genial comandante [alemão]» (AB p124) e «o comissário do exército [soviético]
de aspecto sinistro» (AB p.128), bem como oficiais soviéticos que fogem e
soldados que «enfrentam o tribunal militar» e «foram provavelmente fuzilados» (AB
p.128). Como é que se pode ser «provavelmente fuzilado»?! Há muitas histórias
sobre os bons alemães atirando em russos vindo em ondas atrás de ondas, de modo
que «em frente à nossa posição, os mortos soviéticos foram empilhados e
serviram como uma espécie de parede de areia para nós» (AB p.372).
Segundo Beevor,
as deserções e execuções eram lugares comuns no exército soviético. A liderança
soviética é sempre apresentada como brutal, impiedosa, sanguinária, e os
oficiais soviéticos completamente impiedosos em relação aos soldados. Como puderam
eles então fazer essa guerra contra os nazis ano após ano e até ganhá-la? Até mesmo
o monumento dedicado aos heróicos soldados soviéticos que defenderam Estalinegrado
em Mamaia Kurgan, o monte em que ocorreram muitas lutas e onde muito sangue foi
derramado, é minimizado por Beevor. A mobilização das mulheres para as fábricas
é transformada em crime. Beevor quer acabar com qualquer vestígio da vitória
soviética. Sempre que há um problema no lado soviético, Beevor faz tudo o que
pode para nos fazer acreditar que o governo soviético e os oficiais eram
líderes incompetentes. Quando a ofensiva alemã é interrompida, Beevor escreve
apenas algumas linhas. Há sempre desculpas para justificar as falhas dos
alemães. Os alemães foram derrotados pelo «General Lama» e o «General Inverno»
(AB p.282). No que diz respeito à guerra alemã de extermínio contra a população
civil soviética, Beevor escreve que «havia numerosas afirmações soviéticas de
atrocidades alemãs que são difíceis de avaliar» (AB p.263). As muitas histórias
sentimentais sobre a derrota alemã – p. ex., as celebrações de Natal ao jeito
alemão –poderão provavelmente comover o revisor do jornal sueco Svenska Dagbladet até às lágrimas. Os
ataques de Beevor aos oficiais do Exército Vermelho e a Estaline não são senão
anti-comunismo primário. Sem a menor evidência, Beevor fornece-nos histórias
falsas, uma atrás da outra.
A derrota dos nazis em Estalinegrado
Há algumas questões de interesse histórico que vale a pena comentar. Como era
de esperar, Beevor culpa Hitler pela derrota alemã em Estalinegrado. Os «lendários»
generais alemães das «melhores famílias militares alemãs» escapam à
responsabilidade pela derrota. Isto não é justo. Os planos para a conquista de Estalinegrado
foram feitos em total acordo entre Hitler e todos os generais do
Quartel-General e do Alto Comando Militar. A conquista de Estalinegrado era, efectivamente,
uma necessidade. Os nazis haviam enviado o Grupo de Exércitos A com uma força
de 500 mil homens ao Cáucaso para conquistar as fontes de petróleo soviéticas.
À esquerda, no Sul, ao norte de Rostov, estava o Grupo de Exércitos B, que
incluía o 6.º exército e o 4.º exército blindado. Era necessário defender o
Grupo de Exércitos B, bem como a ala esquerda do Grupo de Exércitos A, de contra-ataques
das forças soviéticas a Oeste de Estalinegrado. Os nazis tinham de possuir o controlo
sobre o território soviético até ao rio Volga para poder transportar o petróleo
do Cáucaso. Esta é a razão pela qual era necessário conquistar Estalinegrado.
Mas o ataque alemão contra Estalinegrado baseou-se em premissas erróneas.
No verão de 1942,
Hitler e o Alto Comando e Estado-Maior alemães, estimaram que a União Soviética
não conseguia continuar a guerra em grande escala. Achavam que a União
Soviética estava completamente arrumada como potência militar. Não entenderam
que o sistema socialista soviético poderia reunir forças de forma impossível
para um país capitalista. Calcularam, à maneira capitalista, que um certo
número de habitantes só pode suportar um certo número de soldados, tendo em
conta o custo do treino e das armas. Não entenderam que o socialismo liberta o
homem e torna possível criar forças muito maiores do que o capitalismo. Hitler
e os generais achavam que Estalinegrado seria uma batalha fácil. Mais tarde, em
Outubro de 1942, o Alto Comando alemão escreveu que «os russos estão seriamente
enfraquecidos após os últimos combates e, durante o inverno 1942/43, não
poderão ter forças tão grandes quanto no inverno passado» (Marshall of the Soviet Union Zhukov: Reminiscences and Reflections,
edição sueca, Moscow 1988 Book 2 p.97). Mas, na realidade, a indústria de
guerra soviética era naquela época mais forte do que nunca, e para Hitler e
seus generais, o contra-ataque soviético caiu como um raio do céu azul.
O socialismo foi a base do sucesso da União
Soviética
De onde vieram todas as novas tropas soviéticas e todas as novas armas? Canhões,
tanques e aviões? Foi o que o general Jodl, chefe de operações do
Quartel-General alemão, se perguntou após a guerra. «Não tínhamos absolutamente
nenhuma ideia da força das tropas russas nesta área. Não havia lá nada no
início, mas de repente eles fizeram um ataque com uma grande força que teve uma
importância decisiva» (Zhukov, ibid.
p.97). Quando os 6.º e 4.º exércitos nazis foram cercados em Estalinegrado, as
dificuldades multiplicaram-se para os nazis. Hitler e o Quartel-General
ordenaram ao General Paulus, Chefe de Comando em Estalinegrado, resistir a
qualquer custo e aguardar ajuda. Não havia mais nada que Paulus pudesse fazer. Tentar
lutar rompendo o cerco seria uma empresa arriscada. Exigiria uma redistribuição
das forças nazis dentro do cerco, o que levaria várias semanas, incluindo um
alto custo em termos de soldados alemães mortos e feridos, e em material
destruído. Se o rompimento não tivesse sucesso, seria uma catástrofe. E mesmo
que tivesse sucesso, teria havido muitas dezenas de milhares de vítimas. Teriam
ainda de deixar para trás enormes quantidades de material.
Ninguém no Alto
Comando, nem Hitler nem os generais, estava disposto a assumir a
responsabilidade por isso. Assim, a ordem foi: fique onde está, nós o
ajudaremos. Mas esta ordem não foi apenas ditada por preocupações com o
exército cercado. Havia algo de grande importância que exigia isso. O grupo de
exército alemão A estava no Cáucaso! Se o 6.º exército alemão cercado tentasse
sair, sofreria grandes perdas em soldados e armas, e enfraqueceria assim o Grupo
de Exércitos B, tornando-o possivelmente incapaz de impedir as forças
soviéticas de se confinarem ao Grupo de Exércitos A no Cáucaso. Essa seria uma
catástrofe pelo menos duas vezes maior do que se o 6.º exército fosse destruído
em Estalinegrado.
O Alto Comando e o Estado-Maior alemães perceberam o enorme erro de cálculo que
tinham cometido. A prioridade principal era agora retirar rapidamente o Grupo
de Exércitos A do Cáucaso. O 6.º exército alemão teria de aguentar o melhor que
pudesse. Para o Grupo de Exércitos A tornou-se uma retirada em pânico,
perseguido pelas forças soviéticas no Cáucaso, com muitas baixas alemãs e
enormes perdas de material.
Enormes perdas dos nazis
Foi feita uma tentativa de resgatar o 6.º exército com um novo exército, o Exército
Alemão Don, que consistia em forças rapidamente retiradas da França, da
Alemanha e da frente oriental. Este exército estava sob o comando do general
Manstein, cujas «qualidades militares e inteligência», segundo Beevor, eram «inegáveis»
(AB p.273). Com pompa e circunstância, o general Manstein assumiu o comando. Um
exército blindado foi enviado de Kotelnikovo (cerca de 100 km a sudeste de Estalinegrado)
para resgatar o 6.º exército. Beevor quer fazer deste ataque alemão «quase uma
vitória». Mas as guerras são sempre vencidas pelo partido que ganha a última
batalha. O exército blindado de Manstein conseguiu lutar até 50 km dentro das
linhas soviéticas, mas isso foi tudo. Os alemães regressaram em fuga ao ponto
de partida, e ainda mais para trás, com enormes perdas. O exército blindado
alemão e o que restava da frente alemã perto de Estalinegrado deslocaram-se
mais 50 a 100 km para Oeste. O Cáucaso foi libertado e a frente alemã foi
empurrada para trás a 200 a 300 km de Estalinegrado.
Em termos de soldados
mortos, feridos e desaparecidos, a Alemanha nazi tinha perdido até Setembro de
1942 mais de 1,6 milhões de soldados (HWD p.669). Dois meses depois, em Novembro
de 1942, os nazis já haviam perdido mais de 2 milhões de soldados. Só entre Junho
e Novembro de 1942, no combate por Estalinegrado, os nazis perderam 700 mil
soldados, 1.000 tanques, 2.000 canhões e 1.400 aviões (Zhukov, ibid. P.97). A todas essas perdas foram
adicionados o 6.º exército e uma grande parte do 4.º exército blindado em Estalinegrado:
um marechal, 24 generais, 10 mil oficiais e mais de 300 mil soldados. O
armamento perdido pelos nazis em Estalinegrado representou seis meses de
produção de armamento alemão. A derrota foi desastrosa. Nunca antes um exército
alemão tinha sido tão totalmente derrotado e destruído. Na Alemanha, Hitler
proclamou três dias de luto nacional.
Quando viramos a
última página do Estalinegrado de Beevor, surgem duas questões. Por que razão
se escrevem livros enganosos? No interesse de quem? Vivemos numa era em que o
neo-liberalismo se espalhou por todo o mundo. O novo capitalismo liberal quer
privar os trabalhadores de tudo: das suas condições de vida, da sua segurança e
até mesmo da sua história. Os capitalistas querem que percamos a confiança em
nós mesmos para poderem governar sem restrições. Não há muita diferença entre o
liberalismo e o nazismo quanto a este respeito. O autor do presente texto
escreveu uma vez que o neo-liberalismo e o nazismo são primos. Mas eles até
podem ser gémeos idênticos. Antony Beevor é um dos novos escritores liberais
que assumiram a tarefa de degradar a vitória da União Soviética na Segunda
Guerra Mundial. A Penguin Books [e a Bertrand em Portugal] publicou o livro
de Beevor como se fosse um livro de história. Porquê? O livro deve ser praticamente
considerado como um livro de propaganda da guerra nazi.
Racismo nas histórias de Beevor
O editor nem
sequer reage contra afirmações racistas no livro. Como colonialista e oficial do
Império Britânico, Beevor relata-nos um conto sobre «o rei dos Zulu enviando um
impi [destacamento] dos seus
guerreiros por sobre um penhasco para provar a sua disciplina»» (AB p.28), a
fim de impressionar os oficiais britânicos, é claro... Beevor não está sozinho na
sua tentativa de rebaixar a vitória da União Soviética. Há muitos da sua
espécie nos Estados Unidos. São pagos por uma floresta de «fundações» privadas
para negar a vitória da União Soviética sobre o nazismo.
É importante denunciar as mentiras deles. O livro de Beevor é ainda pior quando
se refere a Berlim. Qual o interesse da
Penguin
Books [e da
Bertrand] na
publicação deste lixo? [Questão pertinente a que já respondemos parcialmente
noutro
artigo.]
Mário Sousa,
Uppsala, Sweden. September 21, 2004.
mario.sousa@telia.com
REFERENCES
1. Antony Beevor: Stalingrad, Penguin Books
1999.
2. Theodora Plievier: Stalingrad, Time Life
Books, New York, 1966.
3. Roger R. Reese: The Red Army and the
Great Purges. Stalinist terror – New perspectives, Cambridge University Press
1993.
4. The Halder War Diary 1939-1942,
Greenhill Books, London, 1988.
5. General Heinz Guderian – Panzer Leader,
Da Capo Press 1996.
6. Marshal of the Soviet Union Zhukov:
Reminiscences and Reflections: Swedish edition, Moscow 1988.